Skincare e maquiagem: crianças devem se preocupar com beleza e estética?
Um dos perigos é despertar um excesso de vaidade precoce em quem deveria estar preocupado apenas em brincar

Há alguns anos, jovens de 12 ou 13 anos nos grandes centros urbanos eram considerados crianças. Não era raro ver meninas brincando de boneca aos 14 anos, por exemplo. No entanto, há poucas décadas, testemunhamos uma progressiva antecipação do processo de adolescência. O surgimento e disseminação das redes sociais acelerou ainda mais este movimento.
Hoje, o Ministério da Saúde segue a convenção elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que considera que a adolescência vai dos 10 aos 20 anos e a juventude acontece entre 15 e 24 anos. Ou seja, os últimos anos da adolescência se misturam com os primeiros anos da juventude.
Neste caminho, alguns fatores acabam por confundir o que é um comportamento de criança, de adolescente ou de jovem – em especial com o aumento da puberdade precoce. A beleza é um bom exemplo. As redes sociais estão inundadas de influenciadores, que ganham muito dinheiro, para vender produtos de beleza, tratamentos estéticos e maquiagem. Mirando nos jovens, acabam acertando nas crianças.
Um dos perigos deste tipo de comportamento é despertar um excesso de vaidade, extremamente precoce em quem deveria estar preocupado apenas em brincar e estudar. Já ouvi todo tipo de relato: festas que reproduzem salão de beleza (algumas até em salão de verdade), crianças de 8 ou 9 anos preocupadas com a pele, procura por procedimentos estéticos, muitas vezes influenciadas pelas mães.
Atento a este momento, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) divulgou recentemente orientações de uso de cosméticos e maquiagem para crianças e adolescentes. Segundo a SBP, o uso de maquiagem excessivo propicia a obstrução dos poros, aparecimento de acne e dermatites. E, por causa de diversas substâncias, podem desencadear reações alérgicas, efeitos hormonais e toxidades neurológicas. Por isso, a recomendação é utilizar poucos produtos e produtos adequados para a idade, como os de peles sensíveis, hipoalergênicos e com ingredientes naturais. Em crianças, a conduta é evitar sempre que possível.
Já tintura ou coloração de cabelo devem ser evitadas até os 12 anos. A partir desta idade, os pais devem estar atentos a usar apenas produtos próprios para a idade (sem amônia, chumbo ou água oxigenada). Além disso, meninas e meninos com menos de 15 anos devem evitar colorações e outras químicas nos cabelos.
Entre os produtos da moda para a pele, a SBP não recomenda a aplicação de produtos anti-idade, como aqueles utilizados para combater rugas, linhas de expressão ou sinais de envelhecimento. Antes mesmo de ser danoso a pele, é de se perguntar por que alguém de 10 ou 12 anos está preocupado com o envelhecimento da pele, quando o corpo está explodindo de hormônios e colágeno. Crianças devem se preocupar com o uso de protetor solar, no máximo.
Considero o alerta da SBP fundamental, faço votos que ele atinja o maior número possível de pais e responsáveis. A preocupação excessiva com a beleza em tão tenra idade é um convite à construção de uma autoestima frágil, vulnerável à opinião de terceiros e, a longo prazo, para uma saúde mental comprometida.
Crianças devem aprender que aparência não é o mais importante na vida, devem ser fundadas em valores éticos e morais, apreendidas a partir do exemplo que os pais dão em casa. Isso nenhum produto de beleza jamais poderá entregar.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).