Remédio é para doença, não para a educação das crianças
Pais gostariam que medicamentos “curassem” os filhos - mas eles só agem sobre doenças, não sobre a educação e limite das crianças

A pandemia de coronavírus foi responsável por diversas mudanças em nossas vidas – algumas já temos consciência (higiene das mãos, prevenção a vírus, valorização do tempo com familiares e amigos), outras acredito que ainda não temos total entendimento, à espera do efeito clareador do tempo.
Especificamente no que tange o exercício da psiquiatria infantil, eu e vários outros colegas temos notado um movimento curioso: o aumento de pais na busca por medicamentos para seus filhos, depois da fase mais aguda da pandemia de coronavírus.
São pessoas que não tem a paciência ou a disciplina que a terapia exige e se arvoram a resolver tudo a base de remédios – do autismo à depressão, da ansiedade ao déficit de atenção, chegando até mesmo às questões comportamentais que passam ao largo de transtornos mentais, como educação dos filhos e imposição de limites.
Nos últimos meses surgiu uma nova leva de pais ou responsáveis que alimentam a fantasia de que as soluções de todos os problemas de seus filhos se darão naqueles cinquenta minutos ou uma hora de consulta com um psiquiatra e resistem à relevância do tratamento terapêutico a longo prazo. Porém, medicação não resolve tudo. Medicação tem seus limites, não é tábua de salvação para todos os males, principalmente entre crianças e adolescentes, um público bastante específico, em que o fator comportamental não pode ser desconsiderado de forma alguma.
Curiosamente, essa postura se opõe ao que víamos até bem poucos anos atrás. Sempre houve enorme resistência dos pais ou responsáveis quando era preciso indicar alguma medicação aos filhos. Se antes a medicação era o último recurso, hoje ela passou a ser vista como o primeiro. E a verdade, é que ela não é uma coisa, nem outra: remédio deve ser ministrado quando ele pode colaborar no tratamento de um quadro clínico da criança ou do adolescente.
Qualquer coisa fora disso é ansiedade ou preguiça dos pais.
Fabio Barbirato é médico psiquiatra pela UFRJ, membro da Academia Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência e responsável pelo setor de Psiquiatria Infantil da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na PUC-Rio. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).