Jovens e games: qual o limite da convivência?
Crime choca o Brasil e faz pensar sobre o excesso do uso de jogos por crianças e adolescentes
Um crime ocorrido na cidade Patos, na Paraíba, estarreceu o Brasil. Um menino de 13 anos desferiu tiros e matou a mãe, o irmão mais novo, de 7 anos, e baleou o pai no tórax. Como se não fosse motivo suficiente para o choque, impressiona ainda mais a razão torpe: os pais do menino o haviam proibido de usar o celular como forma de punição pelo seu desempenho escolar ruim, impedindo-o de jogar “Roblox”.
O crime bárbaro levanta várias questões para discussão. A primeira, e mais óbvia, é o grau de dependência que crianças e jovens desenvolvem com aparelhos celulares. Segundo pesquisas, jovens passam horas de mais acessando telas, como computadores e celulares.
O segundo ponto tem a ver com a violência. Os gestos violentos dos jogos são um fator de atração, especialmente entre jovens. Os jogos de videogames estão cheios de gente se matando, de todas as formas. Filmes e séries também se valem do tema, com sucesso. O ponto central é como todo esse conteúdo é assimilado pelos adolescentes e crianças. Não é raro que tais programas sejam assistidos sem a anuência ou observância dos pais. Dependendo da idade, as crianças sequer tem discernimento para entender que se trata de um programa de ficção.
O terceiro ponto que destaco é o claro vício em videogame demonstrado pelo rapaz. A dependência de games foi classificado como um transtorno mental pela Organização Mundial de Saúde. Segundo a OMS, esse transtorno se caracteriza pelo que definiu como “um padrão de comportamento recorrente”. Ou seja, o perigo não está usar o videogame por poucos minutos ou só de vez em quando, como passatempo, mas naqueles jogadores que perdem o controle do número de horas que passam diante do aparelho. O comportamento compulsivo, que já era grande, só fez crescer durante a pandemia.
A OMS também apontou como sinal do vício em videogame trocar outras atividades importantes do dia – como estudar, namorar, ler, conviver com amigos e familiares – por mais algumas horinhas de jogo, acarretando consequências prejudiciais e concretas por, pelo menos, um ano. Deixou de estudar para jogar mais? Perdeu uma prova na faculdade porque passou a madrugada jogando? Está desinteressado de outras atividades como família e namorada(o) ou pulando as refeições? Sinal amarelo! É preciso prestar atenção.
A verdade é que o videogame, por si só, não é um vilão. Pesquisas mostram que os jogos podem auxiliar no desenvolvimento do raciocínio, da agilidade e da coordenação. Como a maioria das coisas na vida, o segredo está na intensidade. Cabe aos pais atenção e bom senso.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na Pós Graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).