Incel: o que significa o termo explorado na série “Adolescência”?
Movimento é crescente na internet

Muito tem se falado sobre a série “Adolescência”, fenômeno na Netflix. A relação de pais e filhos, o quanto os adultos desconhecem do universo dos adolescentes, seu modo de se comunicar e estar no mundo. Mas vou usar este espaço para falar de outra variante da série: o movimento dos “incels”, sobre o qual pouco se sabe.
Surgido nos anos 1990, o termo é uma abreviação de involuntary celibates (algo como “celibatários involuntários”, em tradução livre para o português). Ele denomina pessoas que se descrevem como incapazes de ter um relacionamento ou uma vida sexual, embora desejem estar em uma relação.
A frustração pela não-realização desse desejo faz com que os incels culpem deliberadamente as mulheres por seu fracasso afetivo e sexual. Para isso, eles partem da ideia descabida de que todas seriam oportunistas e interesseiras, preocupadas apenas com status, aparência e dinheiro. Estes homens também costumam rotulá-las de manipuladoras e promíscuas, dentre outros absurdos. Alguns incels defendem a violência contra mulheres, bem como contra homens que mantêm relações saudáveis e felizes, tendo em vista que o mesmo os é “negado”.
Este não é um comportamento exatamente novo. Há décadas se registra este tipo de pensamento machista e misógino. No entanto, foi com a chegada das redes sociais que o universo dos incels ganhou mais espaço e, consequentemente, notoriedade. Pesquisadores do Centro Internacional para o Estudo da Radicalização do prestigiado King’s College, de Londres, afirmam que, em 2021, um dos maiores fóruns tinha cerca de 13 mil membros ativos e cerca de 200 mil publicações. Este número só faz crescer desde então.
A incitação à violência contra as mulheres varia. Alguns membros de grupos incel glorificam atos violentos, enquanto outros reforçam que esses atos não os traduzem. De todo modo, a maioria das discussões gira em torno da mesma ideia: rejeição às mulheres e inveja dos homens que têm vida amorosa bem-sucedida.
Dentre os jovens que procuram este tipo de ambiente, a explicação principal é o sentimento de solidão e isolamento. Eles buscam conforto, mas acabam encontrando um espaço de disseminação de ódio e intransigência. Estes homens se autodenominam como perdedores e nada pode ser feito sobre isso, já que são incapazes de atrair mulheres.
Na série, o tema é explorado com o concento da regra do “80/20”, que defende a crença de que 80% das mulheres se atraem por apenas 20% dos homens, deixando os demais sem chances de se realizarem emocionalmente. “Adolescência” também toca aborda a ideia da “pílula negra”, um conceito de que a pílula daria a clareza a esses homens que eles são oprimidos pelo feminismo e por outros movimentos identitários que os impediriam de levar uma vida masculina plena.
A solução para esta questão parece estar apoiada na maior disseminação da saúde mental. Quanto mais informação houver, mais pessoas se sentirão saudáveis e emocionalmente apoiadas. E quanto aos jovens, cabe aos pais monitorarem e acompanharem o tipo de conteúdo consumido pelos filhos – antes que seja tarde demais, assim como foi para os pais de “Adolescência”.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).