Existe idade certa para crianças e adolescentes ganharem um celular?
Relação dos adolescentes com aparelhos deve ser construída a partir da confiança que os pais sentem

Uma das relações mais complexas que testemunhamos hoje em consultório é dos adolescentes com celulares. Se por um lado eles facilitam a comunicação com os filhos e dão mais segurança aos pais, por outro o aparelho é um incontestável fator de distração, alijando-os do convívio social e até mesmo os deixando mais em evidência para violência, como assaltos e furtos.
Quanto a ter uma idade certa para celular, acredito que cada caso é um caso. Os pais sabem os filhos que tem em casa e que tipo de relação eles estão construindo com as outras pessoas e com os próprios aparelhos. É mais uma demonstração de confiança, que deve ser conversada e construída, assim como as drogas e o sexo. Conheço todo tipo de caso: meninos que tem celular, mas nenhum interesse em redes sociais; outros que tem celular, mas simplesmente não ligam e aqueles que mesmo apesar da pouca idade, estão sempre com o aparelho a tiracolo – esses sim os mais preocupantes. Há pais que dão modelos velhos de celular, outros que proíbem aplicativos e aqueles que fazem controle parental do conteúdo acessado.
Convém lembrar que a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) orienta o limite de tempo para crianças estarem em contato com esses aparelhos, por faixa etária. Menores de 2 anos não devem ter nenhum contato com telas ou videogames; dos 2 aos 5 anos: até uma hora por dia; dos 6 aos 10 anos: entre uma e duas horas por dia; dos 11 aos 18 anos: entre duas e três horas por dia.
De todo modo, há situações em que o celular deve ser completamente proibido. À mesa, durante as refeições, com a família toda reunida, é um desses momentos em que o celular deve ser deixado à parte. São esses momentos que criam e ampliam as conexões familiares, em que os pais ficam sabendo um pouco mais dos comportamentos e vontades dos seus filhos. Na escola o celular também não deve ser bem vindo, mas vários municípios já tem legislação específica que regula a questão – inclusive comprovando melhora nos rendimentos escolares e diminuição nos casos de bullying.
Um novo estudo, publicado no Journal of the Human Development and Capabilities, acaba de recomendar que adolescentes até 13 anos evitem o uso de celulares e redes sociais, diante do perigo em potencial à saúde mental. O uso de smartphones por crianças com menos de 13 anos foi diretamente associado a ideação suicida, piora na regulação emocional, diminuição da autoestima e distanciamento da realidade, especialmente entre as meninas. De acordo com a pesquisa, para cada ano antes dos 13 em que o adolescente adquiria um smartphone, sua saúde mental e bem-estar eram menores.
Isso provavelmente se deve ao fato de que as crianças que usaram dispositivo antes desta idade acessaram mais as redes sociais e sofreram interrupções do sono, cyberbullying e relacionamentos familiares prejudicados, segundo a pesquisa. Os dados são baseados em autorrelatos do estudo com quase dois milhões de pessoas de 163 países. Pesquisas anteriores acerca do mesmo tema já haviam indicado a relação entre celulares e redes sociais com quadros de ansiedade e depressão entre jovens. Aos pais, cabe vigilância e atenção ao tempo que os filhos passam nos aparelhos e o conteúdo que acessam. Diálogo e confiança são palavras-chaves.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).