As muitas formas de se educar uma criança
Formar um filho vai muito além do ensino tradicional
Gosto de comer. Gosto de comer bem. Ir a um restaurante, tomar um bom vinho, desfrutar de uma boa sobremesa, tudo isso são prazeres que fazem parte da minha vida. Na verdade, desde antes de o nosso filho nascer, gostávamos de compartilhar longos almoços ou jantares, sozinhos ou com amigos. Depois que ele nasceu, não foi diferente. Desde pequenininho, Bruno sentava à mesa conosco e ia entendendo que aquele era um ritual importante para a família. Ele foi curtindo entender de onde vem os alimentos, como os pratos são preparados, tinha curiosidade em acompanhar o trabalho de chefs, maitres e garçons.
Hoje, anos depois, estes momentos estão incorporados à vida dele também. Ele os reconhece, valoriza e sente falta quando a correria do dia a dia não permite nosso pequeno momento à mesa.
Faço este pequeno relato pessoal para aplacar um pouco a ansiedade dos pais que, cada vez mais, me procuram como se educar fosse um bicho de sete cabeças. Não, não é fácil. Mas também não é tão difícil quanto algumas pessoas querem fazer crer – talvez para continuarem vendendo seus serviços e consultorias.
Desfrutar de pequenos e preciosos momentos – como à mesa, conforme relatei – podem ser tão ou mais poderosos para a dinâmica familiar do que uma educação que se pretende formal. E não precisa ser com apreciações gastronômicas. Filhos e pais que curtem juntos esportes, ou música, ou livros, ou automobilismo – são muitos os possíveis interesses em comum – criam uma espécie de código de intimidade, geram assuntos para conversas e tem o poder de ajudar a formar a criança ou o jovem.
É uma constante a reclamação no consultório do uso excessivo de celulares, tablets e redes sociais. Uma pesquisa na Inglaterra mostrou que as livrarias haviam se tornado mais interessantes aos olhos dos clientes nos últimos anos justamente por oferecer uma experiência offline, repleta de sentido – em oposição às redes e seu excesso de assuntos desinteressantes.
O que estou tentando propor aqui aos pais é que descubram qual a atividade longe de telas que pais e filhos podem e devem ter o prazer de compartilhar. O primeiro passo neste sentido foi dado durante a pandemia. Eram muitos os relatos de pais que retomaram jogos de tabuleiro com os filhos ou a prática da jardinagem, por exemplo. É pena que com a vida de volta ao ritmo normal, essa conquista tão preciosa esteja se perdendo de novo.
Fica o convite para estender aos seus filhos um prazer que dê sentido à sua vida e, juntos, criarem momentos únicos para a memória afetiva da família.
Fabio Barbirato é médico psiquiatra pela UFRJ, membro da Academia Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência e responsável pelo setor de Psiquiatria Infantil da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na PUC-Rio. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).