Afinal, o que significa ser adolescente em 2023?
Mais do que nunca, época da vida é caracterizada por novidades, descobertas e desafios
Na pressa que nossa sociedade sente em rotular toda e qualquer coisa para facilitar sua compreensão, convencionou-se denominar os anos entre a infância e a vida adulta de adolescência. Assim, amontoado sob a força de uma única palavra, comprimem-se alguns dos dez anos mais importantes da vida. Mas, afinal, o que significa ser adolescente em 2023?
A palavra adolescência tem origem em “adolescer”, um processo que implica em mudanças: tanto no corpo quanto na voz, em razão das alterações hormonais. A primeira menstruação, o aparecimento dos seios e o crescimento dos pelos vaginais são alguns dos sinais visíveis da entrada em um novo ciclo na vida.
Além de reconhecer-se em um novo corpo, é preciso dar vasão a uma nova identidade. Isso não significa que a pessoa se “transforma” em outra, mas sim que ela está amadurecendo e se constituindo em um ser social, deixando de agir como os outros querem, como uma criança, para passar a ser regida pelo seu próprio pensamento, com o que ela colheu de referências em casa, na escola, dos pais, amigos, professores e outras influências. É a hora de construir opinião própria e expressá-la, questionando fatos que lhes foram impostos como verdades absolutas.
E aí mora uma primeira questão a respeito do que é ser adolescente hoje: as influências são muitas e diversificadas. Se por um lado, isto traz uma riqueza de informação como nenhuma outra geração jamais possuiu, por outro também é capaz de gerar uma angústia enorme. Até bem poucos anos, um adolescente tinha como referência a casa e a escola. O surgimento das redes sociais abriu uma infinidade de janelas de informação e ser adolescente nunca mais foi a mesma coisa. Dentre tantos caminhos identitários, com qual eu me identifico? Quem sou eu nessa vastidão de possibilidades? São questões que geram ansiedade em muitos jovens.
Aí também, vê-se hoje dois comportamentos distintos. Há os jovens que buscam acelerar a independência financeira e profissional, e outros que retardam ao máximo a saída da casa dos pais, uma espécie de postergação de entrada na esfera social mais madura. Na realidade brasileira, tudo isso é cortado por uma variável da qual não se pode fugir: realidades sociais cruelmente distintas, que oferecem oportunidades e exigem cobranças bastante diferentes, de acordo com a renda.
Se os filhos estão perdidos, os pais não estão muito diferentes. Trata-se de um período desafiador para todos. A adolescência fragmentada e sob excesso de informação que deixa os jovens perdidos também impacta os pais. O que é grave, na medida em que os adultos são referências basilares para os filhos, que nesta fase, costumam ser acometidos de dúvidas e incertezas sobre sexo, saúde, carreira e futuro.
Respondendo à provocação inicial deste artigo: afinal, o que é ser adolescente em 2023? Não há uma única resposta definitiva. Se quando procura os pais o que o filho encontra é desorientação, culpa e medo da frustração, é um farto terreno para a instabilidade e uma janela para transtornos como depressão, ansiedade e pensamentos suicidas – e consequentemente, uso abusivo de substâncias como álcool, maconha e outras drogas.
Portanto, é fundamental criar laços estáveis de confiança mútua para que os filhos encontrem nos pais o necessário suporte à fase marcada por tantas novidades. Os pais continuam responsáveis pelos filhos adolescentes, assim como quando eles eram crianças, ou seja, cabe a eles monitorar e estar atento a seu comportamento social. É razoável que, em determinado momento, eles desejem privacidade – e devem tê-la, à medida que, com o passar dos anos, se provem merecedores, com atitudes maduras que deixem os pais seguros para concedê-la. Liberdade e privacidade, portanto, devem ser uma conquista para o adolescente.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).