As brisas que sopram o sorriso fácil de Martine Grael
Pioneirismo, representação feminina e reencontro com o Rio renovam baterias da bicampeã olímpica para encarar os desafios de primeira capitã no SailGP

O sorriso fácil navega uma dupla felicidade. Alegra-se em rever os amigos, as delícias cariocas. Irradia também pioneirismo. Aos 34 anos, água salgada na veia, Martine Grael é a primeira capitã do SailGP, a Fórmula 1 dos Mares, cujos catamarãs ultrapassam 100 km/h.
“Muita adrenalina. Já me acostumei com a velocidade. O mais difícil é manter o time entrosado e concentrado com tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo”, conta a bicampeã olímpica (Rio 2016, Tóquio 2021). “Tenho uma grande responsabilidade. Quando meninas me veem, se sentem confiantes em fazer o que quiserem fazer”, completa Martine, uma das 37 competidoras da temporada.
À frente da equipe brasileira Mubadala, estreante sul-americana na categoria, ela revelou bastidores da nova empreitada num breve papo enquanto se preparava para a etapa do Rio (posteriormente cancelada, por segurança). Ao lado da diretora de Marketing da Mubadala, Mariana Britto, a ex-campeã mundial de iatismo (2014) contou ainda como renova as baterias na cidade de estimação.
Qual o principal desafio nessa nova incursão na vela?
Martine: Manter o time entrosado e concentrado. Muita coisa acontece ao mesmo tempo. Temos de processar rapidamente um turbilhão de informações, enquanto navegamos. Isso exige um grande trabalho de grupo. Fico honrada, gratificada, de liderá-lo.
O que significa, para a representação feminina, o pioneirismo de primeira capitã no SailGP?
Martine: Essa conquista estimula novas gerações a ampliarem o espaço e o reconhecimento feminino no esporte, na sociedade. Inspira meninas a fazerem o que querem e sabem fazer.
Mariana: Uma grande competição, uma grande equipe e as marcas apoiadoras devem impulsionar mais do que a alta performance esportiva. Precisam entregar diversidade, inclusão, empatia.
A alta velocidade é a maior diferença entre a vela olímpica, que já rendeu 12 pódios ao Brasil, e a pilotagem de um catamarã de 50 pés que supera 100 km/h?
Martine: A velocidade impressiona mesmo, aumenta a adrenalina. Já me acostumei. Acredito que as maiores diferenças sejam a quantidade enorme de dados que processamos para competirmos em alto nível, inclusive durante as provas, e a necessidade de conjugá-los com as tarefas de cada integrante da equipe. A afinação e a concentração da equipe têm de ser extremas. Como capitã, fico o tempo todo ligada nisso. Mas não podemos esquecer que, no fim das contas, é uma competição da vela.
Fora o peso histórico, qual a importância de o país inaugurar uma etapa e uma equipe (Mubadala Brazil) sul-americanas no SailGP?
Mariana: Essas iniciativas ajudam a desmistificar e popularizar a vela. Ajudam a sedimentar a cultura esportiva, a fortalecer seus impactos socioculturais e econômicos. Também reforçam o preparo do país, em particular do Rio, para sediar grandes eventos esportivos.
Martine: A equipe e a etapa brasileiras aproximam a vela do público. Ele acompanha de perto o espetáculo e torce. Uma grande festa.
Até que ponto a vocação esportiva do Rio contribui para a ampliar a relação com a vela?
Martine: O Rio tem tudo a ver com a vela. A cidade respira esporte. É uma delícia velejar aqui, embora a Baía imponha várias dificuldades. Sou suspeita. Nasci em Niterói, o Rio é minha casa. Tem uma energia contagiante. Como passo boa parte do ano no exterior, aproveito para rever os amigos e fazer programas bem cariocas.
Por exemplo?
Martine: Ah, vários: caminhar, curtir um bar ou um restaurante com amigos, por exemplo. Para cada programa, há um grupo diferente, com uma energia boa. Uma energia carioca, singular, que me acompanha mundo afora.
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Alexandre Carauta é jornalista e professor da PUC-Rio, integrante do corpo docente da pós em Direito Desportivo da PUC-Rio. Doutor em Comunicação, mestre em Gestão Empresarial, pós-graduado em Administração Esportiva, formado também em Educação Física. Organizador do livro “Comunicação estratégica no esporte”.