A polêmica da Casa Afonso Arinos em Botafogo: o que podemos esperar?
Programado pela Prefeitura para o dia 17 de outubro, o leilão da casa onde viveu e trabalhou o Senador não agradou a quase ninguém
Antiga residência e oficina de trabalho do Senador Afonso Arinos, político brasileiro que batizou a primeira lei anti-racismo do país, de 1951 (a “Lei Afonso Arinos”), o palacete eclético situado no número 63 da Rua Dona Mariana, em Botafogo, esteve metido em uma polêmica que envolveu a Prefeitura, a família do falecido Senador, associações de moradores e páginas de Botafogo nas redes sociais.
A Prefeitura do Rio pretendia, até ontem, colocar a Casa Afonso Arinos a leilão com lance mínimo estipulado em R$ 9.720.000. A data prevista era 17 de outubro. Tendo conhecimento desse fato, um grupo diverso e misto de cidadãos e instituições se uniu:
- a Associação de Moradores de Botafogo (AMAB);
- páginas sobre o bairro nas redes sociais, como o perfil @ViverBotafogo do Instagram (sempre pertinentes, insistentes e intransigentes);
- a família do falecido Senador, representada pelo escritor Cesário Mello Franco, neto de Afonso Arinos; e
- a Fundação Casa de Rui Barbosa.
Toda essa gente se articulou com um objetivo: evitar a privatização do imóvel e garantir que fosse garantido o acesso público seja qual fosse seu destino ou uso.
Essa mobilização teve como fruto um plano, anunciado pelo neto de Afonso Arinos, o escritor Cesário Mello Franco, que havia criado um abaixo-assinado há poucos dias. O grupo pretendia realizar uma mobilização nesta sexta-feira, dia 29/9, com provável presença de moradores e pessoas interessadas na causa (e na Casa). Seria colocada uma faixa contendo dizeres de protesto em frente à casa.
A última atualização que recebemos é a de que a Prefeitura havia acabado de mudar de ideia e não iria mais colocar a Casa Afonso Arinos a leilão. Ao invés disso, pretende agora vender a propriedade à União por R$ 10 milhões, para que o Ministério da Cultura, por meio da Fundação Casa de Rui Barbosa, possa levar adiante o projeto de transformar o imóvel em um Museu da Literatura Brasileira, gerido pelo MinC e pela Fundação, cujo acervo é de extrema relevância literária.
Essa nos parece ser a melhor das notícias. Desocupado por muito tempo, o casarão estava em mau estado de conservação. No início deste ano, um muro de pedra datado de 1850 veio ao chão em meio a uma obra que avança no imóvel ao lado, onde funcionou a clínica do cirurgião plástico Ivo Pitanguy. Ou seja, parece que foi derrubado.
A mansão se tornou bem municipal na década de 90 e recebeu tombamento provisório, numa tentativa de preservação. O casarão serviu de cenário para a história do país com a reunião de intelectuais para a elaboração do anteprojeto da Constituição de 1988, coordenado por Arinos, e abrigava uma vasta biblioteca com volumes históricos, hoje encaixotados.
Em entrevista recente à página @ViverBotafogo no Instagram, Cesário Mello Franco, neto de Arinos, disse que o desejo da família é que o local virasse um centro cultural. Pela legislação em vigor, entretanto, prédios de até seis pavimentos podem ser construídos no terreno, desde que o futuro projeto mantenha a identidade do imóvel tombado. A informação é da presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), Laura Diblasi, em entrevista em setembro do ano passado ao Jornal O Globo.
Curiosamente, o endereço já foi sede de instituições como o IRPH (Instituto Rio Patrimônio da Humanidade), ligado à Prefeitura, responsável pelo seu tombamento provisório, e também do BRICS Policy Center, os últimos a ocupar o imóvel. A Prefeitura declarou recentemente que o imóvel só onerava os cofres públicos e que decidiu vender a casa, tornando esse plano uma realidade após aprovação de projeto de lei pela Câmara de Vereadores, em 2021.
*Daniel Sampaio é advogado, pesquisador, ativista do patrimônio e fundador do Instagram @RioAntigo