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Cristiana Beltrão

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Como está a vida dos restaurantes cariocas que investiram em Cascais?

Guimas e Sult nos contam

Por Cristiana Beltrão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 19 abr 2024, 13h09 - Publicado em 19 abr 2024, 10h32
Guimas e a chegada da carioquice, em Cascais
Guimas e a chegada da carioquice, em Cascais (Cristiana Beltrão/Arquivo pessoal)
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Pensava em como (e se) conseguiriam transportar a nossa embaixada oficial da carioquice para o outro lado do Atlântico. Como num filme acelerado, o Guimas Cascais já nasceu parecendo que sempre esteve por lá.

Cheguei num fim da tarde de sábado, há três semanas. Instalada numa pracinha de uma área residencial, a casa tinha um sei lá o quê do cantinho querido na Gávea. Como num passe de mágica, de outubro para cá, já surgiram vários desenhos de clientes pelas paredes; já estão cheios de habitués com suas mesas e bebidas preferidas; já ganharam o carinho da crítica local e, em breve, chega um boneco como aquele estacionado na porta da casa do Rio, só que com a cara do Chico Mascarenhas.

O salão é bem mais generoso que o do Rio e há um bar na entrada, feito para a gente morar. As receitas são exatamente as mesmas, treinadas à perfeição por Claudia Mascarenhas, cunhada de Chico. Há minúsculas diferenças como o queijo boursin, que foi substituído pelo queijo de cabra (sem ervas) ou o filé mignon que foi substituído pelo lombo de vitelo do açougueiro vizinho, coisas assim… De resto, tudo tão idêntico que me senti em casa, de um jeito muito surrealista.

Enquanto, no Rio, os garçons são todos homens, na casa de Cascais, uma equipe quase inteiramente feminina manda no salão. “E ficaram uma graça de gravata, né?”, comenta Domingas, filha de Chico, à frente da casa. Montar a equipe foi bem difícil, não porque quiseram, mas porque aconteceu: a equipe é toda brasileira à exceção de um nepalês e um venezuelano.

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Não é fácil. O país que tem 15% do seu PIB atrelado ao turismo não consegue mão de obra para restaurantes dado o envelhecimento da população ou pela simples falta de gente disposta a trabalhar num setor que, na média, oferece baixos salários e exige longas jornadas que incluem fins de semana. Só Lisboa recebe 5 vezes mais turistas que o Brasil todo e, no Algarve, alguns restaurantes fecharam na alta temporada, simplesmente, por não conseguirem contratar. Hoje, imigrantes já são quase 40% da força de trabalho na hotelaria daquela região.

Tanto o Guimas quanto o Sult queriam mais funcionários portugueses em suas equipes, até porque não querem ser percebidos como restaurantes de sócios brasileiros para expatriados brasileiros, e sim, restaurantes bons para todos os públicos. E estão conseguindo.

Sult Cascais e seu restaurante intimista e mais sofisticado
Sult Cascais em casa charmosa, intimista e mais sofisticada (Cristiana Beltrão/Arquivo pessoal)

Já no italiano Sult, topei com a doce e competente Julieta Carizzo, na entrada. “Você não estava na Itália?”, perguntei.

Tendo dirigido as casas do Grupo Irajá, no Rio, Julieta e seus 3 filhos se mudaram para Verona à procura de paz e tranquilidade, mas logo veio o convite de Nelson e ela não recusou.

Responsável pelos vinhos da casa – e já vestindo a nova camisa até as orelhas – escolheu dar foco a vinhos locais ou italianos, com alguma coisa de França. Falou da delícia que é ter os produtores portugueses de altíssima qualidade chegando a preços convidativos. Vi um sorriso feliz.

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Ao contrário do Guimas, o produto do Sult não pôde ser totalmente igual. Enquanto a matriz carioca aportou numa rua cheia de oficinas mecânicas e transformou-se num destino, ali já é zona de grande fluxo turístico, que busca atender tanto o passante, quanto o exigente morador local.

Nelson Soares conta que, enquanto o Sult Rio é italiano com influência brasileira, em Cascais sua marca é italiana com influência de Alentejo, Setúbal e do Norte.

Há pistas por toda parte: o arancini com abóbora e queijo da Canastra daqui, virou de alheira com queijo do Azeitão, por lá. Aqui, o risotto de tucupi e jambu com pirarucu se transformou num risotto de pato com foie gras, além mar. E por aí vamos.

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Os insumos italianos também chegam muito frescos e com muita velocidade, graças à qualidade do transporte, em Portugal. Consegue, por exemplo, uma burrata italiana autêntica, com 3 dias. Mudanças à parte, a casa está uma graça, mais intimista e cheia de cantos charmosos, com brisas de alta gastronomia, como manda a região.

Das diferenças de empreender aqui e lá, Nelson cita o custo de montagem da cozinha, cerca de 30% menor que no Brasil, e com equipamentos e utensílios com melhor qualidade, na média. Por outro lado, percebeu o ritmo mais lento de algumas aprovações e processos burocráticos, que aconteceu nas duas casas. Não à tôa, houve um atraso considerável na abertura de ambas.

Outra importante diferença é que não dá para empreender a crédito. Só investe quem tem dinheiro para aportar desde a largada. Quem não tem, babau. Isso cria uma barreira de entrada relevante nesse mercado, quando comparado ao Brasil.

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Nelson também não se habituou ao esquema europeu de reservas. Diz que acha antipático dizer que a refeição tem hora para acabar e prefere o esquema carioca de reservar apenas o primeiro horário. Além disso, há muito “NO SHOW” e já cogita cobrar cartão de crédito.

Para driblar a escassez de mão de obra enquanto mantém a qualidade de serviço, tem apelado para profissionais brasileiros de outras áreas, como uma roteirista e outra funcionária da área de marketing no salão, por exemplo. Tem apenas um estrangeiro na cozinha e os demais são brasileiros, sob o comando de Breno Naar, o chef.

Achei as duas casas “muito bem, obrigada!”, mas sinto que o melhor ainda está por vir. Ambas abriram no frio, mas Domingas já percebeu que agora que o calor chegou chegou em Cascais, a vida muda e começam os animados encontros de amigos, depois da praia, como no Rio. Antes abria só no jantar, mas agora já abre às sextas, sábados e domingos, para o almoço.

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No Guimas, já compraram cadeiras para o lado de fora; no Sult, Julieta já capricha na seleção de pequenos produtores para vender em taça, pela “esplanada” de 30 lugares (como os portugueses chamam a nossa varanda).

A verdade é que, mais que semelhanças ou diferenças, falamos muito bem a língua do Verão. Que venha.

Um brinde aos cariocas expatriados!

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