Esperava encontrar um chef ansioso; grande engano. Alberto Landgraf inaugura seu Bossa, em Londres, com tranquilidade invejável.
Talvez porque esteja trabalhando com um time já bastante afiado, vindo do seu carioca Oteque. É o caso, por exemplo, de Laís Aoki, sommelière, e Nilson Chaves, o braço direito de Alberto no Rio, que agora comanda a cozinha londrina.
Apesar da equipe expatriada, a casa nada tem a ver com o projeto carioca: os investidores são ingleses e o “namoro” entre o chef e o grupo começou quando Alberto cozinhou no Lyle’s, em Londres, no início do ano passado.
Com um pé direito altíssimo e 40 lugares com ótimo espaço entre as mesas, a casa é bem maior do que eu imaginava. A cozinha aberta para o salão imponente pode sugerir uma cozinha ambiciosa, como a do Oteque, mas a ideia do chef é apenas mostrar para o público que existe uma comida brasileira além da feijoada e do churrasco que, claro, têm seu papel, mas não são os únicos representantes do que somos. Antes de mais nada, quer que o Bossa seja um bom restaurante.
Alberto tem uma longa relação com o país: formado em gastronomia no Westminster College, trabalhou com o Gordon Ramsay (quando ainda habitava cozinhas), Tom Aikens e Anthony Demetre – que, aliás, me deu uma bela lista de ótimos restaurantes em Londres quando visitei seu Wild Honey St James, mas isso é outro post.
Um moqueca de frutos do mar entra como representante dos clássicos brasileiros. De resto, ingredientes bem nossos aqui e ali, mas sem caricaturas. Comecei com um bom olho de boi com bottarga, frutas vermelhas e alga kombu; depois parti para o vinagrete de polvo com ervilhas frescas, maçãs e creme de páprica; as gigantes vieiras com alho poró, trigo sarraceno e tucupi; um ótimo tutano na brasa com picles de cebola roxa e tapioca ao lado, com creme de castanha de caju; secretos de porco com purê de maçã e berinjela; e ainda um linguado no vapor com abobrinha, soja fermentada e leite de castanha de caju. Tudo muito bom.
Para rimar com o cardápio, uma carta cheia de sazonalidade e frescor, como comenta Laís. A ideia é mostrar um país diverso, de dimensões continentais e grande influência de imigrantes através de suas bebidas. São 120 rótulos de vinhos, saquês, cervejas e bebidas não alcoólicas, na carta que ainda aguarda a chegada de algumas garrafas, sempre pouco convencionais como é a assinatura da sommelière. Apesar de priorizar vinhos de mínima intervenção, entendeu que alguns clientes do bairro são mais conservadores, então não levanta grandes bandeiras. O importante é ser uma carta boa com castas, regiões e produtores menos óbvios.
Last, but not least, o bar, por si só, vale a visita. “Londres é o epicentro da coquetelaria mundial e é um prazer poder usar esse nível de garrafas para as bebidas de base”, diz Danilo Nakamura, responsável pela criação, conceito e treinamento da carta do bar comandado pelo competente Vinicius Kodama. Ter liberdade de criação com liberdade financeira para servir as melhores bebidas de base é algo que fica claro no caso do Dream of Adonis, uma releitura do drink clássico, só que feita com um Jerez da Equipo Navazos e Sacred English Spiced Vermouth (que tal?); ou ainda o Black Pepper, em que a pimenta entra tostada e “tremendo” antes de prepararem o xarope, como brinca Danilo, e vem com nada menos que Monkey Shoulder Blended Scotch e um toque de Laphroaig emprestando a nota defumada. Divino. E sim! O balcão tem a melhor caipirinha que você provou, além da Mezcladinha, feita com cachaça e mezcal, em porções iguais. Dá para morar ali.
Fiquei pensando na conveniência que é ter um restaurante desse nível no mesmo prédio do Consulado do Brasil em Londres. Melhor cartão de visitas não há.