“Quem utiliza a mentira como arma midiática sempre vai ganhar a guerra”
Porta-voz das IDF, major Rafael Rozensjahn fala sobre a guerra de narrativas deflagrada desde o massacre de civis judeus pelo grupo terrorista do Hamas

Segunda-feira à noite e o Teatro Clara Nunes, no Shopping da Gávea, estava lotado de cima a baixo. O motivo não era uma estreia de peça com atores globais, tampouco a curta temporada de alguma montagem concorrida, mas sim, a presença de um oficial de guerra que trazia notícia do front, dessas que infelizmente estão passando ao largo do algoritmo da maioria da sociedade civil. Rafael Rozensjahn é carioca, judeu, pai, major das Forças de Defesas Israelenses e tornou-se porta-voz para a língua portuguesa em tempo recorde pelo pior motivo possível. Enquanto seus colegas que antes ocupavam esse cargo tiveram em média dois anos para se preparar para a função, Rafael teve algumas horas para tornar-se um verdadeiro “anjo da morte”, após o massacre contra civis judeus cometido pelo grupo terrorista Hamas, em 7 de Outubro de 2023. Foram tantos homens, mulheres, crianças, bebês e idosos judeus assassinados em um mesmo dia, que foram necessárias diversas pessoas imbuídas do cargo para darem as notícias pessoalmente às famílias.
O horror cometido à época – ainda sem final, visto que a guerra na Faixa de Gaza continua em franca operação, milhares foram mortos em confronto desde então e ainda restam 50 reféns civis judeus sequestrados em posse dos terroristas – é o ponto de partida para um fenômeno, em especial, assunto principal desta coluna: a verdadeira guerra de narrativas nas redes sociais. Um dos problemas mais graves do mundo atual é a crise epistêmica que afeta a nossa percepção do que é a realidade. Por conta do modo de funcionamento das redes sociais, onde quem manda é o algoritmo de cada usuário baseado nos seus próprios interesses, a polarização de visões é alimentada de maneira industrial por bolhas dissonantes que só querem saber do seu próprio viés de confirmação. Entretanto, entre lados diametralmente opostos, há um fator que vem sendo ignorado e que nos traz ao link com o evento do major Rafael Rozenszajn: as fontes confiáveis.
Quando veículos dito sérios imprensa afora consideram o “Ministério de Saúde da Faixa de Gaza” como uma fonte para se confiar e a publicam, elas estão ignorando o simples fato de que essa fonte é o Hamas, grupo controlador da região, logo, estão sendo coniventes com a desinformação intencional provocada por um grupo terrorista. Essa é a principal forma do Hamas operar desde sempre, mas o modelo ganhou forte tração com a renovação do antissemitismo, ódio ao povo judeu que nunca deixou de existir, e de tempos em tempos reaparece sob nova roupagem.
É claro que a situação da guerra em Gaza é extremamente complexa, que a política de Israel pode ser questionada e que dentro do próprio país há diversos movimentos que condenam o governo atual. Entretanto, para além da política, refletiremos aqui sob como uma guerra midiática pode impactar no aumento expressivo de ódio aos judeus, resultando em uma série de episódios de violência contra esta minoria em diversos países do mundo. Sim, minoria. A palavra, atualmente usada para se referir a diversos recortes de maneira pouco literal, tem um caráter semântico incontestável para se referir a um grupo de pessoas que, seja por características étnicas, religiosas, culturais ou outras, é numericamente menor em relação ao grupo dominante em determinada sociedade. No Brasil, por exemplo, são apenas 120 mil judeus atualmente, segundo a Confederação Israelita do Brasil (CONIB).
Minoria essa que vem sendo alvo frequente de um discurso antissemita atávico propagado em algumas linhas de desinformação intencional de redes sociais que as classifica como colonialista, imperialista e propõe que a palavra “sionista” seja associada ao Nazismo, a ideologia fascista de Hitler que matou mais de seis milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Sionista em tradução direta significa ser um apoiador ou defensor do sionismo, um movimento político que visa o estabelecimento e a manutenção de um lar nacional para o povo judeu, e é importante notar que o sionismo não se limita apenas a judeus, pessoas de outras origens também podem ser sionistas É esse tipo de fake news e desinformação que não só Rafael, mas diversos outros representantes da comunidade judaica estão trabalhando dia e noite para explicar.
O evento realizado no Teatro do Shopping da Gávea na noite desta segunda-feira (11), por exemplo, marcou a comemoração dos 20 anos do Hillel Rio, instituição cultural e educacional sem fins lucrativos voltada para a juventude da comunidade judaica carioca. Entre os seus diversos objetivos estão cursos de letramento e compreensão histórica do antissemitismo. É notável também o trabalho da StandWithUs Brasil, instituição educacional sobre Israel, em seu papel de educar de maneira didática e com muito diálogo sobre o assunto através das redes sociais, eventos e palestras.
Em determinado momento do bate-papo com o major, que foi conduzido belamente pela jornalista Mariliz Pereira Jorge, ela pergunta para ele porque um porta voz que fala português em meio a tantas outras possíveis nacionalidades. Ele explica que o Brasil é um país extremamente estratégico por conta da quantidade de pessoas que gostam de Israel por aqui, porque temos dirigentes no Conselho de Segurança da ONU e porque o país é muito extenso. Entretanto, há um problema em comum por aqui: “Ninguém realmente sabe o que está acontecendo na Faixa de Gaza”, disse Rafael Rozenszajn convidando a todos a lerem mais fontes confiáveis, ouvirem mais sobre a guerra de maneira oficial e pesquisarem mais antes de compartilharem posts em redes sociais. Nesse ponto, infelizmente, há um consenso.
Carla Knoplech é diretora da agência Forrest, de conteúdo e influência digital, jornalista e professora