Luiza Helena Trajano lança movimento para salvar o Rio
A dona da Magazine Luiza disse ainda que vai pedir ajuda da presidente mundial do Santander para a capital fluminense
Quando Luiza Trajano Donato fundou a Magazine Luiza com o marido, em 1957, no interior de São Paulo, ela pediu à única sobrinha, Luiza Helena Trajano, que começou a trabalhar aos 12 anos de idade e hoje é presidente do conselho de administração da rede, que não montasse lojas no Rio por causa da violência. De fato, a Magalu nunca teve filial por aqui, mas Luiza Helena admite o débito com a cidade, o segundo maior mercado no e-commerce da empresa. Na noite desta quarta (7), ela esteve no auditório da Federação da Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), no Centro, para tentar aliviar essa dívida.
A espevitada empresária de 66 anos lançou oficialmente o núcleo carioca do grupo Mulheres do Brasil. O movimento, criado em 2013 por ela e por empresárias como Chieko Aoki, da Rede Blue Tree Hotels, reúne lideranças femininas para formular ações e políticas públicas que beneficiem o país (e as mulheres) em áreas como educação, saúde e empreendedorismo. “Vim passar a minha lua de mel no Rio, há quarenta anos, quando todo mundo viajava para a Europa. Sou apaixonada pela cidade. Não tenho apartamento em lugar nenhum do mundo, mas tenho dois flats em Ipanema. Não podemos deixar o Rio morrer”, disse em meio a 600 mulheres, entre elas as atrizes Beth Goulart, Nicette Bruno e Rosamaria Murtinho, arrancando uma salva de palmas. “No fim do mês, o Mulheres do Brasil vai receber em São Paulo a Ana Patrícia Botin, presidente mundial do Santander, e nós vamos pedir para ela ajudar o Rio”, avisou.
O voo da águia
Mulher de fala bastante simples, Luiza gosta de comparar a capital fluminense – e o Brasil – a uma águia. Nos telões do grande salão da Firjan, um vídeo revelou que, quando completa 40 anos, a ave se imbui de coragem, arranca o próprio bico, as penas e as unhas para então renascer e viver por mais 40 anos. “Quem me deu essa fita foi o saudoso Edson Bueno, fundador da Amil. Eu acredito que o país não vai mudar se a sociedade civil não tomar coragem e assumir as rédeas de forma organizada”, emendou. O Mulheres do Brasil vem lutando, por exemplo, pelo projeto de lei de cotas que define um percentual mínimo de participação de mulheres no conselho de administração de empresas do governo ou de capital misto. A proposta já passou pelo Senado, e agora só precisa da aprovação na Câmara dos Deputados. Elas preveem que, até 2022, uma fatia de 30% dos conselhos empresariais será formada por mulheres.
O grupo elaborou ainda uma cartilha sobre como criar e manter, em uma empresa, um canal para receber denúncias de violência contra a mulher. “Criei esta linha na Magazine Luiza depois que, em setembro do ano passado, uma gerente nossa foi morta pelo marido a canivetadas. Em quatro meses, recebemos 80 denúncias. Agora, vou pedir a presidentes de outras empresas que repliquem o modelo”. Apartidário e sem nenhum tipo de financiamento externo, o Mulheres do Brasil se sustenta com as palestras que Luiza Helena dá Brasil afora e com doações das próprias integrantes do grupo. “Eu tenho muito medo do dinheiro e do poder”, diz a dona da Magazine Luiza, o que ajuda a explicar por que ela nunca se candidatou à vida pública apesar de sua estreita relação com a política – a empresária já foi conselheira informal da ex-presidente Dilma Rousseff. Perguntada se este seria o momento de uma mulher assumir mais uma vez a presidência, desconversou: “Ainda é cedo para falar de eleições”.
Extremamente nacionalista, do tipo que manda pendurar uma bandeira do Brasil em todas as lojas de sua rede e convoca os funcionários a cantar o hino nacional às segundas-feiras, além de rezar, Luiza Helena também anda empolgadíssima com o projeto do grupo Mulheres do Brasil de montar uma loja física e outra on-line dedicada ao artesanato brasileiro. Fã do Sistema Único de Saúde (“a ideia é maravilhosa, mas mal executada”, disse), ela antecipou ainda que irá entregar ao governo, em breve, um programa para fazer o SUS funcionar. “O problema da saúde não é dinheiro, é falta de gestão”, disparou.
Avante, Rio
À frente do núcleo fluminense do Mulheres do Brasil estão Andrea Carvalho, fundadora da Papel Semente e embaixadora da Rede de Mulheres Empreendedoras, Cátia Tokoro, vice-presidente de B2B da Oi, e Maria Cecília Almeida Silva, pró-reitora da Faculdade Pró-Saber, que forma professoras para trabalhar com educação infantil nas favelas (a atriz Beth Goulart vai ministrar aulas de teatro para empoderá-las e estimular a criatividade). “Quem quiser, vem ser líder!”, gritou Luiza Helena após puxar um coro da marchinha Cidade Maravilhosa. Por enquanto, vinte mulheres participam da filial carioca do grupo, mas no Brasil já são mais de 15 000 empreendedoras de diferentes classes sociais. “Não acreditamos em movimento elitizado, apesar de termos acolhido, sim, muitas mulheres com dinheiro. As executivas estão sendo cortadas das empresas, e isso é muito sério”. Notava-se no auditório, diga-se de passagem, algumas bolsinhas Chanel e Hermès, além de brincos e colares de esmeraldas.
O primeiro encontro do braço carioca do grupo Mulheres do Brasil está marcado para o próximo dia 15, às 16h, em Ipanema (Rua Visconde de Pirajá, 54), quando serão definidas as ações a serem realizadas daqui para frente na cidade. Detalhe importante: homens também são bem-vindos, mas o protagonismo é delas. “Juntas nós podemos mais”, encerrou Luiza Helena convidando a plateia a entoar os versos da música Prelúdio, de Raul Seixas: “Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade”.