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Rua da Carioca

O drama de uma rua histórica e temerosa quanto ao seu futuro Protesto. Faixas na Rua da Carioca anunciam a insatisfação de seus lojistas e locatários acerca da venda dos imóveis para um banco de investimento. por Pedro Paulo Bastos Avistar faixas e cartazes pelas ruas é sempre motivo de curiosidade para qualquer pedestre. Podem […]

Por Pedro Paulo Bastos
Atualizado em 25 fev 2017, 19h15 - Publicado em 9 jan 2013, 02h09

O drama de uma rua histórica e temerosa quanto ao seu futuro


Protesto. Faixas na Rua da Carioca anunciam a insatisfação de seus lojistas e locatários acerca da venda dos imóveis para um banco de investimento.

por Pedro Paulo Bastos

Avistar faixas e cartazes pelas ruas é sempre motivo de curiosidade para qualquer pedestre. Podem ser os anúncios do Rock in Rio ou a advertência da Prefeitura sobre a interdição de Copacabana no 31 de dezembro, não importa. Aqueles pedaços de pano (às vezes são de plástico), com letras garrafais, pendem de um poste ao outro, bem no campo de visão do motorista. E a verdade é que é bem fácil de reconhecer o teor da mensagem – boa ou ruim – mesmo sem a leitura. Na Rua da Carioca, no Centro do Rio, por exemplo, mesmo quem não lê os jornais e se depara com a quantidade de cartazes pela via consegue reconhecer que o clima não tem sido dos melhores por lá.
 
Era véspera da véspera de Natal quando fui percorrer a Rua da Carioca. Um sábado atípico para o Centro, com uma quantidade anormal de pessoas saindo da estação Carioca do metrô, sob o Convento de Santo Antônio, em direção às ruas Uruguaiana e Alfândega, pólo comercial popular da cidade. Quem deixou para comprar os presentes na última hora, o Centro foi a opção, levando um mar de gente às suas ruas que só é visto em dias úteis em horário bancário. O calor não perdoava, enquanto um grupo de indígenas embalava como fundo musical daquele cenário urbanoide a suave e doce melodia das suas flautas. Como nada é harmônico em uma grande metrópole como o Rio, em outro canto da antiga Praça Estado da Guanabara, uma caixa de som ecoava os sucessos sertanejos de 2012.
 


Corredor arquitetônico. A Rua da Carioca concentra uma grande quantidade de imóveis históricos do Centro do Rio, descaracterizados para abrigar estabelecimentos comerciais nos seus térreos.


Atrativos. O café, no número 10 da rua, retoma ares vintages dignos do Centro Antigo, enquanto pedestres circulam em busca do melhor presente de Natal no sábado, 22 de dezembro.

 
A Rua da Carioca faz parte de um corredor viário do Centro, constituído pela Avenida Nilo Peçanha e as ruas da Assembleia, Visconde do Rio Branco, Frei Caneca e, mais ao longe, Salvador de Sá e Estácio de Sá, na periferia central. A Rua da Carioca não tem grandes atrativos comerciais como a Uruguaiana, região adjacente, embora naquela véspera da véspera de Natal o seu panorama resumisse bem o quanto a economia brasileira anda de vento em popa como anunciam os jornais. O consumo estava às alturas. Já tinha notado em outros bairros comerciais do Rio como as lojas têm estado cheias, como as livrarias de grande porte têm acumulado filas diante de suas caixas registradoras, como o ar condicionado não tem dado conta de tantos consumidores inseridos num mesmo metro quadrado. Todos estão ávidos por compras. Só acreditava que a avidez fosse segmentada por lojas e produtos populares, coisas de uso corriqueiro, pechinchas.

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Com todo o respeito às demais, são três estabelecimentos comerciais que fazem as honras na Rua da Carioca por suas tradições e “tempo de estrada”: A Guitarra de Prata, Vesúvio e Bar Luiz. Ocupadas em casarões centenários, A Guitarra de Prata, por exemplo, especializada em instrumentos e aparatos musicais, estava lotada, um entra-e-sai de pessoas que se percebia que vieram de longe para ir exclusivamente até lá. Em tempos de compras online, de centros comerciais modernosos – o Village Mall é o mais novo da praça – e de bairrismos exarcebados, uma loja modesta, de mais de cem anos de existência no Centro, num sábado de manhã, estava requisitadíssima. A vizinha Vesúvio, especialista em guarda-chuvas e guarda-sóis simpáticos, tinha a sua vitrine admirada pela clientela e por transeuntes, divididos entre brasileiros e turistas, notadamente europeus pela pele rosada e o cabelo loiro-liso quase esbranquiçado.


Tradição. A loja Vesúvio, especializada em guarda-chuvas e guarda-sóis, vizinha à centenária A Guitarra de Prata, de instrumentos musicais.


Outras tradições. Templo da saliência, o Cine Íris é popular entre o público masculino que circula pelo Centro nos dias úteis. Já o Bar Luiz, à direita, figura como um dos restaurantes mais antigos e tradicionais da cidade, mesmo com ares decadentes.

Mais do que um corredor viário, a Rua da Carioca é um corredor arquitetônico. Fica difícil enumerar todos os estilos ou detalhes embutidos nos edifícios que lá se encontram – além da variabilidade, não sou especialista em arquitetura. Tenho de me restringir às impressões pessoais, aos meus gostos. Não faz parte da minha rotina de passear pelo Centro aos fins de semana. Durante os dias de trabalho, todos passamos tão depressa por suas ruas, concentrados em desviar-nos dos constantes choques de corpos na multidão de trabalhadores, que raramente olhamos para o alto – a não ser para limpar o rosto molhado por aquela gota de ar condicionado despejada lá de cima. A Rua da Carioca hoje, no nível da rua, está vulgarizada, e não me refiro ao Cine Íris, mas sim por um monte de estabelecimentos comerciais que não se encaixam com a sua conjuntura histórica. São letreiros de gostos duvidosos, descaracterizações arquitetônicas que berram, sem mencionar a sujeira e o cheiro de urina exalado pelas suas esquinas, principalmente nos arredores da Avenida República do Paraguai.
 
No entanto, o levantar-de-cabeça na Rua da Carioca pode ser supreendente. Se da metade para o térreo dos casarios imperam as lamentações daqueles que amam a cidade, na parte superior, pelo menos, há algum tipo de compensação. Muitos desses imóveis passaram por uma remodelação minuciosa na sua fachada. A grande maioria foi contemplada com um novo jogo de cores, não tão pitorescas quanto as exuberantes do Caminito, na capital argentina, embora suficientemente alegres (e sóbrias, ao mesmo tempo) para recuperar os detalhes das nossas origens residenciais. Os anos de construção se exibem nos topos pomposos dos prédios, apesar das conservadas e arqueadas janelas e portas não apresentarem vida, tampouco aparição alguma de personagem com vestes de outrora nas sacadas. A pintura é um fato, embora a fragilidade e o aspecto carente destes casarios também o sejam.


Diferenças. Em função do alargamento da Rua da Carioca, no início do século XX, o estilo arquitetônico mostra-se diferente de um lado para o outro da calçada.


Rio pra quem? Casario amarelo na esquina com a Rua Ramalho Ortigão, e a intervenção artística em um muro nos arredores da Avenida República do Paraguai, bastante condizente com o drama que a Rua da Carioca tem vivido.

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Sabe-se que a manutenção destes imóveis tem um alto custo para os seus proprietários, mesmo para as grandes corporações. A detentora dos imóveis na Rua da Carioca era a Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência que, sem condições de arcar com as despesas de manutenção, vendeu suas posses por R$ 54 milhões ao Opportunity Fundo de Investimento em meados do ano passado, 2012. Os temores de despejo e do aumento do aluguel das lojas tradicionais persistem, mesmo com o aviso do banco sobre o “relax, take it easy”, de que apenas algumas exigências serão feitas aos inquilinos, como o estímulo à preservação dos espaços e o compromisso de reajuste do valor do aluguel de acordo com o que se tem praticado no mercado.
 
Outras faixas menores, amarradas sobre as fachadas recém-remodeladas, não expressam conformismo, agradecimentos ou espirituosidade. “A Rua da Carioca é patrimônio nacional”, anuncia um dos cartazes. Em tempos de preparativos para Copa do Mundo e Olimpíadas, onde nem uma premiada escola municipal – a Friedenreich, no Maracanã – escaparia das demolições impostas pelo interesse de um pequeno grupo de pessoas, todo cuidado é pouco para a sofrida Rua da Carioca.

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