Interação com inteligência artificial é capaz de afetar a saúde mental?
Algoritmos se limitam a exibir apenas o que é de interesse do usuário e empobrecem a experiência de vida

Artigo publicado pela Escola de Saúde Pública da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, se dedicou a investigar “A potencial influência da Inteligência Artificial na saúde mental da população”. Segundo a autora, Catherine Ettman, professora assistente da Universidade, a influência é uma realidade na medida em que chatbots, como o ChatGPT, estão sendo usados para as mais diferentes finalidades, como médicos, psicólogos e terapeutas. Indo mais além, a I.A. alteraria a maneira como interagimos com as coisas que nos deixam mais satisfeitos, saudáveis e felizes.
Criada para ser uma ferramenta de auxílio a questões práticas, a inteligência artificial é desprovida de criatividade e vontade própria. Ainda… porque há quem defenda que isso é questão de tempo. No entanto, algumas pessoas, de fato, começam a estabelecer relações de afeto ou dependência com as ferramentas de inteligência artificial disponíveis.
Segundo Ettman, o público sob maior risco dessa condição são as pessoas com questão de relacionamento ou interação social, que já tendem a um certo isolamento. Como a inteligência artificial dispensa o modus operandi típico das relações entre humanos, a tendência natural dessas pessoas seria se refugiar em interrelações com a I.A.
E quanto mais se usa a I.A., mais ela conhece o usuário. Os algoritmos passam a dominar os temas de interesse de quem a acessa. Em bom português, o sistema passa a “jogar para a plateia”, na tentativa de agradar, limitando-se a exibir apenas conteúdo agradável ao receptor. A prática é extremamente prejudicial porque nega o contraditório, fecha o usuário em bolhas, afasta a possibilidade de novos conhecimentos e da diversidade, empobrecendo a experiência como um todo.
Por sua falta de maturidade emocional, jovens costumam estar entre o público mais impactado. Trata-se de uma faixa etária que se compara muito aos colegas e amigos, ainda estão descobrindo quem são e qual seu lugar no mundo, uma fase da vida de tomada de conhecimento e construção de pensamento crítico. A pesquisadora americana considera que, justamente neste momento da vida de ver isolado socialmente, interagindo com máquinas, é bastante danoso.
Todo esse cenário ainda é muito novo e é difícil prever o futuro dos caminhos da inteligência artificial. No entanto, o que se pode afirmar sem medo de errar, é que nenhuma experiência substitui o contato humano para o desenvolvimento saudável das funções cognitivas, comportamentais e sociais. A saúde mental do ser humano se fortalece a partir da exposição a experiências diversas, ricas, que amplie e provoque a expansão do conhecimento socioemocional no mundo real.
Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp (CRM 5249669-2 e RQE 21502); professora da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.