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Analice Gigliotti

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Comportamento
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Histórias de amor e terapia: a inteligência artificial ocupa novos espaços

O que mais estimula o crescimento dessas modalidades de uso da I.A. é a falta de necessidade de interação com outro humano

Por Analice Gigliotti
28 nov 2024, 11h06
Mulher segura um laptop enquanto olha pra tela.
As redes sociais tem trazido cada vez mais relatos – especialmente de jovens – que afirmam estar em um relacionamento sério com a inteligência artificial.  (Freepik/Reprodução)
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Parece coisa de filme. E foi. Em 2013, o cineasta Spike Jonze filmou “Her”, a história de um homem (Joaquin Phoenix) que se apaixona pela voz do sistema operacional do seu computador (Scarlett Johansson). Há pouco mais de uma década, quando o filme foi feito, parecia coisa de ficção científica. Mas a realidade tem sido mais veloz do que pode supor a imaginação.

As redes sociais tem trazido cada vez mais relatos – especialmente de jovens – que afirmam estar em um relacionamento sério com a inteligência artificial. Pode parecer estranho para quem tem mais idade (e um pouco mais de experiência na vida), mas atualmente existem mais de 100 aplicativos que disponibilizam companheiros românticos e sexuais com diversas opções de personalização, incluindo características físicas e de personalidade.

Conhecidos como chatbots, esses aplicativos são surpreendentemente realistas, se adaptam ao usuário com rapidez e tem interação fácil. Resultado: são capazes de manter conversas, constroem e oferecem respostas a partir dos temas de interesse dos usuários.

Com o avanço da tecnologia, esses recursos estão perturbadoramente cada vez mais assemelhados aos humanos, o que tem levado pessoas a criarem vínculos emocionais com os aplicativos. Podemos aventar uma série de razões para que o filme “Her” esteja se tornando realidade. A vida online deixou muita gente isolada, as decepções amorosas e o sentimento de solidão são crescentes, bem como a pouca maleabilidade para ceder ou aceitar a diferença. Ou seja: acaba sendo mais fácil se relacionar com a máquina do que com humanos – ainda mais se essa mesma máquina se comporta como tal.

Essa tem sido a razão também para outra bizarrice que tem sido mostrada nas redes: pessoas que trocaram a psicoterapia com seres humanos para se “tratarem” com a inteligência artificial. Estes jovens afirmam que a I.A. está sempre disponível e tem sempre ótimos conselhos a dar. O que eles desconhecem é que ela não está orientando baseado num processo de escuta, mas vasculhando uma infinidade de dados, baseado em algoritmos, para entregar exatamente o que o “paciente” quer ouvir. Sem entrar no mérito que conceitos básicos imprescindíveis, como senso crítico (sobre os outros e sobre si mesmo), silêncios, e aceitação do contraditório passam a ser escanteados.

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A inteligência artificial já trouxe conquistas sensacionais em diversas áreas, da telecomunicação à medicina. No entanto, não deixa de ser com um acerto susto que observo seus novos usos. Fico curiosa para observar até onde irá o uso que o ser humano dará à I.A. na tentativa, infelizmente cada vez mais frequente, de evitar outro ser humano.

Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.

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