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Analice Gigliotti

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Comportamento
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Depois do FOMO, o JOMO: o prazer de fazer o que se tem vontade

Imposições sociais perdem lugar para a alegria de arbitrar sobre o próprio desejo

Por Analice Gigliotti
26 jun 2024, 19h05
Mulher sentada em uma cama segura uma caneca branca e sorri.
Prazer de estar por fora: novo comportamento ganha cada vez mais adeptos. (Freepik/Reprodução)
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Há algum tempo, falou-se de um padrão de comportamento que estava se tornando comum em diversas sociedades, o FOMO, ou fear of missing out (em tradução livre, algo como “medo de ficar por fora”). Era um termômetro do nosso tempo: vidas hiperconectadas, com capacidade de criação de conteúdo e disseminação de informação avassaladoras.  

Talvez este ainda seja um padrão de comportamento válido para muitas pessoas, mas começa-se a notar uma nova tendência, tanto no exterior como no Brasil, o JOMO: joy of missing out, ou “o prazer de estar por fora ou de fora”. O novo esquema pode ser interpretado como uma “ressaca” do padrão anterior: depois do excesso de informação e compromissos, o prazer de simplesmente se fazer apenas o que gosta, quando quer, sem sofrer por estar perdendo qualquer outra coisa.

O JOMO defende um comportamento que, aos olhos de hoje, soa quase revolucionário: viver a alegria genuína de perder uma festa ou encontro – aos quais, geralmente, muita gente sequer tem vontade de comparecer e vai por pura pressão social – sem peso na consciência.

Arrisco dizer que a pandemia antecipou esse caminho. Se por um lado, a falta de vida social imposta pelo isolamento deixou sequelas significativas, por outro lado, muita gente também passou a se sentir desobrigado de compromissos. A pandemia deixou muito explícito que o tempo de vida é precioso demais – e já bastante tomado por obrigações inegociáveis – para desperdiça-lo ainda mais com atividades que podem ser declinadas em nome de algo maior: respeitar a própria vontade. Bloquinho no Carnaval às sete da manhã? Show lotado na praia? Viajar no Reveillón? Não, obrigada. A série da moda, o filme da vez, o show imperdível? De novo: não, obrigada. Sem culpas ou constrangimentos.

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Uma amiga, que na juventude não perdia uma festa ou encontro social, comentava outro dia que agora, às portas dos cinquenta anos, nada se compara ao prazer de curtir a sua casa. Ela se diverte ao lembrar que, quando era jovem, não entendia o comportamento do pai que… gostava de ficar em casa, cuidando do jardim, dos bichos e lendo seus livros. Não tem nada a ver com intransigência ou até mesmo depressão, já que o JOMO não traz prejuízos à vida de seus adeptos. Trata-se, na verdade, de encontrar a felicidade de outra forma.

Há algumas semanas, a apresentadora Ana Paula Padrão fez um post na sua rede social que rapidamente ganhou grande adesão e viralizou – talvez pelo poder de identificação com seus seguidores. No post, Ana Paula apontava uma curiosa mudança na forma com que as pessoas passaram a enxergar os dias de férias: se até algumas gerações atrás o período de descanso era planejado para se aproveitar ao máximo com as horas lotadas de programações, hoje tudo que as pessoas desejam é… não ter compromisso algum. Passamos a tirar férias para não fazer nada, sem culpa. Esse sim é o verdadeiro luxo do nosso tempo.

Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.

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