Apostas online e cigarros eletrônicos: pesquisa mostra que jovens são alvo
Sites de apostas on-line já superam o jogo do bicho em popularidade

Mais de um terço das pessoas que participam de jogos de apostas (38,6%) enfrenta algum grau de risco ou transtorno relacionado ao vício. Os adolescentes são o grupo mais vulnerável: 55,2% dos apostadores na faixa etária de 14 a 17 anos apresentam este quadro. Os jovens se destacam também no uso de dispositivos eletrônicos de fumar (DEFs), conhecidos como cigarros eletrônicos ou vapes.
Esses dados inéditos estão disponíveis no Observatório Brasileiro de Informações dobre Drogas (Obid), do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O documento traz dados comparativos de 2006, 2012 e 2023 e abrange 16 mil pessoas classificadas como adolescentes (de 14 a 17 anos) e adultos (a partir de 18 anos).
A plataforma é responsável por centralizar informações, subsidiar políticas públicas, promover a integração interinstitucional, disseminar conhecimentos sobre substâncias e incentivar práticas inovadoras. O estudo foi coordenado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com financiamento da Senad, para mapear padrões de consumo e comportamentos associados ao uso de substâncias no Brasil.
Ainda sobre aposta em jogos de azar, 10,5% dos adolescentes dizem que jogaram, considerando o último ano. O porcentual sobe para 18,1% entre os adultos. O Sul é a região do Brasil com maior adesão à prática. Na sequência, estão Centro-Oeste, Sudeste, Norte e Nordeste. Um dado curioso é que os sites de apostas on-line já superam o jogo do bicho em popularidade.
Quanto ao fenômeno dos Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs), conhecidos como cigarros eletrônicos ou vapes, a pesquisa indicou outro ponto de alerta: 77,6% dos usuários afirmam que esses produtos não os ajudaram abandonar os cigarros tradicionais. Essa informação é fundamental pois este era o principal argumento de defesa do utensílio que, já se sabe, não apenas não colabora no processo de parar de fumar, como tem potencial de aumentar a adição.
O estudo mostra ainda que a maior parte dos usuários de cigarros eletrônicos é adolescente, nos três cenários analisados: no último mês, no último ano e na vida. Curiosamente, este é um público que não recorre ao dispositivo para parar de fumar, mas em busca de diversão, por curiosidade ou pressão dos amigos.
Além de liderarem o consumo no último ano, 12% das mulheres adolescentes já usaram o dispositivo em algum momento. Apesar do maior uso dos dispositivos entre o público adolescente, a idade média de experimentação é de 24 anos. Entre os jovens usuários de vapes, 31,8% consumiram o produto no último mês. O resultado disso é que estamos testemunhando jovens, cada vez mais cedo, apresentando quadros de doenças pulmonares equivalentes a fumantes que cultivaram o hábito do cigarro por décadas.
Na apresentação do Obid, o ministro Ricardo Lewandowski sinalizou que os resultados aferidos iriam guiar as políticas públicas. Urge que a esfera federal lance sinais concretos de atitudes contra a propagação dos sites de apostas online e uso de vapes, especialmente pelo bem da saúde dos nossos jovens.
Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp (CRM 5249669-2 e RQE 21502); professora da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.