Correndo atrás do amor: grupos de corrida (também) são pontos de paquera
Cariocas transformam o treino em cenário de encontros e, às vezes, romances. E sim, ainda dá tempo de encontrar alguém antes do Dia dos Namorados

Já vi muita história começar em uma madrugada no Baixo Gávea ou em uma saideira no Leblon. Mas, nos últimos tempos, os encontros mais interessantes que presencio acontecem bem mais cedo — com direito a tênis, suor e muita endorfina. Grupos de corrida vêm se tornando o novo ponto de encontro dos cariocas, conectando pessoas para além da planilha, seja na amizade ou no amor. É, de longe, o lugar onde mais faço amigos. E — não é o meu caso — mas entre um treino e outro, vejo, muitas vezes, rolar um “match”.
E não sou só eu que percebo. Grupos de corrida e aplicativos como o Strava, originalmente voltados para exercícios, vêm se tornando pontos de encontro. Não por acaso, o Strava já ganhou o apelido de “novo app de namoro”, um “Tinder dos atletas”. Em 2025, a plataforma ultrapassou 21 milhões de usuários no Brasil (eram 4 milhões em 2019). O boom da corrida no pós-pandemia trouxe gente em busca de saúde, rotina, leveza e conexão.
Rosana Fortes, maratonista e Country Lead do Strava no Brasil, resume bem o fenômeno: “O que observamos é a formação de comunidades. Correr em grupo aproxima quem já tem algo em comum: o desejo de bem-estar. E isso naturalmente gera conexão. No Brasil, os clubes no Strava cresceram 109% em 2024, mais que o dobro da média global. A corrida virou um ponto de encontro com propósito”.
No Rio, a Marun, criada pelo publicitário Ricardo Mendes, virou um símbolo desse movimento, unindo gente de todos os ritmos, inclusive os afetivos. “A gente nunca se propôs a ser uma assessoria esportiva. Nunca foi sobre performance. A corrida é só um meio. O fim é a conexão”, faz questão de esclarecer. O projeto nasceu em 2021 como um movimento entre amigos e hoje reúne mais de 150 pessoas em encontros semanais.
“A corrida vira um funil de afinidade. Quem está buscando um estilo de vida mais saudável acaba se encontrando ali, com quem está no mesmo momento. A sinergia puxa a conexão.”
Ricardo Mendes, fundador da Marun

Após a parceria com um app de relacionamento, a equipe também ganhou o apelido de “novo Tinder dos corredores”. “A gente nunca teve esse foco. A relação de casal é uma entre tantas que surgem ali: entre amizades, parcerias de trabalho, apoios reais. Isso é mais importante pra gente”, defende ele. “Isso acontece como em qualquer lugar: no trabalho, na faculdade… O clube só facilita algo que já iria acontecer naturalmente. O importante é que aconteça com respeito.”
No Strava, essa tendência não só aparece — ela se confirma com dados. Segundo o relatório Year in Sport, 76% dos brasileiros afirmaram ter feito novos amigos praticando esportes. Entre os jovens da Geração Z, 33% já saíram com alguém que conheceram em um treino. O amor está, literalmente, no ar. E o melhor: atividades em grupo duram, em média, 40% mais que as feitas sozinhas.
“O esporte virou uma forma de conhecer gente nova. O brasileiro é caloroso: dá o dobro de kudos que a média mundial. Cria clubes, organiza treinos. A gente vê a plataforma sendo usada não só pra buscar performance, mas pra pertencer. As pessoas querem estar com quem compartilha valores. Isso cria laços mais verdadeiros”
Rosana Fortes, maratonista e Country Lead do Strava no Brasil
Na Marun, isso se traduz em um clima leve e descontraído. Os encontros incluem dinâmicas de apresentação para quebrar o gelo e a famosa resenha do “Gossip Pace” — o pace fofoca, aquele ritmo mais suave, ideal para bater papo durante o treino.
“Tem quem chame de Sexy Pace (pace paquera), mas a gente prefere dizer que tudo começa com fofoca e, se rolar clima, vai evoluindo. Nosso objetivo é acolher, fazer com que ninguém corra sozinho.”
Foi assim com Lucas Vasconcellos, que conhecia de vista a atual namorada, Julia Tizzano, mas se aproximou dela de verdade num treino. “No dia seguinte ao primeiro beijo, a gente já estava de novo na pista, meio sem saber se dava beijo na boca ou no rosto. Mas foi.” Hoje, eles correm juntos pelo menos duas vezes por semana. “A verdade é que, depois que começamos a correr juntos, nunca mais desgrudamos.”
Histórias como essa se multiplicam. E mesmo quem não encontra um par romântico ganha algo valioso: tempo com gente de verdade. Como disse Ricardo: “A nossa medalha é ver as pessoas se sentindo melhor depois do treino. Se vier um amor junto, ótimo”.
E se você acha que é tarde demais para encontrar alguém antes do Dia dos Namorados, respira e amarra o cadarço. Ainda dá tempo. A Marun manterá seu encontro normal nesta quinta-feira à noite. “Vai ter casal, vai ter solteiro, e vai ter muita gente que só quer se sentir bem depois de correr. A gente acredita nisso: quando você se conecta de forma verdadeira, qualquer relação que vier é um presente”.

Lucas e Julia se conheciam de vista, mas foi na corrida que o namoro ganhou ritmo. “Nos conhecíamos de ‘oi/tchau’, apesar de já termos interesse um no outro. Mas começamos a nos aproximar na corrida mesmo e… foi!”, conta Lucas, rindo. “A verdade é que nunca mais desgrudamos. A corrida de terça da Marun entrou direto na cultura do casal. Vamos todas as semanas.”
Uma lembrança especial marca o início da história: “A corrida seguinte à primeira vez que ficamos foi engraçada. Nenhum dos dois sabia muito como reagir. Nos aproximamos e ficamos naquela dúvida: beijo na boca ou no rosto? Corremos… e no final estávamos grudados.”
Com o tempo, os treinos viraram parte importante da relação. “Com certeza, fortalece. Corremos juntos pelo menos duas vezes por semana. Quando viajamos, levamos o tênis. E, quando corremos sozinhos, parece que está faltando uma perna”, diz. “A gente planeja coisas correndo, fala da vida… e da vida dos outros também. Óbvio.”