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Trajetória de Dona Ivone Lara se confunde com a história do samba

Dona de uma rica trajetória que se confunde com a história do samba, a cantora e compositora tornou-se, por mérito, estrela das celebrações do centenário do gênero

Por Pedro Tinoco
10 dez 2016, 00h00
Dona Ivone Lara
Dona Ivone Lara (LÉO AVERSA/)
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Garantido em qualquer lista séria dos melhores sambas-enredo de todos os tempos, Os Cinco Bailes da História do Rio embalou o desfile do Império Serrano no Carnaval de 1965. Silas de Oliveira (1916-1972) dividiu a autoria do clássico com o amigo Bacalhau e uma pioneira: ao entrar na parceria, Dona Ivone Lara notabilizou-se como a primeira mulher a integrar a ala de compositores de uma escola da elite do Carnaval — e a primeira a emplacar um samba na avenida. Essa é uma das muitas proezas acumuladas pela cantora e compositora, hoje aos 94 anos, só um tantinho mais jovem do que o samba, cujo centenário se comemora em 2016. Filha de João, violeiro amador, e de Emerentina, cantora do rancho Flor do Abacate, Yvonne (o Y e o N dobrado posteriormente sumiriam do nome artístico) perdeu o pai aos 2 anos e a mãe aos 16. Não teve vida fácil, portanto.

Em seus tempos de internato, na escola Orsina da Fonseca, a jovem órfã passava os fins de semana na casa do tio Dionísio. A música, então, atacava em duas frentes. No coro das alunas, o registro de contralto da menina chamou a atenção da professora Lucília Guimarães, mulher do maestro Heitor Villa-Lobos. Em Inhaúma, no quintal do tio, a diversão vinha de rodas animadas por bambas como Pixinguinha e Jacob do Bandolim. Entre o orfeão do mestre Villa e os festejos do fim de semana, venceu o samba. À vontade no ambiente masculino dos compositores de quadras e terreiros, Dona Ivone Lara saiu-se melhor do que muito marmanjo, mesmo desdobrando-se em tripla jornada. Por décadas, ela dividiu a música com as tarefas de dona de casa — mulher do ciumento Oscar, mãe de Odir e Alfredo — e o trabalho de carteira assinada.

A enfermeira e assistente social Ivone atendeu pacientes ao lado da psiquiatra Nise da Silveira na Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá. “Ela era uma pessoa boa. Seus ensinamentos me orientam até hoje”, conta. Em 1977, após 37 anos, aposentou‑se. Na segunda metade dos anos 70, já havia gravado em coletâneas e conquistado prestígio como compositora. Músicas com seu maior parceiro, Delcio Carvalho (1939-2013), estouraram em discos de nomes como Beth Carvalho, Clara Nunes e Roberto Ribeiro. Sonho Meu, famosa criação da dupla, entrou no repertório de Álibi (1978), o primeiro LP de Maria Bethânia a ultrapassar a marca de 1 milhão de cópias vendidas. Em 1978, aos 56 anos, aposentada e viúva, Ivone Lara gravou seu primeiro disco-solo, Samba, Minha Verdade, Samba, Minha Raiz. O resto é história, uma bela história, muito apropriadamente comemorada junto com o centenário do samba. Na cadeira de rodas, hoje sua companhia constante, a artista esteve em Brasília em 7 de novembro para receber a Ordem do Mérito Cultural em rara cerimônia descontraída realizada neste ano no Palácio do Planalto. Na última terça, 6, foi aplaudida de pé no anúncio dos Cariocas do Ano celebrados por VEJA RIO. “Gosto de festa desde criança”, ela diz. Sobre seu pioneirismo e seu talento, desconversa. “Não penso nisso, não. Eu tive vontade, quis fazer, fui lá e fiz.” Não tem meu pé me dói: o samba é mulher e se chama Ivone Lara.     

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