Recorde de roubo a pedestres leva assaltos à porta das casas
Entre janeiro e abril, nº de ocorrências do tipo para o período foi o maior em 15 anos
José Gomes não entrou para o Bope, mas hoje faz parte de uma tropa de elite. Em abril, ao longo de cinco dias consecutivos, ele e sete colegas de profissão participaram de um curso intensivo com policiais, bombeiros e especialistas da área de segurança. A turma recebeu noções de como evitar assaltos e detectar sinais de um possível sequestro, além de obter outros conhecimentos valiosos para seu setor de atuação. Gomes é porteiro de um edifício em Laranjeiras há 26 anos. Depois das aulas, ninguém entra no prédio sem ser anunciado, e o tradicional bate-papo de funcionários e moradores no portão foi desaconselhado. “Quanto menos, melhor”, afirma seu Zé. Indicadores preocupantes justificam tanto zelo. Segundo o governo do estado, a cidade do Rio registrou 15 837 casos de roubo a pedestres entre janeiro e abril de 2018. Trata-se do maior número para o período desde 2003. Como, com frequência perturbadora, os assaltos acontecem na porta da casa da vítima, as imagens de câmeras de segurança caem nas redes e contribuem para disseminar o pânico.
Entre os dez locais com maior número de casos registrados, nove ficam na Zona Norte ou Oeste — a exceção é a Lapa, no Centro. Os relatos de ocorrências criminais, no entanto, espalham-se pelos quatro cantos da cidade. Um episódio recente foi o roubo a um edifício na Rua General Artigas, no Leblon, no qual seis moradores foram rendidos por dois homens armados na manhã do último dia 12. Cenas da ação viralizaram na internet. “O Rio de Janeiro todo hoje está sujeito a situações desse tipo”, resume Evelyn Rosenzweig, presidente da Associação de Moradores e Amigos do Leblon. Em meio a tal cenário, cada um se defende como pode. Regulamentado pela Câmara Municipal em junho do ano passado, o fechamento de vias para carros é uma das medidas adotadas. A prefeitura recebeu 128 pedidos dessa natureza entre janeiro e maio deste ano, quatro vezes mais que o que se verificou no segundo semestre de 2017. Entretanto, apenas treze solicitações foram deferidas.
Quem não aguenta esperar busca outras soluções. Após dois roubos e uma invasão de residência, os moradores da Rua dos Oitis, na Gávea, instalaram holofotes e câmeras no muro de suas casas para tentar deter os ataques. “A questão da violência hoje é tema de 90% das reuniões de nossos clientes”, afirma Anna Carolina Chazan. Ela é gerente de relacionamento da Estasa, uma administradora de condomínios. Desde novembro a empresa registra em média vinte pedidos de consultoria por mês relacionados à prevenção de crimes. Na Barra, no Recreio e em outras regiões com grande concentração de imóveis de luxo, ter vigias armados 24 horas por dia se tornou mais comum. Como o serviço é 30% mais caro do que a segurança sem armas, prédios e conjuntos com menos moradores optam por investir em câmeras, cercas elétricas e treinamento de funcionários. O mercado de proteção só faz crescer: para se ter uma ideia, uma palestra de duas horas com um especialista custa 300 reais.
Aplicativos também têm sido procurados. Um desses programas, o CondominioApp, que ganhou 10 000 novos usuários desde fevereiro, tem ferramentas que ajudam a reconhecer os moradores. “Até o fim do mês, vamos instalar o sistema em uma vila em Deodoro onde moram vários militares”, revela Néia Oliveira, gerente de implantação do CondominioApp. Se nem os homens de farda estão tranquilos, que dirá um civil. O contexto desolador intimida, mas o perigo diminui de forma significativa com a adoção de alguns cuidados. Além de chamarem a atenção de criminosos, celulares são poderosa ferramenta de distração, um perigo numa cidade que exige pedestres atentos. Mais do que nunca, é recomendável evitar locais vazios e escuros, mesmo que em frente da própria casa. Nos condomínios, o controle do acesso e a atenção ao entorno também são de grande valia. Quem não conseguir acompanhar a cartilha à risca poderá entrar em contato com seu Zé, que agora é especialista no assunto. ß