Oi tem falência decretada: o que muda na prática
Com R$ 1,7 bilhão em dívidas, operadora descumpriu compromissos previstos em seu processo de recuperação judicial, além de outras obrigações financeiras
O grupo de telecomunicações Oi teve sua falência decretada nesta segunda (10) pela 7ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ). A operadora já enfrentava dificuldades financeiras há anos e estava em sua segunda recuperação judicial. A Oi vai operar provisoriamente, até que consiga fazer a transição de seus contratos para outras operadoras. As ações da empresa despencaram mais de 40% na bolsa de valores assim que a notícia da falência foi divulgada.
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A decisão ocorreu após a gestão judicial da tele carioca, liderada pelo advogado Bruno Rezende, entrar com pedido de reconhecimento do estado de insolvência na última sexta (7). Na decisão, a juíza Simone Gastesi resumiu a situação da oeradora: “Não há surpresas quanto ao estado do Grupo Oi em recuperação judicial. A Oi é tecnicamente falida”. Em outubro, o valor devido a fornecedores fora do processo de recuperação somava R$ 1,7 bilhão — meio bilhão a mais que em junho deste ano.
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O que muda na prática?
A juíza que assinou a decisão informou no documento que, apesar da falência decretada, a companhia deve continuar a operar, de forma provisória, serviços essenciais. Entre eles, estão a conectividade em órgãos públicos e privados; os serviços de telefonia pública e de voz em localidades remotas; a operação do Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (Cindacta); a conectividade para a Caixa Econômica Federal, incluindo o suporte a 13 mil lotéricas, entre outros.
Isso serviria, segundo a decisão, para garantir a “conectividade à população nacional e inúmeros e estratégicos órgãos públicos e privados”. A ideia é que essa manutenção provisória das atividades da Oi aconteça até que a empresa consiga fazer a transição integral dos serviços que presta a outras operadoras. Isso deve evitar danos aos clientes, e manter empregos, salários e encargos. A juíza não deu um prazo para que essa transição seja concluída.
A decisão também determinou que a Oi deverá fazer uma liquidação ordenada dos seus ativos — ou seja, vender seus ativos de forma estruturada e responsável, com o objetivo de maximizar o valor pago aos credores, manter empregos e garantir a continuidade dos serviços até que a transição seja concluída.
Histórico de problemas financeiros
Quase 30 anos separam a criação do que viria se tornar a Oi, após a privatização da Telebras, e a decretação da falência daquela que já foi tratada como a “supertele brasileira” e que cresceu sob incentivos governamentais. Símbolo da privatização do setor de telecomunicações nos anos 1990, a Oi não resistiu à crise gerada pelo acúmulo de dívidas, a má gestão e uma série de esqueletos financeiros deixados pelo caminho.
A empresa entrou com o primeiro pedido de recuperação judicial em 2016, pressionada por mais de R$ 60 bilhões em dívidas. No primeiro processo, encerrado seis anos após o pedido de proteção contra credores, a empresa vendeu suas principais operações a outras operadoras — incluindo Telefônica Brasil, Claro, Tim e V.Tal. O processo, no entanto, não foi suficiente para garantir a continuidade da operação e a Oi precisou entrar com um novo pedido de recuperação judicial em 2023.
Com dívidas crescentes e em sua segunda recuperação judicial, a empresa viu a crise se agravar na última década, após fundir suas operações com a Brasil Telecom (BrT) e a Portugal Telecom.
Ascensão e queda da Oi: da ‘supertele nacional’ à falência
A história da Oi começou em julho de 1998, no fim do governo de Fernando Henrique Cardoso, quando a estatal Telebrás foi leiloada na Bolsa de Valores do Rio. O consórcio Telemar arrematou a Tele Norte Leste, responsável pela telefonia fixa em parte do Sudeste, Norte e Nordeste, e operou com esse nome até 2007, quando passou a se chamar Oi. A privatização foi marcada por polêmica: o então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, foi flagrado em um grampo chamando os acionistas da Telemar de “telegangue”, o que resultou em sua saída do cargo.
Com apoio do BNDES e de fundos de pensão de estatais, a Oi se uniu à Brasil Telecom em 2008, no contexto da política dos “campeões nacionais” do governo Lula. A fusão revelou passivos superiores a R$ 6 bilhões e marcou o início da chamada “supertele nacional”. Em 2013, a empresa anunciou uma nova união, agora com a Portugal Telecom, consolidada em 2014. O negócio, porém, revelou um rombo de mais de € 1 bilhão e agravou a crise financeira da operadora.
Sobrecarregada por dívidas, a Oi entrou em recuperação judicial em 2016, renegociando R$ 65 bilhões com 55 mil credores — processo concluído em 2022. Três meses depois, voltou a pedir proteção judicial, desta vez por R$ 43,7 bilhões. Em meio à reestruturação, vendeu seus principais ativos: a participação na angolana Unitel, por US$ 1 bilhão; a operação móvel, comprada por Claro, TIM e Vivo; os serviços de TV e satélite; e a rede de fibra óptica, transferida à V.tal.
Mesmo com as vendas, a situação financeira se deteriorou. Em outubro, a dívida com fornecedores fora do plano judicial chegou a R$ 1,7 bilhão, e a receita mensal caiu para R$ 200 milhões. Na sexta-feira (7), a Justiça do Rio decretou a falência da companhia, afastou a diretoria e nomeou um administrador judicial. A juíza Simone Gastesi classificou a Oi como “tecnicamente falida” e determinou a manutenção provisória dos serviços essenciais, incluindo a conexão de 7.500 localidades e números de emergência.
O Ministério das Comunicações informou que avalia a decisão e garantiu a continuidade dos serviços, mesmo que assumidos por outra empresa. A Oi ainda mantém cerca de 4.600 contratos com órgãos públicos e 10 mil com empresas privadas. Apesar do colapso financeiro, continua responsável por parte da infraestrutura de telecomunicações do país — um legado agora em transição.
Qual é a diferença entre recuperação judicial e falência?
A recuperação judicial é uma medida voltada para preservar a operação da empresa e evitar a falência. Ou seja, quando a Justiça aprova um pedido de recuperação judicial, ela permite que a companhia faça uma reestruturação de suas dívidas e reorganize suas finanças e administração.
A ideia é dar condições para que a empresa consiga apresentar um plano de recuperação aos credores, trazendo propostas de pagamento e dando um prazo para o cumprimento de suas obrigações. Além disso, o processo também permite que a empresa continue a operar, desde que com a fiscalização da Justiça.
Já a falência acontece quando a empresa não consegue mais pagar as suas dívidas e não tem mais condições de se recuperar. Nesse caso, a Justiça transforma o processo de recuperação judicial em falência e determina que a empresa venda seus ativos para conseguir quitar seus compromissos.
Como ficam credores e funcionários?
Segundo a advogada Ana Paula Tomasi, os credores, bancos, fornecedores, investidores e trabalhadores da empresa passam a ser pagos dentro do processo de falência. “Isso significa que nenhum credor pode mais cobrar a Oi individualmente: todas as dívidas serão tratadas no juízo da falência”, acrescenta a advogada.
Nesse caso, a expectativa é que a empresa apresente uma lista de credores, que deverá ser publicada em um edital pelo administrador judicial. Quando o edital for divulgado, os credores terão 15 dias para se manifestar — seja habilitando o seu crédito, ou contestando os valores que considerarem incorretos. “Na prática, os credores só começarão a receber após a venda dos ativos, o que deve levar alguns meses para ser estruturado. A lógica é preservar o valor da operação e manter a empresa viva o suficiente para que o que for vendido valha mais e permita um retorno maior aos credores”, detalha.
Já quem trabalha na Oi deverá continuar empregado enquanto a empresa estiver em operação. “Não há extinção imediata dos vínculos de trabalho. A massa falida assume a responsabilidade pelo pagamento de salários e encargos a partir da decretação da falência”, completa Tomasi.
Investi na Oi, e agora?
Para os acionistas da companhia — ou seja, os investidores que colocaram parte dos seus recursos nas ações da Oi —, a expectativa é que o pagamento aconteça apenas depois que a empresa tiver quitado os compromissos que tem com outros credores. “Como um último elo da cadeia, o acionista não é um credor, é o investidor residual. E, de acordo com a ordem de preferência estabelecida pelo artigo 83 da Lei de Falências, somente após o pagamento dos demais credores é que poderia haver o pagamento aos acionistas, se existir algum saldo”, explica o advogado especialista em recuperação judicial do escritório Volk & Giffoni Ferreira Sociedade de Advogado, Vinícius Mendes e Silva.
O advogado afirma que, na prática, o investimento acionário na Oi se transformou em prejuízo consolidado. Isso porque, como a Oi não tem ativos suficientes para honrar seus compromissos, qualquer expectativa de ressarcimento se torna “inviável”. “Mesmo diante do cenário desolador, os acionistas ainda possuem direitos formais, Os caminhos jurídicos são limitados e devem ser analisados com cautela”, diz Silva.
Ainda segundo o advogado, os acionistas devem acompanhar os relatórios do administrador judicial, participar das assembleias, fiscalizar a condução da liquidação e até mesmo buscar a responsabilização de administradores e controladores se for comprovado algum ato de má gestão, fraudes ou negligência. “Trata-se de um caminho difícil, demorado e custoso, mas é a principal via para quem busca alguma forma de reparação”, afirma. “Mas, para a maioria dos investidores, a alternativa mais racional é declarar a perda total das ações no Imposto de Renda, compensando o prejuízo com futuros ganhos de capital. É a forma mais direta (e quase sempre a única) de reduzir os danos econômicos”, completa.
Presente em milhares de localidades, a Oi é, em muitos casos, a única operadora de telefonia em funcionamento em vários pontos do país, com obrigações firmadas com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para garantir a continuidade do serviço de voz.
Em nota, a Anatel disse a continuidade dos serviços está assegurada. Segundo o órgão regulador, a decisão estabelece a possibilidade de venda da operação da Oi a outros interessados. “A Anatel atuará para garantir a continuidade e a qualidade dos serviços”.
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