Monumentos públicos desaparecem das ruas após obras no Centro
As intervenções, como a construção das linhas de VLT, provocaram um efeito colateral na paisagem: o sumiço de obras de arte públicas
Um menino, com roupas velhas e jornais debaixo do braço, grita as últimas manchetes na tentativa de vender os exemplares. A cena comum no Rio do início do século XX foi eternizada na escultura Pequeno Jornaleiro, inaugurada em 1933 no encontro das ruas do Ouvidor e Miguel Couto com a Avenida Rio Branco. Transferida para a Rua Sete de Setembro na década de 90, ela ficou lá até janeiro de 2016, quando foi removida para dar lugar a um dos inúmeros canteiros de obras pré-olímpicas. O mesmo aconteceu com o busto de bronze do engenheiro italiano Antonio Jannuzzi (1855-1949), dono da maior construtora da época, responsável por levantar catorze prédios e projetar mais onze no Centro. Hoje, o local é ocupado por uma das estações de passageiros do veículo leve sobre trilhos (VLT), e não há mais nenhum vestígio dessas estátuas.
Os monumentos removidos dali não estão muito longe, na verdade. Eles foram levados para um depósito da prefeitura, em frente ao Sambódromo, com outras obras que também tiveram de ser desalojadas para abrir espaço às intervenções para a Rio 2016. “Essas esculturas representam um momento da história da cidade. Não são colocadas em determinados lugares porque alguém tirou da cabeça e botou ali. Normalmente são pessoas homenageadas pela sua importância e que agora se encontram esquecidas”, destaca o arquiteto e historiador Nireu Cavalcanti.
De acordo com o inventário Monumentos do Rio de Janeiro, publicado pela prefeitura em 2015, existem 1 200 obras públicas na cidade. Mas o guia turístico Alex Belchior, que há oito anos vem catalogando fontes, chafarizes, estátuas, bustos e esculturas, fotografando o que havia antes e depois das intervenções, diz que pelo menos mais sete desapareceram da paisagem do Centro recentemente. É o caso da grande escultura de concreto idealizada por Ivens Machado, que ficava na Rua Uruguaiana até começarem as obras do Porto Maravilha, em 2013, e dos pilares de concreto e pedra portuguesa erguidos por Waltércio Caldas em 1997 em frente ao MAM. Eles foram derrubados em maio de 2015, após protestos, com a promessa de que seriam reconstruídos logo depois, a 4,5 metros do local de origem, próximo às avenidas Presidente Antônio Carlos e Beira-Mar. “O poder público sempre vai dizer que está fazendo a sua parte, mas não há um cuidado, uma preocupação com a conservação. É muito triste ver como o nosso patrimônio é tratado sem o menor respeito”, diz Belchior. De fato, já se passaram dois anos e nada foi feito.
De acordo com a Secretaria de Projetos Estratégicos, estão em andamento “estudos técnicos e de viabilidade sobre o local de restauração do monumento” de Caldas sob a supervisão do próprio artista. Com relação às obras retiradas da Rua Sete de Setembro, a proposta é que elas retornem para a via, em um lugar que não atrapalhe a circulação de pedestres. Os planos estão no papel, mas sem previsão de data para virar realidade.