A conta não fecha
Em decorrência do aumento no preço dos aluguéis e das matérias-primas, dois em cada três restaurantes que são abertos no Rio fecham as portas no fim de um ano
Às vésperas de completar vinte anos de vida, o bar Caroline Café, no Jardim Botânico, encerrou suas atividades. Isso foi no início do ano. Pouco antes, o Carlota, filial no Leblon do respeitado bistrô paulistano comandado pela chef Carla Pernambuco, também desistiu da operação carioca. Acrescentem-se à lista o Alameda, em Botafogo, o Fornazzo, na Barra, e o Traiteurs de France, em Copacabana. Não se trata de exemplos isolados. Por mais que alguns estabelecimentos se mantenham com filas de espera e salões abarrotados, e apesar dos cardápios caríssimos, o setor está passando por um momento delicado: a cada três casas que são abertas, duas fecham as portas no primeiro ano de funcionamento, segundo dados da Associação Nacional de Restaurantes (ANR).
A questão é simples. Embora consigam faturar alto, os restaurantes cariocas estão gastando mais do que ganham. Não porque querem, diga-se desde logo. O vilão mais recente é a alta do preço das matérias-primas, que representam a maior parte das despesas, cerca de 30%. “Enquanto a inflação geral no país ficou em 25% nos últimos quatro anos, os alimentos e as bebidas subiram mais de 40%”, analisa Cristiano Melles, presidente da ANR e um dos sócios da rede de churrascarias Pobre Juan, com duas filiais no Rio. O descompasso fica ainda mais acentuado em razão dos altos impostos, que consomem 10% do orçamento, e da disparada dos aluguéis no Rio, que praticamente dobraram nesse período. Resultado: manter um estabelecimento lucrativo exige competência, boa gestão, muito trabalho e uma certa dose de sorte.
A solução encontrada pelos vencedores, aqueles que sobrevivem bem ao tsunami, é diminuir a própria margem de lucro. “Não dá para repassar tudo ao cliente, pois do contrário ele para de vir. Já cortei três funcionários da minha folha de pagamento e agora só me resta descontar do faturamento”, afirma o restaurateur Antonio Perico, da rede Da Silva. Filho do fundador do Antiquarius, ele lembra o tempo em que o endereço de alta classe no Leblon tirava 40% de rendimento líquido no fim do mês. Hoje esse porcentual não passa de 12%. Ou seja, num prato em que o cliente paga 157 reais, como a moqueca de bacalhau fresco, a casa não embolsa nem 20. E a média do mercado, de acordo com a Abrasel, outra associação do setor, é ainda pior. Hoje o lucro gira em torno de 7%. “Estamos ficando encurralados. Quem não lota todo dia está correndo risco sério de fechar as portas”, entende o empresário Roberto Maciel, que comanda o Chez L?Ami Martin e a rede Emporium Pax.
A tendência é que o mercado passe por uma seleção natural e somente aqueles que conseguirem reorganizar os custos terão chances reais de sobreviver por mais tempo. Alertas ao problema, os restaurateurs cariocas vão seguir duas linhas. A primeira é tentar reduzir o número de funcionários, apostando na automatização da cozinha e em treinamento. A outra é compartilhar custos. “Já há empresas que se organizam para unificar as compras e, com isso, baratear o preço dos insumos”, aponta Fernando Kaplan, que abriu uma filial do bar de tapas Venga! em São Paulo junto com a Cia. Tradicional de Comércio, dona da Bráz, do Astor e da Lanchonete da Cidade. De fato, nos Estados Unidos, onde o setor passou por dificuldades semelhantes, existem ao menos trinta conglomerados que dividem as despesas do chamado back office. Enquanto muitos empresários do ramo ainda estudam soluções viáveis para salvar seus negócios, Kaplan já pôs em operação algumas práticas para não entrar no vermelho. “Diminuímos o desperdício de matéria-prima de 10% para 6% e passamos a fazer compras mensais em vez de semanais, o que possibilitou a renegociação dos preços com os fornecedores”, conta. Neste momento, investir em gestão é fundamental para que a receita não desande.