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A rotina do ex-bilionário Eike Batista e sua família em meio à crise

O empresário Eike Batista construiu do nada um império bilionário. Agora, com os negócios em frangalhos, ele e sua família se veem atolados em uma rotina de vexames, processos e investigações policiais

Por Malu Gaspar, Sofia Cerqueira e Daniela Pessoa
Atualizado em 2 jun 2017, 12h43 - Publicado em 7 mar 2015, 01h00

O ex-magnata Eike Batista tem vivido fortes emoções, em que o mais puro baixo-astral se mistura com momentos de grande euforia. Há duas semanas, aquele que já foi o homem mais rico do Brasil ficou exultante com a súbita propagação das imagens do juiz Flávio Roberto de Souza, titular da 3ª Vara Criminal da Justiça Federal no Rio, dirigindo seu Porsche Cayenne branco, apreen­dido no início do mês. O posterior afastamento do magistrado do processo em que Eike é acusado de crimes contra o sistema financeiro o deixou ainda mais animado. Ele passou a disparar telefonemas para os amigos (os poucos que sobraram), coisa que não fazia havia meses. Um ex-assessor foi alcançado em uma viagem ao exterior. “Você viu as fotos do juiz?”, digitou o empresário em uma mensagem enviada pelo celular. Apenas para seu advogado, Sérgio Bermudes, chegou a ligar mais de vinte vezes em um único dia. Numa das chamadas, perguntou: “Com a mudança, o processo contra mim acabou?”. A resposta do advogado foi seca: “Claro que não!”. Confirmada na última terça por três desembargadores do Tribunal Regional Federal (TRF) do Rio, a saída de Souza anulou atos como audiências e depoimentos. Entretanto, até o fechamento desta edição, o bloqueio dos bens continuava em vigor. E a tormenta vivida pelo ex-bilionário parece longe de terminar.

O frenesi de Eike Batista tem sido descrito por pessoas próximas a ele como uma espécie de catarse. Desde que o Império X começou a se esfacelar, em 2012, nunca o empresário e sua família haviam tido tamanha exposição pública. No dia 6 de fevereiro, o homem que já foi o sétimo mais rico do mundo bateu no que parecia ser o fundo do poço. Às 6h28 da manhã, sete policiais federais foram à sua casa para confiscar bens que garantissem o pagamento de dívidas estimadas em 3 bilhões de reais. O filho mais novo de Eike, Balder, de 1 ano e 8 meses, brincava na sala com a mãe, Flávia Sampaio, no momento em que os agentes levavam embora o Lamborghini Aventador, de 1,6 milhão de reais, o piano branco Yamaha e um falso ovo Fabergé que enfeitavam o ambiente. Atônito e sem saber o que fazer, Eike passou boa parte do tempo sentado em um sofá com o olhar perdido, enquanto os aposentos da mansão no bairro do Jardim Botânico eram vasculhados. Com toda a sua frota de seis veículos apreendida, o empresário adotou o táxi nos deslocamentos entre a mansão e o escritório. “O Eike está muito baqueado com tudo o que vem acontecendo, mas segue convicto de que vai reverter a situação”, diz o advogado Bermudes.

+ A crise financeira nas empresas de Eike Batista põe em risco uma série de projetos que ele banca na cidade

Caso único na história empresarial do país, Eike protagonizou uma vertiginosa ascensão, impulsionada pela abertura de capital de suas empresas na Bovespa, em 2010. O empresário, cuja fortuna chegou a 30 bilhões de dólares dois anos depois, teve a credibilidade destroçada por não cumprir os resultados prometidos para a petrolífera OGX. Desde então, experimentou uma queda igualmente alucinante. Suas empresas, interligadas, hiperinfladas e com sérios problemas estruturais, ruíram junto com a estrela mais reluzente de seu grupo. Empreendedor audaz, na opinião dos admiradores, ou megalômano, para os críticos, o certo é que Eike, 58 anos, sempre foi um exímio vendedor de sonhos. Acusado de manipular o mercado e usar informações privilegiadas, ele pode ser o primeiro empresário brasileiro a ir para a prisão por crime financeiro. A Polícia Federal ainda o investiga por lavagem de dinheiro. Já se sabe que, um mês antes de a OGX assumir para o mercado que o seu principal campo de petróleo não seria rentável, Eike repassou 137 milhões de reais ao filho Thor, 23 anos, 25 milhões a Flávia e outros 7 milhões ao filho do meio, Olin, 19. No ano anterior, já havia repassado 15 milhões à ex-mulher, Luma de Oliveira. Para os investigadores, as remessas, classificadas como doações e registradas em seu imposto de renda, podem configurar ocultação de patrimônio, já que ele sabia que estava prestes a quebrar. Portanto, como empresário, Eike está longe de ser apenas uma vítima circunstancial ou, em linguagem mais coloquial, um empreendedor azarado. “Houve arbitrariedades cometidas pelo magistrado. Mas isso não transforma o réu em mártir ou herói, nem o condena por antecipação”, afirmou o desembargador do TRF Messod Azulay, que participou da votação pelo afastamento do juiz Flávio de Souza na terça passada. Desde a derrocada do Império X, é fato que a rotina de Eike mudou muito. Antes acompanhado por um séquito de dezoito seguranças, ele tinha a seu serviço apenas três funcionários no momento da ação da PF em sua casa. Para conter os gastos, Flávia Sampaio, que outrora ocupava uma cobertura na Rua Barão da Torre, em Ipanema, está morando com o empresário no Jardim Botânico. Na semana retrasada, ela teve o cartão de crédito recusado ao fazer compras em um supermercado da Zona Sul. Advogada, dedica-se atualmente a um site de venda de roupas na internet. No entanto, a atividade não a impede de opinar de forma incisiva na estratégia de defesa do namorado. “Ela agora participa de tudo”, diz uma fonte próxima ao casal. Ambos têm evitado sair. Tanto ela quanto Eike passam boa parte do dia na antiga sede do Grupo X, no Flamengo. Ali, ele almoça pratos frugais, acompanhados de Coca-Cola. A exceção fica por conta de idas esporádicas ao restaurante Mr. Lam. Acomodado no 1º andar, pede satay de frango — espetinhos com molho de amendoim. Chega a devorar trinta por noite. “Às vezes alguém pede um autógrafo ou para tirar fotos”, confidencia o gerente da casa, Eder Heck. “Aí o astral dele melhora muito.”

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Até a operação na mansão de Eike, seguida da apreensão dos carros de Luma, os herdeiros do empresário mantiveram o mesmo estilo perdulário do passado. Nos primeiros dias do ano, Thor e Olin aproveitaram para se esbaldar no iate do pai, Spirit of Brazil VIII, em Angra (atualmente confiscado). Depois, curtiram férias, cada qual com sua namorada, em St. Barths, ilha caribenha frequentada por milionários. A diária de um dos hotéis em que a patota se hospedou, o Eden Rock, chega a 6 000 reais. Pelo jantar, desembolsavam em média 1 500 reais. O primogênito esticou o oba-oba em Paris ao lado da namorada, a gaúcha Lunara Campos. Hospedaram-se na prestigiada (e cara) Avenue Montaigne. A batida policial na casa de Luma, no entanto, abalou a farra hedonista. Com três automóveis apreendidos, ela passou a usar um carro emprestado por amigos. Thor chegou a travar uma discussão com o pai, inconformado com o fato de ter deixado que os problemas atingissem a mãe. O jovem revelou a amigos que, no auge da crise do grupo, passou a sofrer muito com a perspectiva de ruína familiar, a ter dores de cabeça, rinite e faringite crônicas e a tomar antidepressivos e ansiolíticos. No entanto, nada que impedisse viagens internacionais. Há duas semanas, no olho do furacão, Thor esteve em Londres. Nas fotos que postou no Instagram, ele mostra dois jovens executivos em uma sala de reunião com laptop aberto e a seguinte legenda: “Quarto dia em Londres, muito trabalho, kkkkkkk”. Mais alheio aos problemas familiares, Olin ironizou as medidas judiciais entre seus amigos, dizendo que elas não dariam em nada. No mesmo dia em que os bens do clã eram bloqueados, surpreendeu a ex-namorada, Ellen Teodoro, ao mandar-lhe uma mensagem pedindo uma receita de macarrão. Escreveu o rapaz em troca de mensagens com VEJA RIO: “Momento chato, né? Mas graças a Deus nesses últimos dias a maré está a nosso favor”. Olin foi o único membro da família que, procurado pela reportagem, se manifestou sobre o assunto.

Mesmo com as dificuldades impostas pelas medidas judiciais, o empresário está longe de fazer parte da classe média, como chegou a declarar em entrevistas no ano passado. De acordo com seu advogado, até ter o patrimônio bloqueado, Eike estava vivendo com 80 000 reais mensais, fruto de sua participação nas empresas. Para efeito de comparação, na época das vacas gordas, Thor gastava até 100 000 reais por mês em baladas, viagens e restaurantes. Mesmo com um padrão de vida, digamos, mais espartano, o e­­x-bilionário tem acesso a recursos que podem manter a família a anos-luz de distância das classes menos abonadas — e isso sem considerar supostas contas no exterior, que estão sendo investigadas pela Justiça. No ano passado, ele fechou um acordo com o seu principal credor, o fundo Mubadala, de Abu Dhabi, que lhe garante uma renda anual de 5 milhões de dólares até 2018. A remuneração, afirmam pessoas de seu círculo, não começou a ser paga. 

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Durante a fase áurea como empresário visionário, Eike Batista usou exaustivamente a internet, em especial o Twitter, para promover seus negócios e sua imagem de empreendedor moderno e antenado. Nos últimos tempos, sua conta tem estado inativa. No entanto, ele desponta nas redes sociais de outra forma: é alvo de chacota e memes. Piadinhas como “Esqueceram de apreender o Thor”, “O Mr. Lam serve agora pato bloqueado (em vez de laqueado)” e “Juiz é flagrado usando roupas íntimas de Luma” viraram sucesso nos últimos dias. Enquanto muitos fazem graça do tombo histórico, é incontestável que, ao confiarem em Eike, outros milhares amargaram prejuízos, entre eles fiéis escudeiros. Conhecido como mão-aberta, era comum o criador do grupo X conceder polpudos bônus em ações como forma de atrair talentos. Quem vendeu seus lotes na boa maré do grupo se deu bem. Aqueles que decidiram manter as apostas até o fim acabaram sem nada. “Muita gente ficou rica, mas alguns funcionários que acreditaram nas empresas X até o fim perderam tudo junto com ele”, diz um e­­x-assessor que viu evaporar o equivalente a 3 milhões de reais em ações da OGX.O turbilhão de acontecimentos que assola a reputação de Eike não destruiu suas esperanças de se reerguer. Desde o início da crise, ele viajou cinco vezes ao exterior, sobretudo para os Estados Unidos e a Coreia do Sul, com esse propósito. Atualmente tenta fazer decolar projetos no setor agrícola (em cultura de cana-de-açúcar) e farmacêutico (um medicamento para impotência). Poucos veem chance de isso dar certo, mas há quem admire seu empenho. “Não é qualquer coisa que destrói uma pessoa como ele. É muito autoconfiante”, diz um dos amigos mais próximos, Alessandro Corona, dono da clínica Tricosalus, onde ele fez seu implante de cabelo. Eike sabe que jamais terá a possibilidade de figurar novamente no topo das listas de bilionários, mas acredita que poderá voltar ao jogo dos negócios. Isso só o tempo e a Justiça dirão.

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