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Dia Nacional do Samba celebra passado, presente e futuro da música

Sem perder as raízes, o gênero se reinventa em rodas e grandes eventos que atraem um público diverso, agradando aos mais exigentes ouvidos

Por Lucas Vieira
Atualizado em 28 nov 2025, 10h56 - Publicado em 28 nov 2025, 06h08
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Em alta: Mapa do Samba revela a realização 150 rodas na cidade do Rio de Janeiro (divulgação/Divulgação)
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No começo da década de 1920, o trem que às 18h04 partia religiosamente da Central do Brasil rumo ao subúrbio se transformava em abrigo seguro para Paulo da Portela (1901-1949) e outros músicos ensaiarem seus sambas, fugindo das duras da polícia e do preconceito que o gênero sofria.

Para homenagear esse capítulo tão rico da história da música brasileira, o Trem do Samba surgiu em 1995, reunindo cantores, compositores e batuqueiros em uma animada viagem em vagões até Oswaldo Cruz, na Zona Norte carioca.

“O seu Paulo foi o cara da oratória, sabia lidar com ideias diferentes e previa que o estilo conquistaria o mundo”, diz Marquinhos de Oswaldo Cruz, organizador da festa. “Juntamos artistas antigos e contemporâneos e conseguimos unir a cidade nessa peregrinação musical. É um dia em que as diversas facetas do Rio se encontram”, arremata.

No próximo sábado (6), serão celebradas três décadas da iniciativa, e nomes como Roberta Sá, Dudu Nobre e as Velhas guardas das grandes escolas já confirmaram presença.

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Três décadas de trem do Samba: “uma vez por ano, todas as facetas do Rio se encontram”, exalta Marquinhos de Oswaldo Cruz (Thaty Aguiar/Divulgação)

A julgar pelo número recorde de rodas de samba espalhadas pela cidade, de segunda a segunda, o ritmo vive um momento especial em solo carioca. Publicado em 2024, o Mapa das Rodas de Samba contabiliza 150 batucadas em locais públicos, um extraordinário crescimento de 58% em apenas três anos.

O programa se tornou uma das principais atrações culturais não só para quem vive nestas praias, mas também uma pedida imperdível para turistas que querem mergulhar fundo na alma da cidade. “É curioso observar que esses encontros estão sempre cheios de gente. Quando comecei a me interessar pelo assunto, trinta anos atrás, era preciso caçar lugares. Hoje, basta sair de casa para tropeçar numa roda”, constata Felipe Trotta, professor e pesquisador de estudos culturais e mídia da UFF.

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“As pessoas buscam socializar e ouvir música de um jeito informal. Elas vão vestidas como querem e sabem que ali o racismo não opera da mesma forma que em outros cantos”, afirma, chamando a atenção para o fato de que o samba vem, há um século, traduzindo o Rio e os sentimentos de quem por aqui vive.

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Em alta: Mapa do Samba revela a realização 150 rodas na cidade do Rio de Janeiro (divulgação/Divulgação)

Assim como outras manifestações artísticas, o gênero tem se modernizado com a passagem do tempo. Nas letras, temas comuns, entre os quais a crítica social, o romance, além de exaltações a personagens, entidades e agremiações, ganharam roupagem e linguagem contemporâneas.

O mesmo vale para a instrumentação, com direito à junção com batidas eletrônicas do trap e do funk. “Todo mundo me falou, eu não segui conselho, pra que fui dar moral pra homem feio?”, canta Marvvila, 26 anos, natural de Bento Ribeiro, na canção Nike e Shortinho.

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Como ela, Hugo Ojuara, 28, Nego Álvaro, 37, e Mosquito, 38, todos com milhões de reproduções nas plataformas de streaming, são talentos desta era. “Existe um tensionamento entre olhar para as origens e para o futuro. Há atualmente uma relação fluida com outros estilos, e a internet faz com que os sambistas se conectem com novos públicos e o idioma das ruas”, observa a cantora e compositora Marina Iris, 41.

Pequenos prodígios também se destacam nas rodas e nas redes, como Molekebadi & Molekecris, 8 anos, e Lunna Beatriz, 11. “Crianças se apaixonam ao ter contato com os instrumentos. Vejo muitas meninas estudando e começando a entender a potência da mulher nesses espaços”, conta Jéssica Zarpey, percussionista da banda de Letrux e professora da Associação do Movimento Compositores da Baixada Fluminense, que oferece aulas gratuitas.

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Nova geração: Mosquito, Marvvila, Nego Álvaro e Hugo Ojuara trazem temas contemporâneos às suas letras (Fernando Young/Divulgação)

 

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(João Cotta TV Globo/Divulgação)
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(instagram @negoalvaro/Divulgação)
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(patricia burlamaqui/Divulgação)

Até mesmo o circuito de bares está afinado com o bom momento que o samba atravessa. Desde 2018, Zeca Pagodinho batiza uma franquia que conquistou São Paulo. Belo, Mumuzinho e Alcione também já emprestaram seus nomes a empreendimentos boêmios.

O Baródromo, no Maracanã, o Sambódromo, na Cidade Nova, e o Malandro Botequim, em Botafogo, mesclam acepipes e bebida gelada com o melhor da trilha sonora nos alto-falantes.

“O Grammy Latino que Xande de Pilares ganhou no ano passado com o disco em que reinterpreta Caetano Veloso fez a mídia tradicional prestar mais atenção ao samba”, ressalta Dudu Pagodinho, filho de Zeca e diretor artístico da Rádio Samba. “O Google Trends mostra que, em 2025, o interesse pelo ritmo superou o sertanejo. E isso não se restringe à época do Carnaval”, sublinha.

Outro campeão de audiência é o formato de show que se origina da roda, mas vai além, durando um dia inteiro. Tardezinha, de Thiaguinho, e Pagode do Pericão, de Péricles, são alguns exemplos.

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“Posso cantar não só o meu repertório, como tudo que me influenciou”, explica Tiee, que na festa Subúrbio, com próxima edição marcada para sábado (6), na Ilha Itanhangá, oferece até massagem, barbeiro e maquiagem aos frequentadores, sem custo adicional.

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Campeões de audiência: Tardezinha, de Thiaguinho, e Subúrbio, de Tiee, são shows longos, cheios de ativação de marca (instagram @bsfotografias/Divulgação)

A menos de três meses da folia, os preparativos para o espetáculo na Marquês de Sapucaí já ocupam o calendário cultural. A Cidade do Samba recebe, até domingo (30), um esquenta das agremiações do Grupo Especial com exibições de Mumuzinho, Zeca Pagodinho e Martinho da Vila. O ingresso é 1 quilo de alimento não perecível.

Em fevereiro, alguns enredos vão contar a história de figuras da MPB, como Ney Matogrosso, Rita Lee (1947-2023) e Chico Science (1966-1997). Outra marca destes tempos é a presença de talentos de fora na composição dos sambas-enredo.

Em 2025, a Unidos da Tijuca contou com Anitta e Feyjão entre os autores e, agora, tem o humorista Marcelo Adnet no time de criadores das estrofes em homenagem à escritora Carolina Maria de Jesus (1914-1977).

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“A ala de compositores é aberta, então, quando há participação de artistas de projeção, conseguimos atingir pessoas que não nos acompanham normalmente. Não é prioridade incluir esses nomes, mas a contribuição é sempre bem-vinda”, diz Elisa Fernandes, diretora de Carnaval da escola do Borel.

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Carnaval 2026: agremiações mostram prévia do desfile do ano que vem em evento na Cidade Do Samba no próximo fim de semana. (Marco Terranova/RioTur/Divulgação)

Dos primeiros encontros no quintal de Tia Ciata (1854-1924) até virar tema de 150 rodas pela cidade, o samba enfrentou o preconceito para brilhar não só por aqui. Também no exterior ele floresceu e encantou até quem não tem lá muito gingado no pé.

“Sua consolidação, ao longo da Era Vargas, se deu junto à ideologia que valorizava a mestiçagem. Tornou-se, portanto, a trilha perfeita para a identidade nacional e para a imagem do Brasil, propagando uma falsa ideia da plena harmonia entre as raças, negociando a negritude como mais uma cor da paisagem brasileira”, explica Gabriel Dias, jornalista cujo mestrado na UFF se debruça sobre territorialidades no samba.

Enquanto segue abraçando a modernidade sem se esquecer da tradição, o gênero vai se reinventando e pulsando nos corações de bambas. E, a cada dia, conquista mais apreciadores.

“O samba é atemporal e infinito, vide os clássicos quase centenários. Tenho bons olhos para quem está começando, é só respeitar os que chegaram primeiro e trilhar seu próprio caminho”, opina Xande de Pilares.

“É preciso abrir espaço para a nova geração. Samba é continuidade”, defende Neguinho da Beija-Flor.

Já Tia Surica é mais direta: “É preciso vestir a camisa com amor e a juventude tem que seguir em frente, porque o samba não pode morrer”.

O danado do samba, como tão bem cantou Dorival Caymmi (1914-2008), segue vivíssimo.

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O show tem que continuar: Neguinho da Beija-Flor, Tia Surica e Xande de Pilares dão a bênção a quem inicia a trilha (Carolina Oliveira/Divulgação)

 

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(Leandro Joras/Divulgação)
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(Leo Aversa/Divulgação)

Dicionário Do batuqueiro
Traduzindo o gênero cuja emoção é intraduzível

Samba-enredo. Conta a história que a agremiação apresenta no desfile, apresentando a temática aos componentes. É um dos principais quesitos avaliados pelos jurados.

Samba-canção. Surgido na década de 1920, tem andamento lento, melodias sentimentais e letras sobre amor, dor de cotovelo, desilusão e saudade. Os grandes nomes são Nelson Cavaquinho (1911-1986), Noel Rosa (1910-1937), Elizeth Cardoso (1920-1990) e Cartola (1908-1980).

Samba de breque. O termo deriva do inglês break e vem da pausa feita pelos músicos no meio desse tipo de música. Também da década de 1920, tornou-se popular por letras descontraídas e engraçadas. Dicró (1946-2012), Moreira da Silva (1902-2000) e Bezerra da Silva (1927-2005) ajudaram a propagar o estilo.

Partido-alto. Caracterizado pelo improviso, brota do desafio em que “partideiros” criam versos a partir de um mote, seguindo melodia e ritmo. Jovelina Pérola Negra (1944-1998), Almir Guineto (1946-2017), Zeca Pagodinho e Dudu Nobre são algumas das referências.

Samba de roda. Oriundo do Recôncavo Baiano, é caracterizado pelo uso de prato e faca como principal instrumento, mas também pode incluir viola, atabaque e outras percussões.

Pagode. Espécie de irmão mais novo, designa a reunião em que instrumentistas, cantores e partideiros se reúnem para tocar. A partir dos anos 1990, o termo passou a ser usado para artistas de vertente mais romântica.

Mete o pé e vai na fé

Sete rodas de samba imperdíveis na cidade

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(Tyno Cruz/Divulgação)

Samba do Trabalhador. Um dos eventos mais tradicionais do Rio de Janeiro, há vinte anos é realizado no Andaraí, sob a batuta do músico e compositor Moacyr Luz. Clube Renascença. Rua Barão de São Francisco, 54, Andaraí. Seg., 16h30. R$ 30,00. Ingressos pelo eventim.com.br.

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Casa Savana. Em funcionamento ao longo de toda a semana, o espaço cultural oferece rodas de samba todos os dias e, aos fins de semana, tem almoço com comida tradicional africana. Rua Camerino, 162, Centro. Seg. a dom. Horários e preços variados. Ingressos pelo sympla.com.br.

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(Tomás Rangel/Divulgação)

Beco do Rato. A casa recebe atrações diariamente, incluindo rodas tradicionais e shows de artistas contemporâneos, como Arlindinho, Vinny Santa Fé, Délcio Luiz e Encontros Casuais (projeto de Inácio Rios e Mosquito). Rua Joaquim Silva, 11, Lapa. Seg. a dom. Horários e preços variados. Ingressos pelo sympla.com.br.

Samba do Senado. Realizado no Armazém Senado, bar localizado na recém-eleita “rua mais cool do mundo”, o fervo oferece cerveja gelada, petiscos variados e muita música boa. Rua do Senado, 58, Centro. Sex., 17h. Sáb., 14h. Dom., 13h. Grátis.

Terreiro de Mangueira. Com foco no resgate da cultura popular e preservação da memória do samba, o projeto celebra sua memória e resistência cultural com edições mensais que ocorrem num varandão tradicional do bairro. Rua Visconde de Niterói, 512, Mangueira. Terceiro sábado do mês, 15h. R$ 15,00. Ingressos na bilheteria.

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(instagram @sambadopasseio/Divulgação)

Samba do Passeio. Nos arredores da Feira da Glória, o programa dominical reúne famílias, casais, amigos e turistas. Há diversas opções gastronômicas e cerveja gelada para acompanhar. Passeio Público. Rua do Passeio, s/nº, Centro. Dom., 12h. Grátis. Retirada de ingressos pelo sympla.com.br.

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(Riotur Alexandre Macieira/Divulgação)

Pedra do Sal. Aos pés do Morro da Conceição rola uma das mais tradicionais rodas de samba da cidade, que conta com farta opção de drinques e gastronomia popular nas ruas adjacentes. Rua Tia Ciata, s/nº, Saúde. Sex. a seg., 18h. Grátis

 

Memória conservada

Museu do Samba é referência na preservação do gênero

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Museu do Samba: instituição localizada na Mangueira possui acervo fundamental para a preservação da história do gênero musical. (Diego Mendes/Divulgação)

Fundada em 2001 aos pés da favela da Mangueira, a instituição nasceu com o nome de Centro Cultural Cartola, inaugurado pelos netos do sambista e de sua esposa, Dona Zica (1913-2003). Em 2007, a iniciativa tornou-se responsável por proteger e garantir a integridade das Matrizes do Samba do Rio de Janeiro, registradas como patrimônio imaterial pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). No prédio, o público encontra um acervo de mais de 45 000 itens, 150 gravações de depoimentos de sambistas e livros e periódicos autopublicados, além de exposições sobre a força dessa manifestação popular.

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