Juntar um a um aqueles pequenos anéis de lacre das latinhas de bebida já parece, por si só, um hábito extravagante. Acumulá-los até encherem 120 garrafas PET de 2 litros, então, beira a loucura — cada embalagem comporta cerca de 2 500 pecinhas. Para a administradora de empresas Lucia Accetta, de 43 anos, essa tarefa insólita se transformou em rotina. Gerente de operações da IBM, ela conduz desde o ano passado um projeto voluntário em que os componentes metálicos são trocados por cadeiras de rodas (as 120 garrafas cheias valem uma cadeira), que depois são entregues a instituições de caridade. O que à primeira vista parece uma obrigação maçante na verdade exige uma grande capacidade de mobilização e articulação, coisa que Lucia tem de sobra. Ela não apenas engajou os colegas no prédio onde trabalha, em Botafogo, como também envolveu familiares, amigos, vizinhos, barraqueiros de praia, ambulantes, garis, bancas de jornal e até funcionários de restaurantes próximos do escritório e de sua casa, em Copacabana. “Determinação é a palavra-chave”, diz Lucia. “Sou uma carioca apaixonada pelo Rio e senti que precisava fazer algo pela minha cidade.”
“Quando as pessoas percebem que esse é um trabalho de verdade, elas se mobilizam”
Para conseguir a primeira cadeira de rodas, Lucia levou três meses e vinte dias para coletar os anéis. Na semana passada, a administradora e sua rede chegaram ao objetivo em 23 dias. Ao todo, já foram doadas onze cadeiras, o que equivale a mais de 3,3 milhões de pecinhas, que serão usadas na reciclagem de alumínio. Frequentemente, ela convida seus auxiliares na coleta para a cerimônia de entrega. “São ocasiões emocionantes”, conta Lucia. “Quando as pes-soas percebem que se trata de um trabalho de verdade, com resultado palpável, elas se mobilizam.” Não à toa, quando ela vê uma latinha dando sopa na rua, não hesita em se abaixar, arrancar o anel de alumínio e guardá-lo no bolso para a próxima doação.