Tudo vira bolinho
Pratos tradicionais da cozinha se transformam em salgadinhos nas mãos dos quituteiros cariocas
À primeira vista, reunir os ingredientes e acompanhamentos da feijoada em uma massa coberta por uma fina casquinha crocante parecia uma ideia bizarra. No entanto, o bolinho criado para a primeira edição do festival Comida di Buteco, em 2008, a partir da receita brasileira mais emblemática tornou-se uma espécie de instituição da gastronomia carioca. Depois de se disseminar rapidamente por outros bares da cidade, conquistar paladares exigentes e ganhar fama internacional, ele foi o responsável por deflagrar uma nova cultura nos botecos locais, onde pratos completos podem virar um único salgado. A própria Kátia Barbosa, que assina a criação, já adaptou outras receitas ao formato, e a última a chegar é uma variação do virado à paulista, feita de feijão-carioquinha, pedacinhos de bisteca, ovo, couve e linguiça. “Eu acho o máximo essa onda, mas daqui a pouco as pessoas vão pôr até foie gras no recheio”, imagina a cozinheira.
A dimensão desse fenômeno pode ser constatada nos cardápios dos bares da cidade. Afinal, em muitos deles a variedade de sabores dos bolinhos já ultrapassa a dos recheios dos pastéis e empadas, dupla que sempre ocupou o posto de comida oficial de botequim. No Colarinho, em Botafogo, faz sucesso a versão de estrogonofe, em que pequenas porções do prato são empanadas e jogadas no óleo quente. A freguesia adorou. Hoje, saem por mês cerca de 350 unidades, deixando longe um ex-campeão da casa, o croquete de carne. “A valorização dos botecos tem provado como a baixa gastronomia pode ser flexível e criativa”, explica Paulo Thiago de Mello, autor das primeiras edições do guia Rio Botequim.
Pendor para a inovação é o que não falta a quem cria esses salgadinhos. No Barzinho, comandado pelo chef Fabio Battistella na Lapa, o salaminho, que era servido fatiado, foi misturado a queijo parmesão antes de ir para a frigideira. No tijucano Da Gema, a massa de aipim que envolve a mistura de linguiça e couve leva ainda banana. No Leblon, o bar Chico & Alaíde prepara, entre outras variedades, uma pitoresca versão de caruru com vatapá coroado com um camarão. Nada mau para um acepipe cujas origens remontam ao aproveitamento das sobras de outras refeições.