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Urbanização descontrolada ameaça jacarés nativos do Rio

Está faltando fêmeas no reino dos jacarés-de-papo-amarelo. Culpa do esgoto de prédios da Zona Oeste, que afeta o equilíbrio ecológico da bacia lagunar

Por Cibele Reschke
Atualizado em 2 jun 2017, 12h43 - Publicado em 7 mar 2015, 01h00
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Felipe-fittipaldi (Felipe Fittipaldi/)
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A água estava verdinha na semana passada no Canal das Taxas, um dos cinco componentes do Complexo Lagunar da Baixada de Jacarepaguá, na Zona Oeste da cidade. Longe de representar limpeza, a gosma colorida que vem cobrindo as lagoas da região resulta dos dejetos em estado bruto que a Companhia de Águas e Esgotos (Cedae) tem depositado, sem maior constrangimento, naquela bacia hidrográfica urbana. Quem primeiro sofre com essa podridão oficializada não são nem os homens, mas os animais: a poluição mata os peixes e, por consequência, falta alimento para um bicho que é símbolo da área (tanto é assim que, no século XIX, deu nome ao bairro que ali nascia): o jacaré- de-papo-amarelo. A espécie parece fadada ao desaparecimento.

Estima-se que por lá ainda restem 4 500 desses répteis, batizados de “jacarés” na língua dos índios tupis. Nem é um número tão perturbador, que aponte a extinção iminente, mas um outro dado vem assustando a comunidade científica: 80% deles são machos (confira a explicação no quadro abaixo). O ciclo da vida, portanto, estaria por um triz. Pelas contas do Instituto Jacaré, e levando-se em consideração que ele é um animal que vive em torno de setenta anos, a última fêmea da família dos papos-amarelos deve nascer dentro de duas ou três gerações. E aí acabou.

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Região que mais cresce no Rio, muito em função dos Jogos Olímpicos de 2016, que impulsionam o mercado imobiliário local, a Zona Oeste viu sua população aumentar 150% na última década. De 2010 para cá, cerca de 130 000 empreendimentos imobiliários foram lançados em sua área central e nos entornos. Os moradores já vêm sentindo os efeitos na pele: a temperatura aumentou, quase não há mais brisas e está acontecendo uma proliferação de mosquitos. “Daqui a alguns anos ninguém mais vai querer morar lá”, afirma Ricardo Freitas Filho, doutor em biologia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), fundador do Instituto Jacaré. E ele é catastrofista: “Com o assoreamento das lagoas, toda essa água podre um dia pode subir, extravasando os limites atuais”. 

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Construções como o campo de golfe olímpico, ao lado do Parque Natural de Marapendi, na Barra da Tijuca, bairro vizinho, têm sido alvo de manifestações de ambientalistas. Na semana passada, um grupo abriu protesto contra o presidente do Comitê Olímpico Internacional, o alemão Thomas Bach, e o prefeito Eduardo Paes. “O governo, que deveria proteger as reservas biológicas, tem ignorado os riscos de expansão desenfreada”, observa Luiz Vallejo, doutor em biologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

Já expulsos de seu habitat, a outrora frondosa Mata Atlântica (da qual restam 12% da flora original), e cada vez mais próximos dos condomínios, os jacarés-de-papo-amarelo podem até aparentar uma falsa superpopulação, já que agora comumente são vistos aqui e ali. Só na última semana, por exemplo, dois desses animais tiveram de ser resgatados pela Guarda Municipal no meio da rua, após ser agredidos por pessoas que ali passavam. Desse jeito fica difícil. Se para eles já está complicado sobreviver com os desígnios da natureza, pior ainda é levando paulada dos homens. 

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