Animais peçonhentos: um risco que cresce e se espalha pelo Rio
Em meio ao calor e à degradação ambiental, acidentes com bichos como cobras, aranhas e escorpiões aumentam; cuidado preventivo é indispensável
Na véspera da morte do personagem Alexandre, na sexta reprise da novela A Viagem, exibida em 1994 pela TV Globo, seu intérprete, Guilherme Fontes, correu um perigo de vida real. Em junho o ator de 58 anos foi picado por uma jararaca em casa, na Gávea. “Doeu tanto que nem sei explicar”, contou, mostrando duas bolhas no dedo indicador esquerdo, em vídeo postado nas redes sociais que ele mesmo classificou como “utilidade pública”. “Tem que correr para o hospital e levar a cobra, morta ou viva, para que os médicos saibam como tratar”, escreveu. Com mais de 104 000 curtidas e quase 6 000 comentários na postagem, Fontes acabou se tornando uma espécie de garoto-propaganda de um problema silencioso e frequente no Rio. Nos últimos cinco anos, o estado registrou mais de 17 000 acidentes com animais peçonhentos, sendo 355 graves, levando a quarenta óbitos. Nas contas da prefeitura, o número de ocorrências cresceu de 419 em 2024 para 529 este ano, no período de janeiro a setembro. E, com a aproximação do verão, a tendência é aumentar.
Peçonhentos são os animais venenosos que injetam a toxina através de presas ou ferrões, caso das cobras e de escorpiões, aranhas, abelhas, lacraias e até arraias e bagres. Os ataques desses bichos devem ser notificados imediatamente às autoridades, e os dados coletados desde o mês passado estão disponíveis no Monitora RJ, ferramenta pública da Secretaria estadual de Saúde. Só este ano, até 15 de setembro, foram registradas 2 702 ocorrências envolvendo peçonhentos em todo o território fluminense. O panorama revela que, desde 2020, mais da metade dos casos aconteceu em regiões urbanas, o que contraria a percepção de maior risco em áreas rurais. “Os bichos estão em todos os lugares, mas os trechos urbanizados concentram mais gente”, explica Wagner Medeiros, biólogo da Vigilância Ambiental do estado. A degradação do ecossistema, segundo ele, tem se mostrado um dos fatores mais influentes para o aumento desses episódios. “Com a destruição das áreas de mata primária, a população se aproxima desses animais que, por sua vez, se adaptam facilmente a novas condições”, nota.
A chegada da temporada quente também preocupa. Diferentemente dos seres humanos, os peçonhentos não conseguem regular a temperatura corporal e, no calor, ficam mais ativos, o que pode levar a uma reprodução acelerada. “As aranhas são as que mais têm provocado acidentes. Entre as quatro mais perigosas estão a marrom, que gosta de ficar atrás de móveis, e a viúva-negra, que por ser preta e vermelha lembra uma joaninha. Muita gente pega para observar melhor e acaba levando uma picada”, alerta o veterinário Douglas Macedo, do Centro de Controle de Zoonoses da prefeitura. Ao se deparar com esse tipo de bicho, os cariocas devem ligar na mesma hora para o 1746. “Os números assustam e a população precisa estar orientada”, frisa Luiz Ramos Filho, secretário municipal de Proteção e Defesa dos Animais, chamando a atenção também para a ameaça representada pelos morcegos, que transmitem a raiva. Desde o início do ano, a central recebeu 507 chamados para capturá-los ó um incremento de 80% em relação aos 281 acionamentos registrados no mesmo período do ano passado. “Raiva não tem cura e pode matar. Deve-se tomar muito cuidado e não encostar neles em hipótese alguma”, reforça.
Não são poucos os riscos escondidos pelo Rio. “Temos a maior floresta urbana do mundo, com grandes áreas de mata”, lembra o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz. Ao sofrer um ataque, a orientação é procurar a unidade de saúde mais próxima. O tratamento, inteiramente gratuito, é feito na rede de hospitais do SUS, sendo o Lourenço Jorge, na Barra, e o Pedro II, em Santa Cruz, unidades municipais de referência. Há soros antiofídico, antiescorpiônico e antiaracnídico, que servem para neutralizar os venenos. Está em fase final de desenvolvimento e testes clínicos no Brasil um antiapílico, o primeiro no mundo capaz de atenuar a peçonha de múltiplas picadas de abelhas africanizadas (Apis mellifera), popularmente chamadas de “assassinas”. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 100 000 acidentes com elas foram registrados no país desde 2020, a maioria de outubro a março, em área urbana. No caso dos morcegos, a profilaxia inclui soro antirrábico e vacina. Mas é melhor prevenir do que remediar. Então, atenção às dicas: as recomendações vão desde manter jardins e quintais limpos a sacudir roupas e sapatos antes de usá-los, passando por vedar soleiras das portas e janelas ao escurecer, porque muitos desses animais têm hábitos noturnos. Qualquer descuido pode se transformar numa emergência.
O fim da picada – Os números preocupam
No estado:
2020: 2 430
2024: 3 767
2025 (até 15 de setembro): 2 702
Aranhas: 35%
Escorpiões: 24%
Serpentes: 16%
Outros: 24%
Na cidade:
2024: 419
2025: 529 até setembro
Aranha: 34%
Abelha: 14%
Serpente: 12%
Não identificados: 8%
Escorpião: 4%
Lagarta: 3%
Outros animais (predominantemente lacraias): 35%
Fontes: Monitora RJ e Sinan
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