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Por Rafael Mattoso, historiador
Curiosidades sobre o subúrbio carioca
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Salve a força da mulher suburbana

Toda reverência às mulheres guerreiras que lutam cotidianamente por direitos, igualdade e justiça social

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Atualizado em 12 mar 2020, 17h14 - Publicado em 12 mar 2020, 17h09

Esta semana, durante a apresentação de uma nova integrante de um grupo de debates sobre os subúrbios cariocas, fomos surpreendidos com a fala contundente de Thais Ferreira. Mesmo estando em contato com tantas suburbanas combativas, a descrição da realidade de luta feminina nos saltou aos olhos em pleno contexto do Dia Internacional da Mulher.

“Sou Thais Ferreira, 31 anos, mãe de três meninos pretos. Liderança comunitária do Grande Irajá há uns 14 anos. Sou artista e comunicadora por formação e me tornei Especialista em Saúde da Mulher e Primeira Infância por necessidade. Já atuei junto de diversos coletivos e iniciativas do Rio, desenvolvendo projetos que exploravam artes e tecnologias sociais para a solução de problemas complexos. Tô aqui pra conhecer e reconhecer todo mundo, aprender junto e fortalecer como for possível. Somos juntas e juntos.”

 O tema desta coluna já estava pensado há algumas semanas: a força das mulheres suburbanas. A ideia inicial era refletir sobre o papel das matriarcas – que são o centro de tantas histórias familiares, sociais, artísticas e culturais nos subúrbios cariocas. Ou seja, verificar as formas como se dá o poder feminino nos subúrbios onde, muitas vezes mesmo sem saber, mulheres lutam cotidianamente por direitos, igualdade e justiça social.

A força da mulher: catadora de latinha amamentando
A força da mulher: catadora de latinha amamentando (Marcelo Valle/Arquivo pessoal)

O 8 de março chegou e notamos que, felizmente, a lista de mulheres suburbanas que, de alguma maneira, ganharam mais visibilidade vem crescendo: Chiquinha Gonzaga, Maria das Dores Alves Rodrigues (mais conhecida como Dodô da Portela), Tia Maria do Jongo, Dona Yvonne Lara, Fernanda Montenegro, Aracy de Almeida, Beth Carvalho, Leci Brandão da Silva, Nilze Carvalho, a bailarina Ingrid Silva. Além é claro da Tia Surica, Tia Doca, Dona Neném, Rose, Jane da Vila e todas as Yabás da feira de Madureira/Oswaldo Cruz. Esses são apenas alguns exemplos consagrados, entre muitas gerações e diferentes áreas de atuação, de mulheres excepcionais, protagonistas de histórias inspiradoras.

Além da data marcante, uma história em particular provocou o tema desta coluna: a de Zuleika Sant’Anna de Souza que, a meu ver, sintetiza a suburbanidade em todas as suas características potentes e afetivas. Para essa missão, pedi ajuda à amiga Ana Claudia Souza, jornalista e filha da Dona Zuleika. Queria entrevistar a sua mãe para, a partir dessa história, exemplificar a grande dimensão da atuação feminina nos subúrbios.

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Mesmo sem termos realizado a entrevista, pois aos 93 anos, a saúde e a memória naturalmente já estão mais frágeis, ferviam na minha cabeça todas as belas histórias de ativismo contidas no livro de sua autoria – “A Vida e o Sonho – Memórias Afetivas sobre o bairro Honório Gurgel” – e no filme dirigido por Ana Claudia, “Dona Zuleika e a Feijoada do Darcy”, também baseado nessas experiências.

Documentário “Dona Zuleika e a feijoada do Darcy” (Ana Claudia Souza/Arquivo pessoal)

“Quando resolvi fazer o filme, editar o livro e seguir a trilha aberta pela minha mãe – craque em misturar intuição e determinação, sem dar bola para o que pudesse impedir que ela tornasse real o que parecesse sonho ou imaginação –, o que me moveu foi uma urgência de atenção: como aquilo tudo podia estar acontecendo na cozinha da casa onde fui criada e eu não ter me dado conta da grandeza do que a gente vivia?”, afirma Ana Claudia.

 A filha se refere, entre outras memórias, a uma das feijoadas organizadas por Dona Zuleika, como presidente da Associação das Donas de Casa de Honório Gurgel, em homenagem ao professor Darcy Ribeiro, que batizava o Espaço Cultural, criado por ela, em frente à sua própria casa, debaixo de uma árvore. Coisa de subúrbio.

Sandra e Ana Paula no Viradão Cultural Suburbano (Fabrício Goyannes/Arquivo pessoal)

É realmente incrível vivenciar e aprender na prática com tantos exemplos do nosso convívio. Ana Claudia, assim como Dorina, Adelaide, Ana Paula, Cristiane, Eliane, Élika, Giselle, Jaque, Joana, Lazir, Lígia, Lila, Luiette, Rôssi, Sandra, Teresa, Nilce, Karen Paula, Caroline, Dani, Tainá, Dyonne, Mathias, Rachel, Ariadne, Cynthia, Selene e Ana Slade são apenas alguns dos nomes que representam toda a potência e pluralidade das mulheres suburbanas e que temos o prazer de pertencerem a nosso grupo.

A estrutura desta coluna estava quase desenhada, e eis que surge no grupo Subúrbios Cariocas – fórum vibrante e agregador – Thaís Ferreira, apresentando-se com as declarações que abrem esta coluna. Lembrei-me do álbum “Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa…”, do rapper Emicida, lançado em 2015. Logo na primeira faixa, ele afirma: “Quando eu disser que vi Deus, ele era uma mulher preta”.

Antes de terminar, nessa sequência de uma ideia que leva à outra, de uma mulher que leva à outra, é impossível não registrar: em 14 de março, na mesma semana do Dia Internacional da Mulher, completam-se dois anos do assassinato de Marielle Franco. Símbolo de luta, mãe, filha, mulher, ativista, do subúrbio, da favela…

Marielle presente. Agora e sempre!

Casa do Jongo da Serrinha
O Jongo da Serrinha completa 60 anos e a Casa do Jongo é um reduto administrado por mulheres (Fabrício Goyannes/Arquivo pessoal)

Este texto foi inspirado pela vida, generosidade e luta de Dona Zuleika Sant’Anna de Souza, construído em conjunto com Ana Claudia Souza e revisado por Sandra Crespo.

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