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Por Juarez Becoza, repórter de gastronomia popular e caçador de botequins
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Fechamento do Cervantes: a boemia carioca na UTI

O triste episódio acende mais um alerta na combalida noite do Rio: será que nossas madrugadas um dia voltarão a ser as mesmas?

Por Juarez Becoza
Atualizado em 30 mar 2021, 17h58 - Publicado em 30 mar 2021, 15h48

Não é novidade pra ninguém que não seja um marciano alienado o estrago avassalador que a pandemia vem causando ao setor de eventos e gastronomia no Rio e no país. Nada que se compare à tragédia humana que se desdobra todos os dias nas UTIs dos hospitais, ou à vergonha monumental que açoita a mente obtusa de quem insiste em negar a gravidade da tragédia só porque não conhece – ainda – alguém que já morreu. Mas na área de bares e restaurantes populares – que são o objeto deste blog – todos sabemos muito bem como cresce exponencialmente o número de falências, que provocam desemprego e até fome entre aqueles que até outro dia enchiam nossos estômagos e espíritos de comida, chope e alegria. Mas há um nicho muito específico, muito especial, outrora reluzente na cidade, que pode estar próximo de uma asfixia total e definitiva: a vida noturna da madrugada.

Nesta terça (30), além do tumulto golpista que vem de Brasília, os cariocas amanheceram com a notícia de que o Cervantes de Copacabana iria fechar “momentaneamente”. O ícone das madrugadas movidas a chope bem tirado e um divino filé com queijo no pão francês fresquinho – que antes da pandemia vendia mais de mil sanduíches por noite – não se aguenta mais nas próprias pernas. Mas o golpe final não foi apenas o fechamento do acesso aos bares, iniciado semana passada e que vai até o dia 5 de abril, pelo menos. O bar sofre de uma pandemia mais grave, mais lenta, de proporções realmente avassaladoras: a mudança do comportamento das pessoas.

O comunicado de fechamento, publicado no Facebook
O comunicado de fechamento, publicado no Facebook (Cervantes/Reprodução)

Por mais que tenha tentado investir no delivery de seus sanduíches e pratos (o que continua acontecendo na filial da Barra da Tijuca), o Cervantes de Copacabana, instalado no burburinho notívago do bairro, já vinha sofrendo desde o ano passado com o desinteresse crescente das pessoas não pelo bar em si – mas pela noite. Desinteresse movido pelo medo da doença, da violência das ruas vazias, da falta de dinheiro que tornou o antes natural chopinho de fim de noite numa aventura financeiramente proibitiva.

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Ancorado pela sorte de ser dono das duas lojas que possui no bairro (a que dá frente para a Barata Ribeiro, em formato botequim, e o anexo com salão de restaurante, na Prado Júnior), o Cervantes vinha conseguindo se manter, mesmo com um faturamento inferior à metade do normal já há mais de um ano. A relação com os empregados, porém, foi a gota d´água. A falta de movimento na madrugada reduziu muito as gorjetas. Sem ter o mesmo traquejo com o delivery como, por exemplo, têm os seus vizinhos Sat´s e Bar do David, o Cervantes não conseguiu transferir receitas. O descontentamento crescente dos funcionários, e o compromisso dos donos de nunca atrasar salários, fizeram a equipe – em comum acordo – decidir pelo fechamento por tempo indeterminado. Não definitivo, mas sem data certa de retorno.

Na noite da última segunda (29), todos os contratos foram rescindidos. Em nota aos clientes, o bar disse um “até breve”, mas não afirmou quando volta. Segundo amigos, vizinhos e clientes mais chegados, o bar deverá ficar fechado por pelo menos quatro meses, aguardando uma definição melhor sobre a imunização coletiva que todos esperamos. O problema – e essa é uma digressão minha – é que ninguém sabe se o público voltará a ser como antes. A se comportar como antes. Ninguém mais sabe se a madrugada de Copacabana, já inteiramente esvaziada sem seus night clubs, restaurantes e muitos outros bares, voltará um dia a ser como antes. Como boêmio, botequeiro e amante da madrugada, eu realmente espero que sim. Só assim o Cervantes e outros bares como ele poderão, finalmente, se extubar e sair da UTI. Mas esse desfecho, assim como a imunização coletiva, ainda é uma incógnita.

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