A trajetória e a influência de Sérgio Cabral pai na cultura carioca
Jornalista, produtor musical e compositor, ele morreu no Rio neste domingo (14), aos 87 anos, por complicações de enfisema pulmonar; velório teve batucada
Morreu, neste domingo (14), aos 87 anos, o jornalista, produtor musical e compositor Sérgio Cabral. Com Alzheimer há cerca de uma década, há três meses ele estava internado na Clínica São Vicente, na Gávea, com complicações de um enfisema pulmonar. O anúncio foi feito por um de seus filhos, o ex-governador Sérgio Cabral Filho.
Vascaíno, Cabral teve o corpo velado na sede náutica do cruzmaltino, na Lagoa, na manhã desta segunda (15). O caixão estava coberto pelas bandeiras de seu time do coração, das escolas de samba Portela, Mangueira e Em Cima da Hora, além do bloco Simpatia É Quase Amor.
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A despedida do jornalista teve um gurufim, um ritual fúnebre em que as pessoas cantam e dançam em homenagem ao morto e que durante muito tempo foi comum nos funerais de sambistas. Acompanhados por ritmistas, os amigos e parentes de Cabral entoaram composições dele, como a música Meninos da Mangueira, além do hino do Vasco.
Além da viúva, Magaly Cabral, com quem o jornalista tinha um relacionamento de 62 anos, estiveram presentes personalidades como o ator Antônio Pitanga e sua companheira, a deputada Benedita da Silva, e o sambista Paulinho da Viola. O corpo foi cremado no Cemitério Memorial do Carmo, no Caju, na Região Portuária, em cerimônia restrita à família.
“Foi um homem inteligente, ativo, honesto, com bons princípios, muito alegre, feliz, vascaíno. Ele deixou o legado do Vasco para nós. Ele dizia que queria viver até os 120 anos. Mas, uma semana depois do Carnaval, ele teve uma pneumonia brava, que perdurou e desde então a saúde ficou péssima. Mas, agora ele descansou”, disse Magaly à TV Globo.
Apesar de ter tido seu nome, de certa forma, eclipsado pela trajetória política de um de seus três filhos, Sérgio Cabral Filho — para quem “perdeu” o nome e que se envolveu em escândalos, tendo sido preso em 2016 —, Cabral pai, como passou a ser chamado, foi de grande importância para a cultura nacional, sendo referência sobretudo no samba.
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Pesquisador de música popular brasileira, publicou o fundamental livro As Escolas de Samba — O Que, Quem, Onde, Como, Quando e Porque (1974), relançado como As Escolas de Samba do Rio de Janeiro (1996), além de biografias de nomes como Ary Barroso, Pixinguinha, Elisete Cardoso, Tom Jobim e Nara Leão, entre outros.
Nascido em Cascadura e criado em Cavalcante, ambos bairros da Zona Norte, Sérgio de Oliveira Cabral Santos ficou órfão de pai com apenas quatro anos. Estreou na imprensa em 1957, como repórter policial no Diário da Noite. Em 1961, começou a atuar como jornalista especializado em música popular, no Jornal do Brasil.
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Trabalhou em quase todos os jornais e emissoras de televisão do Rio. Foi um dos fundadores, em 1966, do Teatro Casa Grande, do qual foi diretor artístico, e um dos criadores do importante periódico O Pasquim, em 1969. No ano seguinte, foi preso com colegas da publicação pela ditadura militar, ficando detido durante dois meses.
Cobriu os desfiles das escolas de samba e, mais tarde, tornou-se jurado e comentarista das transmissões para a TV. Também foi jurado dos famosos e disputados festivais de música que aconteceram entre os anos 60 e 70.
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Produziu discos de nomes como Martinho da Vila, Baden Powell, Paulinho da Viola, Cartola e Dona Ivone Lara, entre outros. Projetou diversos sambistas na grande imprensa e foi pioneiro ao apontar o impacto do racismo na recepção da imprensa ao samba e a seus artistas.
Também foi compositor de sucessos. Ao lado de Rildo Hora, criou as músicas Visgo de Jaca (eternizada na voz de Martinho da Vila, no álbum Canta Canta, Minha Gente, de 1974), Os Meninos da Mangueira, Velha-Guarda da Portela e Janelas Azuis.
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Antes mesmo da incursão do filho na política, foi vereador na capital fluminense entre 1983 e 1993, pelos partidos PSDB e MDB. Foi secretário municipal de Esportes e Lazer entre 1987 e 1988, Depois, ocupou o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Município do Rio, onde permaneceu até 2007.
Em 1997, foi homenageado pela escola de samba Em Cima da Hora, de Cavalcanti, com o enredo Sérgio Cabral, a Cara do Rio. O título também batiza um documentário sobre ele, de 2008, dirigido por Fernando Barbosa Lima e disponível no streaming. “Eu vivo no Rio de Janeiro, e o Rio de Janeiro vive em mim”, diz ele no longa.
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No mesmo ano, em parceria com Rosa Maria Araújo, assinou a direção-geral, pesquisa e roteiro do musical Sassaricando — E o Rio Inventou a Marchinha, que estreou no Teatro Sesc Ginástico (hoje Teatro Firjan Sesi Centro) e foi um grande sucesso.
Ainda em 2007, doou para o Museu da Imagem e do Som (MIS) parte do acervo que acumulou ao longo de 50 anos de profissão e que documenta parte importante da história da música brasileira. São 61 000 itens, incluindo quatro mil fotografias, mais de mil discos (vinis e 78 RPM), material de jornais e revistas, além de suas crônicas, publicadas em vários veículos do país.
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