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Harmonização facial: quais são os limites na busca pela perfeição?

Procedimentos não cirúrgicos caíram no gosto de cariocas que buscam a beleza sem encarar o bisturi. Problema: ansiosos por resultados podem errar na mão

Por Carol Zappa
Atualizado em 20 abr 2022, 09h08 - Publicado em 14 abr 2022, 09h00
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Harmonização ou demonização facial? Técnica não foge dos riscos (iStock/Getty Images)
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Lábios carnudos, testa sem rugas, maçãs salientes, queixo proeminente e nariz empinado. Eis atributos que, na era das selfies e das videoconferências, em que as imperfeições são exibidas em escala superlativa, muita gente vem perseguindo nos consultórios de dermatologia. E o fazem com uma técnica conhecida como harmonização facial, que embute a promessa do rosto perfeito dispensando o bisturi.

O procedimento ainda ganhou um empurrãozinho ao ser adotado por celebridades como a modelo Gisele Bündchen, a atriz Cleo Pires e o DJ Alok, entre outras. A euforia em torno da ideia de poder mostrar uma face bela e linear se expressa em números: a procura pela harmonização cresceu mais de 50% entre os cariocas nos últimos anos — e a caça ao termo no Google disparou 540%.

A prática consiste em um conjunto de procedimentos estéticos não cirúrgicos, sobretudo injetáveis, à base de preenchimentos, com o objetivo de conferir ao semblante proporções mais simétricas. Até aí, tudo lindo, literalmente. Mas o problema é que, com a crescente demanda pelo padrão de beleza considerado ideal, pacientes e os próprios profissionais vêm perdendo a mão.

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“O que vemos com alta frequência é um festival de aberrações, rostos completamente deformados: os homens parecem estar com caxumba e há uma geração de Malévolas, de bochechas marcadas e queixo pontudo”, diz o dermatologista Daniel Coimbra. “Eu chamo isso de demonização facial.”

A popularização da técnica deve-se em grande medida à evolução de produtos como a toxina botulínica (o famoso Botox), o ácido hialurônico e os bioestimuladores de colágeno, indicados para tratar áreas específicas e cujos efeitos duram até um ano e meio.

Também a instantaneidade dos resultados e a conveniência de dispensar a invasão dos bisturis são um tremendo motor para a demanda registrada entre os dermatologistas. A Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética confirma que essa natureza de procedimento registrou um crescimento vinte vezes superior ao de outras intervenções e foi impulsionada pelas mídias sociais.

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Certas figuras públicas se tornaram símbolo da chamada beleza harmônica — no topo da lista figuram as irmãs Kardashian, com traços quase caricatos, sobrancelhas arqueadas, bochechas demasiadamente marcadas e mandíbulas grandes. “Todos querem um visual de capa de revista, seguindo artistas, modelos e influenciadores que aparecem nas redes”, explica o cirurgião plástico André Maranhão. Mas é preciso ficar bem alerta para a receita não desandar.

“Muita gente acaba se espelhando nesses exemplos, mas a técnica deve ser usada com parcimônia, para realçar contornos naturais e atenuar áreas de envelhecimento que possam incomodar”, frisa Luiza Guedes, mestre em dermatologia pela UFRJ.

Para muitos especialistas, o perigo está justamente na busca por um look uniforme — molar projetado para as mulheres, mandíbula quadrada para os homens — sem respeitar a anatomia facial de cada paciente. Também pesa a ânsia de querer corrigir tudo em uma única sessão. “Perdeu-se o critério do diagnóstico individualizado. Virou uma fôrma de bolo para todo mundo”, alerta Daniel Coimbra.

Entre os casos de exageros está o do humorista global Rodrigo Sant’Anna, 40 anos, que surgiu quase irreconhecível após uma harmonização. A internet, claro, não perdoou. “Ficou muito estranho”, atirou uma fã; “Máskara” e “Ken Humano” foram outros nomes atribuídos ao ator.

Com valores entre 2 000 e 30 000 reais, dependendo do número de aplicações e do produto escolhido, esses procedimentos migraram ainda para as salas de dentistas e esteticistas — o que fez subir a oferta, embora prevaleça uma polêmica. A Sociedade Brasileira de Dermatologia aconselha que sejam feitos apenas por dermatologistas e cirurgiões plásticos. Já o Conselho Federal de Odontologia reconhece a harmonização orofacial como uma de suas especialidades.

Embora os preenchimentos sejam reversíveis, o uso inadequado da técnica pode gerar danos graves. Entre os erros mais comuns estão o uso excessivo do material e injeções em áreas de alto risco, podendo causar complicações como necrose nasal e cegueira.

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Desde 2017, a SBD encaminhou mais de 1 000 denúncias ao Ministério Público de procedimentos conduzidos de modo ilegal, por não médicos. No Instagram, o perfil Desarmonização Facial, com 130 000 seguidores, relata uma série de casos malsucedidos. “Cabe aos profissionais estabelecer limites”, enfatiza a dermatologista Daniela Alvarenga.

Na contramão desses excessos, a médica explica que a principal tendência hoje no mundo da beleza é a do “menos é mais”, estética que ganhou potência com a pandemia e uma rotina mais caseira: “O importante é respeitar sua individualidade, exaltar os pontos fortes e únicos, e não escondê-los para ficar com o rosto da moda”.

E não custa lembrar: da mesma maneira que uma onda vem, ela vai. Há bem pouco tempo, peitos volumosos eram objeto de desejo, enquanto hoje as mulheres estão operando para diminuí-los. A sobrancelha fina deu lugar à mais grossa, a maquiagem definitiva caiu em desuso… A história mostra, enfim, que na estética é sempre bem-vindo manter o equilíbrio entre razão e ambição.

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