Cara de Fogo
- Duração: 90 minutos
- Recomendação: 18 anos
Resenha por Rafael Teixeira
O jovem Kurt (Johnny Massaro) e sua irmã mais velha, Olga (Julia Bernat), são fruto de um lar disfuncional. Em uma relação desgastada, o pai (Isaac Bernat) passa os dias obcecado pelas notícias a respeito de um assassino de prostitutas, enquanto a mãe (Soraya Ravenle) parece alheia aos rumos de sua vida. Os filhos, por sua vez, têm também suas próprias questões: a moça é algo inábil, socialmente falando, e o rapaz nutre uma estranha obsessão pelo fogo — e, como se verá, pelo seu efeito devastador em animais, construções e até pessoas. A falta de diálogo em casa é de tal ordem que só resta aos irmãos apoiarem um ao outro. A relação, entretanto, vai além do amor fraterno e cruza a fronteira do incesto. Quando Olga apresenta à família seu primeiro namorado, Paul (Alexandre Barros), o equilíbrio instável do quarteto começa a ruir. Texto de estreia do alemão Marius von Mayenburg, escrito em 1998, o drama é um retrato perturbador da incomunicabilidade e dos seus desdobramentos potencialmente ferozes. Em si muito bem urdida, a trama ganha ainda mais corpo na direção refinada e minuciosa de Georgette Fadel. Visualmente, a diretora revela, uma vez mais, sua farta inventividade estética, notável aqui na plasticidade de cenas incômodas envolvendo sexo, vômito e violência. Encravado em uma quina da sala, o diminuto cenário de Aurora dos Campos reforça esse apuro, além de evocar a claustrofobia do enredo. No mesmo sentido trabalham a luz cheia de climas de Tomás Ribas, a trilha opressiva de Davi Guilhermme e os figurinos estilizados de Beth Passi de Moraes e Joana Passi. No papel do namorado recém-chegado, Barros entrega uma apropriada sensação de dissonância em relação à família. Soraya, imbuída do alheamento materno, e Bernat, em atuação quase operística, convencem plenamente como o patético casal. Mas é no fino entrosamento entre Julia e Massaro, precisos e ainda mais potentes na contracena, que o espetáculo arrebata a plateia.