Live de Teresa Cristina inspira documentário sobre racismo filmado nos EUA
Luís Nachbin resolveu registrar manifestações nos Estados Unidos ao assistir bate-papo da cantora no Instagram; Black and White estreia nesta terça (2)
Foi uma live de Teresa Cristina que tirou o documentarista carioca Luís Nachbin da quarentena para produzir um filme sobre racismo e brutalidade policial. A ideia de registrar o movimento Black Lives Matter, que tomou as ruas dos Estados Unidos e se espalhou pelo mundo após a morte de George Floyd, em maio, surgiu enquanto assistia à cantora, num dia em que ela e convidados conversavam sobre o racismo estrutural. “Naquele momento, foi como se meu sangue de jornalista/documentarista tivesse fervido”, conta.
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Nachbin chegou a Atlanta na manhã seguinte a outro assassinato, o do jovem Rayshard Brooks, também por um policial branco: “Parecia ficção que, 18 dias depois da morte de George Floyd, outro cidadão negro tivesse sido assassinado, a sangue frio, com absoluta crueldade, e diante de câmeras”, conta, sobre o dia mais marcante de duas intensas semanas de filmagem: “Havia no ar uma combinação de tristeza, indignação, revolta, como nunca havia presenciado, em 23 anos viajando pelo mundo como documentarista independente”.
O resultado está no documentário Black&White, já disponível nas plataformas das operadoras Net/Claro, Oi e Vivo, e com estreia no Canal Brasil dia 3 de novembro, às 20h, precedida por uma live no Instagram do canal para discutir o tema, com a diretora e roteirista carioca Sabrina Fidalgo (Alfazema, de 2019, e Rainha, de 2016).
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O diretor registrou manifestações nas cidades de Atlanta, Nova Orleans e Orlando, viajando de ônibus pelo Sul do país. Os espectadores acompanham a história do ponto de vista de Nachbin, que está o tempo todo atrás da câmera e é responsável pela direção, produção, câmera, fotografia e roteiro de Black & White.
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O trabalho de pesquisa de vídeo e imagens de arquivo, para o qual contou com a montadora e videografista Alice Reis, ajuda a contextualizar os assassinatos – o de Brooks foi registrado por pelo menos cinco câmeras, imagens descobertas na fase de edição – e também as reações do presidente americano, Donald Trump. “A maior preocupação foi utilizar o material de forma sensível e cuidadosa, sem sensacionalismo”, destaca Nachbin.
As entrevistas mostram diferentes perspectivas da luta contra o racismo. Em frente aos destroços da lanchonete Wendy’s, onde Brooks foi morto, o manifestante Sylvester Matthews afirma que nunca houve diálogo entre a comunidade negra e a polícia. Já em Orlando, Shanta Barton-Stubbs, diretora executiva voluntária do centro jovem New Image, defende que o exemplo dos adultos na luta pelos próprios direitos é fundamental na construção de uma comunidade melhor nas próximas gerações. Durante todo o filme ecoa a frase: “Vidas Negras Importam é um movimento, e não um momento”.
Pioneiro da videorreportagem no Brasil, Nachbin está acostumado a viajar sozinho, apenas com uma câmera na mão. Já produziu mais de 200 documentários, entre eles os programas Passagem Para e Entre Fronteiras, na TV Futura, e edições do Globo Repórter. Mas se questionou muitas vezes sobre a ideia de ir para os EUA, epicentro da pandemia de Covid-19. A inquietação e o sentimento de que esse momento histórico precisava ser registrado falaram mais alto. “Foram dias exaustivos, mas gratificantes.
Espero que as pessoas percebam o absurdo de estarmos em 2020 discutindo sobre a cor da pele. Não é possível. Que cada espectador passe adiante pensamentos e ações por igualdade”, deseja Nachbin, que está de volta aos Estados Unidos, desta vez na Costa Oeste, para cobrir as eleições americanas, outro momento também já considerado histórico.
* Reportagem de Julia Carvalho, estudante de jornalismo da PUC-Rio, sob orientação da professora Itala Maduell e revisão final de Veja Rio.