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Arquitetura nômade é estratégia para melhor aproveitar legado olímpico

Epicentro dos Jogos de 2016, Parque Olímpico desdobra-se em áreas urbanas, como o estádio Moça Bonita, em Bangu, e o Terminal Gentileza

Por João Marcello Santos
Atualizado em 15 ago 2024, 18h37 - Publicado em 15 ago 2024, 18h32
Parque olímpico
Parque Olímpico da Barra: complexo foi desmembrado e o material usado em outras regiões da cidade (Alex Ferro/Divulgação)
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Dez anos depois do início das obras para o Rio receber os Jogos Olímpicos de 2016, o legado divide-se entre impactos positivos para a cidade – principalmente esportivos e educacionais – e promessas não cumpridas, como a despoluição da Baía de Guanabara.

Os mais de 80 milhões de reais consumidos no aproveitamento posterior das instalações adotadas na Rio2016 converteram-se, por exemplo, em 100 novos ginásios educacionais tecnológicos (GETs) e 11 unidades de ensino integral.

Inaugurado em fevereiro deste ano, o Ginásio Educacional Olímpico Isabel Salgado reforça a aproximação do Parque Olímpico da Barra com atividades de educação, lazer e cidadania, como previam os compromissos formalizados pelas autoridades brasileiras na candidatura olímpica.

inauguração do Terminal Intermodal Gentileza
Terminal Intermodal Gentileza: um dos serviços disponíveis é uma linha de ônibus executivo para o Aeroporto do Galeão (Beth Santos/Prefeitura do Rio/Divulgação)

Epicentro dos Jogos de 2016, o parque desdobra-se ainda para outras áreas urbanas: equipamentos instalados no espaço têm sido reaproveitados em revitalizações como a do estádio Moça Bonita, em Bangu, e construções como a do Terminal Intermodal Gentileza, em São Cristóvão. Também em atividade desde fevereiro, o terminal atende a cerca de 130 000 pessoas por dia.

Essas iniciativas reproduzem a chamada arquitetura nômade. Adotada progressivamente em metrópoles mundo afora, corresponde à reutilização urbana de estruturas móveis, de acordo com necessidades e prioridades comunitárias. As construções  podem ser deslocadas, desmontadas e armazenadas em lugares diferentes conforme as necessidades.

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“É uma estratégia útil”, enfatiza a professora de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Rio Ana Luiza Nobre. Ela acredita que a arquitetura nômade possa potencializar os efeitos do legado olímpico:
“É um modelo que supera o princípio clássico de eternidade arraigado na arquitetura. Ele também responde de maneira ambientalmente adequada a uma série de questões atuais, como demandas por mobilidade ligadas a emergências ou eventos temporários”, explica. Versatilidade que se aplicaria, por exemplo, no socorro a desalojados pelas enchentes no Rio Grande do Sul e a outros atendimentos sociais.

Outro benefício é a redução do impacto ambiental e econômico, decorrente do ciclo de construção e demolição de edifícios. No total, a economia estimada para os cofres públicos com o uso da arquitetura nômade no Terminal Intermodal Gentileza (TIG) totaliza R$ 22 milhões. As instalações metálicas do terminal são provenientes do Centro Internacional de Transmissão (IBC) que ficava na Arena do Futuro, no Parque Olímpico da Barra. O reaproveitamento representa, também, uma alternativa sustentável para o urbanismo.

Tais características ampliam, potencialmente, os usos de equipamentos urbanos adotados na Rio 2016. Os Jogos desencadearam promessas de melhorias na infraestrutura urbana – parte delas sob a forma de contrapartidas oficiais atreladas à realização da Olimpíada.

Os compromissos urbanísticos firmados com o Comitê Olímpico Internacional constituíram um avanço em relação aos empreendimentos associados ao Pan-Americano de 2007, avalia o professor de Marketing Esportivo da PUC-Rio Luiz Léo: “Os ganhos com a infraestrutura urbana são inequívocos: as melhorias vão da malha de transportes à ampliação da rede de serviços, como de hospedagem e alimentação. Incluem também a aquisição de novos equipamentos esportivos, com algumas instalações usadas para finalidades públicas, como escolas, e privadas, como eventos esportivos e shows”.

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Para Luiz Léo, o melhor aproveitamento dos investimentos feitos para o Rio 2016 passa por uma ordem política que reflita uma visão estratégica de longo prazo do Estado brasileiro. “Uma política séria de esporte deve ser pensada como política de Estado, em caráter permanente, de longo prazo. Neste sentido, os megaeventos esportivos constituem uma oportunidade única de alavancar o processo e antecipar etapas.

Esse esforço não tem nenhum sentido caso interrompido pelo burocrata da vez, que decida monocraticamente reverter uma filosofia de desenvolvimento do esporte brasileiro derivado de décadas de planejamento e investimentos massivos”, ressalva.

A construção e o aproveitamento do legado olímpico, como propulsor de transformações urbanas, historicamente enfrenta barreiras políticas. Não é raro se misturarem a obstáculos burocráticos. O movimento olímpico enfrentou, especialmente nos anos 1970 e 1980, diversos tipos de entraves ligados à geopolítica mundial e a forças econômicas em meio à transição da Guerra Fria para a globalização.

O professor da PUC-Rio lembra, por exemplo, o atentado à delegação de Israel, nos Jogos de Munique, em 1972; o endividamento excessivo das cidades-sedes como Montreal, em 1976; e os boicotes dos Estados Unidos e da extinta União Soviética que marcaram, respectivamente, as edições de Moscou (1980) e de Los Angeles (1984).

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A partir destes episódios, o Comitê Internacional passou a impor, aos candidatos à sede olímpica, um conjunto de encargos para reduzir impactos político-ideológicos e econômicos nas cidades que pretendem receber os Jogos. Busca, assim, preservar a autonomia dos propósitos esportivos e reforçar a responsabilidade social com as realidades locais.

A base vem forte: 200 ginásios educacionais tecnológicos foram inaugurados em dois anos
A base vem forte: 200 ginásios educacionais tecnológicos foram inaugurados em dois anos (./Prefeitura do Rio de Janeiro)

As candidaturas passaram a enfatizar a consistência do legado olímpico, progressivamente comprometido com a responsabilidade socioambiental. A Arena do Futuro, por exemplo, foi programada para ser reutilizada. Suas instalações transformaram-se em quatro Ginásios Educacionais Tecnológicos, mas apenas oito anos depois da Rio 2016: os GETs José Mauro de Vasconcelos, em Bangu, e o Emiliano Galdino, em Santa Cruz, entregues em fevereiro; o Nelcy Noronha, de Campo Grande, em março; e o Mestre Diego Braga, em Rio das Pedras, em maio.

* Estudante de Jornalismo da PUC-Rio, com orientação de professores da universidade e revisão final de Veja Rio.

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