Livro “Então, Maria Bethânia” reúne mais de 400 fotos da cantora
A estrela de primeira grandeza da MPB completou meio século de bem-sucedida carreira em 2015
O show era em São Paulo, temporada curta. Depois do check-in, veio o susto: as janelas do quarto reservado eram lacradas. “Eu vou passar duas semanas trancada aqui dentro”, desabafou a hóspede, a atração principal do espetáculo, um tanto desesperada com a situação. Não era exagero, garante quem a conhece. “Durante as apresentações, nas horas vagas, ela nem sequer vai à esquina, a dedicação ao espetáculo é tamanha que não sobra tempo para nada”, explica a diretora Bia Lessa, ao lembrar a anedota passada com Maria Bethânia, amiga de longa data e sólida parceira de trabalho. O episódio diz muito sobre a cantora, majestosa no palco e discreta fora dele — a ponto de se enfurnar por duas semanas em um quarto de hotel. Com comportamento à prova de modismos, a estrela de primeira grandeza da MPB completou meio século de bem-sucedida carreira em 2015, tornou-se uma septuagenária serelepe em cena um ano depois e mantém a própria biografia muito bem resguardada. Daí a surpresa que provocam as mais de 400 fotos reunidas em Então, Maria Bethânia (Barléu Edições, 368 páginas, 125 reais), livro de arte com lançamento marcado para terça (24), no Museu de Arte Moderna.
As datas redondas de carreira e de aniversário inspiraram tributos variados — em um deles, Bethânia, transformada em enredo na Sapucaí, levou a Mangueira ao primeiro lugar no Carnaval de 2016. Um ano antes, a artista foi brindada com a alentada exposição Maria de Todos Nós, ideia de Ana Basbaum, produtora da intérprete há mais de três décadas, coordenada por Bia Lessa e exibida no Paço Imperial. Um catálogo sobre a mostra, com mais de 1 000 peças, de criações inéditas a instalações cenográficas, foi cogitado. “A exposição foi um tremendo esforço coletivo, mas como documento, em livro, não ia funcionar”, diagnosticou Bia Lessa, diretora de diversos espetáculos da diva, a exemplo de Brasileirinho, Tempo Tempo Tempo Tempo, Festa Amor e Devoção e do mais recente, Abraçar e Agradecer, que comandou ao vivo e na versão em DVD. Começava a nascer aí um livro diferente. “Foi uma surpresa agradabilíssima. O catálogo, no processo, deixou de existir e virou algo maior”, conta Carlos Leal, o dono da Barléu Edições.
Bia Lessa, a responsável pela concepção final da publicação, define a esmerada obra, com programação visual do escritório de design Cubículo, como um “livro de história do Brasil contada através de uma personagem extraordinária”. Entre letras do mano Caetano Veloso, citações a Guimarães Rosa e textos históricos saborosos assinados pelos antropólogos Darcy Ribeiro (1922-1997) e Maria Lúcia Montes, emerge a vida de Maria Bethânia como nunca se viu, nas fotos que dão conta de sua infância aos shows mais recentes. Está tudo lá: a meninice na Bahia, em Santo Amaro da Purificação, manifestações de religiosidade, a estreia no Rio, em 1965, com o show Opinião, um raro ensaio de moda, além de momentos de privacidade e sossego na casa das Canoas, seu lar-refúgio carioca. “Queríamos imagens que falassem por si”, conta Bia Lessa. Ela conseguiu mais. Em Então, Maria Bethânia, abriu diante do leitor centenas de janelas voltadas para a vida e a obra de uma cantora consagrada — e, fora do palco, discreta.