Contagem regressiva: Rio recebe o maior show da carreira de Lady Gaga
Diva pop promete sacudir as areias de Copacabana com um espetáculo surpreendente, que já mobiliza fãs e faz girar as engrenagens da economia carioca

Poucas semanas antes de aterrissar nas areias cariocas com a turnê Mayhem Ball, Lady Gaga encarou uma prova de fogo no festival californiano Coachella, nos Estados Unidos. Os olhos do mundo estavam voltados para a versátil cantora de 39 anos quando o microfone falhou bem na hora de Abracadabra, hit do novo álbum. Rápida no gatilho, Gaga trocou o headset por um modelo de mão, sem comprometer a atlética coreografia. Mais tarde, pediu desculpas à plateia, fazendo graça do infortúnio: “Pelo menos vocês sabem que eu canto ao vivo”, brincou, bem ao seu modo. É mesmo um feito raro entre as divas pop — a maioria, é sabido, recorre a playback.
Aclamado pela crítica e pelos fãs, o show foi uma prévia do que a artista oferecerá (de graça) no sábado, 3 de maio, nas areias de Copacabana. O que agitará aquela maravilha de cenário é uma verdadeira ópera dark pop, unindo figurinos de inspiração vitoriana, caveiras e bailarinos fantasiados de zumbis. Além de cantar e dançar em vinte números, divididos em cinco atos, a incansável Lady Gaga tocará guitarra, percussão e piano.
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Para tentar minimizar chances de erro, a estrela optou por apresentar o novo trabalho somente em arenas. A passagem a céu aberto pelo Rio, portanto, é exceção na turnê e inédita sob ângulos variados, dados os números superlativos envolvidos. Só para dar uma dimensão, o palco, de 2,20 metros de altura, ocupa 1 260 metros quadrados. Ao fundo, será instalado um mega painel de LED, de mais de 800 metros quadrados. Essa será a única apresentação de Mayhem Ball pela América do Sul, ao menos neste ano — uma exclusividade exigida pelo projeto Todo Mundo no Rio, cuja premissa é promover, até 2028, um grandioso espetáculo internacional na praia de Copacabana, sempre em maio.
Coube a Madonna inaugurar os trabalhos, atraindo uma multidão de 1,6 milhão de pessoas àquela generosa faixa de areia em 2024. A expectativa é de que Gaga, ou Mother Monster, como é carinhosamente chamada pelos fãs (os little monsters), junte ainda mais gente. “No ano passado havia uma série de dúvidas, principalmente em relação a segurança, mas o show foi um sucesso. Isso é um baita incentivo”, pondera Luiz Guilherme Niemeyer, sócio da Bonus Track, produtora do espetáculo, que profetiza, ambicioso: “Será a maior performance de Lady Gaga e um marco para o show business mundial.”

Cinco salões do Copacabana Palace estão reservados para a cantora, que deve aportar em solo carioca no dia 28 de abril, logo depois de se apresentar no México. Será dela a suíte presidencial do hotel, que também alojará parte da equipe internacional, de cerca de 300 integrantes. No total, há 4 000 profissionais envolvidos e outros 10 000 entrarão em campo no dia do show. É provável que Stefani Joanne Angelina Germanotta (seu nome de batismo) suba ao palco em Copacabana dias antes para ensaiar, para deleite dos fãs, que a vêm acompanhando acompanhando desde quando lançou o álbum The Fame, em 2008.
Três anos mais tarde, Born This Way marcou a grande virada temática na carreira da cantora, que passou a abordar assuntos como inclusão e auto aceitação, caindo nas graças do público LGBT+. Desde então, experimentou diferentes fases, sacudidas por mudanças de sonoridade, de letras e figurinos — e também se aventurou na telona. “Ser multifacetada é o principal talento de Lady Gaga. Ela canta, dança, atua e cria conceitos para os clipes. Tudo é muito bem planejado”, avalia a jornalista Ana Karolina Carvalho, cujo mestrado na UFF se debruça sobre as divas pop.
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Do gênero metamorfose ambulante, a artista de Nova York se inspirou na canção Radio Ga Ga, do Queen, para cunhar seu nome artístico. Já bem estabelecida no escaninho das estrelas pop, resolveu explorar as sonoridades do jazz (lançando um álbum com o astro Tony Bennett, em 2014) e do country e do rock, em Joanne, de 2016. Paralelamente, teve destaque por sua atuação na série American Horror Story, que lhe rendeu um Globo de Ouro. A primeira protagonista no cinema veio no remake do musical Nasce Uma Estrela, de 2018, dirigido por Bradley Cooper, seu par romântico na história.
Coube a ela reeditar, com talento, um papel que já pertencera a Barbra Streisand na década de 1970. Por sua atuação e participação na trilha, se tornou a primeira mulher a ganhar um Oscar, um Bafta, um Globo de Ouro e um Grammy no mesmo ano. Tamanha repercussão impulsionou sua carreira de atriz, e ela embalou em outras tramas cinematográficas — protagonizou ainda Casa Gucci, em 2021, e Coringa: Delírio a Dois, em 2024. “Sempre houve teatralidade nas produções musicais, algo esperado pelos little monsters. Para os fãs, é o melhor de dois mundos, porque ela realmente é boa atriz”, observa Ana Karolina.
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Essa não é a primeira vinda da estrela americana ao Brasil — em novembro de 2012, Gaga passou pelo Rio com a turnê Born This Way Ball, que também contou com shows em São Paulo e Porto Alegre. Mesmo com público abaixo do esperado no Parque Olímpico, ela enrolou-se em uma bandeira verde e amarela e declarou seu amor à primeira vista ao Rio. “Viajei o mundo inteiro, mas nunca me senti tão feliz. Senti Deus quando cheguei aqui. Este é o meu lugar favorito no mundo”, derramou-se, entre lágrimas.
A artista ainda visitou um projeto social no Morro do Cantagalo, na Zona Sul, provou churrasco no finado Porcão de Ipanema e, em meio à euforia, marcou na pele o amor à cidade. Cinco anos mais tarde, veio o baque: uma acentuada crise de fibromialgia, doença crônica que causa dores generalizadas, obrigou Gaga a cancelar a aguardada participação no Rock in Rio. Nas redes, ela deixou registrada sua frustração: “Brazil, I’m devastated” (“Brasil, estou arrasada”), postou.
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O esticado período sem Gaga a e a ótima recepção ao novo álbum só fazem aumentar a expectativa em torno do espetáculo. A rodoviária do Rio aguarda o desembarque de 200 000 passageiros na semana do evento, que coincide com o feriado do Dia do Trabalhador — a maior parte de São Paulo, Minas e Espírito Santo. O movimento previsto é 10% acima do registrado no show de Madonna. “O público de Lady Gaga é mais jovem e quer economizar, daí o ônibus, cujas passagens custam 800% menos”, afirma a diretora-geral do terminal, Roberta Faria.
O RIOgaleão também estima aumento do fluxo: 363 000 pessoas devem passar por lá entre 29 de abril e 6 de maio. Já o número de pousos e decolagens, segundo as previsões, será 19% maior que em maio passado. Dados do Airbnb apontam que a procura por hospedagem na cidade subiu 150 vezes em relação ao mesmo período de 2024, enquanto o HotéisRIO celebra — mais de 80% dos quartos entre Leblon e Leme já estão reservados. “O efeito positivo se estende ao comércio e à gastronomia. Todo mundo sai ganhando”, resume Alfredo Lopes, presidente do sindicato.
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Sempre atenta ao calendário carioca, a Saara, polo de comércio no Centro do Rio, oferece de tatuagens temporárias a camisetas temáticas, tudo tendo Lady Gaga como estrela-maior. O carro-chefe é a estampa batizada de “picanha da Gaga”, encontrada em regatas, shorts e até leques, numa alusão ao vestido de carne ostentado por ela numa premiação em 2010. As peças — de roupa, é bom salientar — partem de 69,90 reais na Lix, na Rua Senhor dos Passos.
Sócia do estabelecimento, Lorrana Lica acredita que, na semana do show, o volume de vendas vai ultrapassar 35 000 reais a cada dia. “É um montante dez vezes maior que um dia convencional. Metade do estoque já foi”, comemora a comerciante. Os criadores do RDT Lady Gaga, principal site dedicado à estrela no país, já garantiram o look e organizam-se para a grande noite em 28 grupos de WhatsApp. “Tenho certeza de que vou chorar muito quando ela entrar no palco. Esse sentimento está represado há anos”, conta o publicitário maranhense Gabriel Abreu, que estava na porta do Fasano em 2017, na fatídica tarde em que a cantora anunciou que não iria ao Rock in Rio.
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Empenhado em transformar o Rio em polo cultural, Eduardo Paes encomendou à secretaria municipal de Desenvolvimento Econômico (SMDE) um estudo para calcular o impacto financeiro da performance nas areias. Cerca de 600 milhões de reais devem ser movimentados durante o feriadão, 27,5% a mais que no ano passado, e 240 000 fãs planejam vir de fora da capital. “O Rio já é conhecido pelas belezas naturais, mas há muito potencial. Por isso, estamos construindo uma identidade sexy, desejada”, fala o prefeito.
A expectativa é de que cada estrangeiro desembolse aproximadamente 600 reais por dia durante a temporada carioca, enquanto os brasileiros gastarão, em média, 1500 reais ao longo de toda a estada. “O calendário fixo de shows permite que a cidade ocupe um lugar especial no cenário global do entretenimento”, afirma João Figueiredo, coordenador do doutorado em economia criativa da ESPM. Lady Gaga sabe das coisas. Todo mundo quer mesmo estar no Rio.
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Megaestrutura
Os números do show em Copacabana
1260
METROS QUADRADOS
terá o palco montado para Lady Gaga — o de Madonna tinha 812 metros quadrados
2,20 METROS
de altura da areia para o palco, para facilitar a visão do público
806 METROS QUADRADOS
é o tamanho do telão principal, todo de LED de última geração
2 horas e 30 minutos
é o tempo máximo do show, que pode ter 40 minutos a mais do que a apresentação no Coachella
1,6 MILHÃO DE PESSOAS
são aguardadas nas areias de Copacabana, sendo quase 200 000 turistas estrangeiros
Rio, eu te amo
Até tatuagem ela fez na sua visita à cidade em 2012
A experiência na cidade ficou marcada na pele da cantora, que tatuou “Rio” na nuca, com a letra “i” estilizada como uma cruz, fazendo uma referência ao Cristo

A diva pop apareceu na varanda de seu quarto no Fasano, onde estendeu uma faixa em que se lia I Love Rio, usando apenas uma camisa da seleção brasileira de futebol

Na véspera do show, sob forte esquema de segurança, visitou um projeto social no Cantagalo, em Ipanema, tomou cerveja de garrafa num boteco da comunidade e comeu churrasco no finado Porcão

Cinco anos depois, ela cancelou participação no Rock in Rio devido à fibromialgia, doença crônica que causa dores generalizadas, e o público reagiu com memes até hoje

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Shows de milhões
Os recordistas de público na Praia de Copacabana

3,5 MILHÕES
Rod Stewart (1994)
O primeiro astro internacional a fazer um grande show gratuito na Praia de Copacabana, no Réveillon de 1995, entrou para o Guinness Book, mas há quem argumente que o público estava presente para ver os fogos na praia, tradição da virada, e não o cantor inglês.
1,5 MILHÃO
Rolling Stones (2006)
Em fevereiro de 2006, um dos maiores nomes do rock se apresentou de graça para o público carioca. O grupo inglês subiu em um palco com 24 metros de altura, o equivalente a um prédio de oito andares, e se apresentou por duas horas com a turnê A Bigger Bang.
1,6 MILHÃO
Madonna (2024)
The Celebration foi a quarta turnê de Madonna a passar pelo Rio, em maio de 2024. O show bateu o recorde de público da carreira da cantora, que fez tributo a diversas fases de sua vida artística e contou com participações de Pabllo Vittar e Anitta no espetáculo.
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