Cleo Pires vira fenômeno na internet ao falar de sexo e drogas sem pudor
Estrela de duas atrações da Globo, a novela Haja Coração e a série Supermax, ela provoca polêmicas e planeja ainda se lançar como cantora
Descalça, sem um pingo de maquiagem no rosto, com o cabelo preso em um coque improvisado, vestida de jeans rasgado e camisa do mesmo tecido, Cleo Pires, 34 anos, acomoda-se em uma poltrona de couro em seu apartamento, no bairro de Ipanema. É noite de sábado e ela pergunta se pode pôr uma música. As caixas de som ecoam Marilyn Manson, o cantor americano cujo visual bizarro lembra o de um vampiro. Diz que a ocasião merece um vinho, pega uma garrafa de tinto, abre e serve-se de uma taça. Enrola um cigarro de tabaco natural, acende e começa a fumá-lo — serão mais cinco nas próximas três horas. Pede desculpas pela bagunça. Uma lata de refrigerante foi esquecida em uma mesa lateral e pacotes de presentes — ela havia feito aniversário na semana anterior — continuam intocados em um canto. Enquanto fala, come um balde de pipoca. Inquieta, pede um minuto, vai até o quarto e volta com outra roupa, desta vez uma calça de malha e uma camiseta sem nada por baixo. Ainda com fome, encomenda uma pizza de pepperoni por telefone. Toda essa agitação deixa claro que a atriz vive um momento inusitado. Ela está no ar em duas produções da TV Globo — a novela das 7, Haja Coração, e a série Supermax — e acaba de fazer três campanhas publicitárias. Em breve, protagonizará quatro filmes e ainda planeja investir na carreira de cantora (ouça, com exclusividade, uma música que ela compôs e canta em inglês). Não bastasse tudo isso, assumiu o papel de musa libertária no mundo virtual. Há quatro meses, lançou um site pessoal onde publica suas opiniões e fotos para lá de picantes. Como resultado, acumula mais de 6 milhões de seguidores em seus perfis nas redes sociais. “Eu perdi o medo de me expor e de falar o que penso ou sinto”, resume.
Em poucos minutos de conversa, a atriz deixa transparecer que é do tipo que adivinha o signo do interlocutor — e costuma acertar. Com interesses díspares, que vão da astrologia à moda, passando por cosmologia, fotografia, literatura erótica e física quântica, só para citar alguns, conta que precisava de um espaço para extravasar. No site, no qual investiu do próprio bolso 200 000 reais, são publicados vídeos, entrevistas e ensaios fotográficos. Ela deixa claro que o objetivo é manter uma plataforma virtual não só de exibição de si própria, mas também dos temas de que gosta. É justamente na internet e no seu Instagram que o furacão Cleo faz mais barulho. Quem acessa o portal da atriz já percebe que ali é o espaço para conhecer uma faceta dela pouco vista na TV — a começar pelo close de sua boca, em que um cubo de gelo derrete entre seus dentes. Tal padrão se estende a seus perfis nas redes sociais. No início de outubro, uma foto que publicou, vestida só de calcinha e deitada em uma cama, rendeu mais de 100 000 curtidas. Tudo o que ela faz e publica vira notícia e dá o que falar (no caso de merchandising, os valores começam em 20 000 reais). Na mesma semana da foto desinibida, estampou as manchetes do noticiário de celebridades ao perder um voo de Miami para o Rio devido a uma crise de ansiedade. O episódio obrigou-a a faltar a um dia de gravação no Projac. “Eu ia para o aeroporto e comecei a ficar toda dormente, entortar inteira, parecia uma convulsão. Liguei para o meu médico, que receitou quinze gotas de Rivotril, e apaguei”, lembra a atriz, que anda com um vidrinho do ansiolítico na bolsa. “Já tinha passado por outro episódio duas semanas antes na casa dos meus pais. Deve ser estafa, muito estresse, muita energia, sei lá”, argumenta.
Desde que decidiu se escancarar para os fãs, sexo virou um tema contumaz para Cleo. E surpreende o tom franco com que encara assuntos ainda vistos como tabu mesmo no mundo artístico, um círculo tido como liberal nesse aspecto. “Gosto muito da coisa e do seu universo. Assisto filmes pornôs e tenho fetiches como o bondage e o choking”, diz ela, referindo-se a práticas consideradas pesadas — e, por alguns, até mesmo pervertidas. Para a atriz, é um absurdo que as pessoas se sintam culpadas ou envergonhadas de falar abertamente sobre suas preferências. E não hesita em tomar a iniciativa quando lhe convém. Foi ela, por exemplo, quem se ajoelhou e pediu o ex-marido João Vicente de Castro, ator e apresentador, em casamento. A cerimônia não aconteceu, mas moraram juntos por quatro anos. “Quando ela ama, dedica-se loucamente e, às vezes, isso se traveste de ciúme. Mas a Cleo me ensinou muito sobre parceria. Eu era um garoto e ela me fez homem”, define Castro. Solteira desde fevereiro, após um namoro de três anos com o ator Rômulo Neto, diz que já convidou pessoas para dormir na sua casa. “Fiz muito sexo casual, mas isso está me deixando vazia ultimamente”, confessa a atriz, que faz exame de HIV pelo menos duas vezes por ano. Impulsiva, Cleo recorda que o local mais estranho onde fez sexo foi em banheiro de avião — mais de uma vez. E se, ao sair, tiver aquela fila na porta do toalete? “Ué, volto para o assento normalmente. Faço a louca”, diz ela, que admite ainda já ter “sentido tesão” por um ator em pleno estúdio, enquanto gravava uma cena.
Da mesma forma que fala sobre o tema sem papas na língua, sua vida íntima passou a instigar a curiosidade alheia. Recentemente surgiram boatos de que estaria tendo um caso com sua assessora de imprensa e empresária Piny Montoro. Embora dividam o apartamento de Cleo em Ipanema e o de Piny em São Paulo, ambas descartam qualquer relacionamento que vá além da amizade. “Nunca rolou, mas, se eu tiver tesão numa mulher, tudo pode acontecer”, diz, com bom humor. “Eu poderia transar com essa flor”, completa a atriz, apontando para um vaso de orquídeas na sala. “Não vou deixar de fazer o que quero porque os outros vão falar.” Conviver com a fama não é novidade para Cleo, que praticamente nasceu sob os holofotes. Filha da atriz Gloria Pires e do cantor Fábio Jr., desde cedo fez parte do mundo das celebridades. “Tinha a sensação de que as pessoas não me viam como ser humano, com direito a mau humor e esquisitices. Era uma tirania”, lembra. A relação com a família também nem sempre foi fácil. Segundo ela, os pais tiveram um casamento apaixonado e destrutivo. Dona de uma personalidade franca e passional, Cleo ficou dois anos sem falar com Fábio Jr. Hoje, pai e filha se dão bem. “Somos muito parecidos. Tenho uma música que nos define: ‘Sou contraditório, sou intenso, tenho multidões dentro de mim’”, diz o cantor. Com o padrasto, o músico Orlando Morais, a convivência sempre foi amorosa a ponto de surgirem fofocas sobre um romance entre os dois, quando ela tinha 14 anos. O boato, pesadíssimo, ventilava que padrasto e enteada haviam sido flagrados na cama por Gloria. O falatório foi devastador para a família. Gloria e Orlando chamaram os jornalistas para desmentir publicamente a história e se mudaram para Los Angeles, onde viveram por um ano com os filhos. “As pessoas me apontavam na rua e cochichavam. Caí na porrada algumas vezes, do tipo de pegar uma pessoa pelo cabelo e gritar se ela tinha coragem de dizer na minha cara o que insinuava”, recorda. Após o episódio, entrou em depressão. “Foi o momento mais difícil da nossa vida, mas saímos muito mais unidos. Cleo é uma estrela absolutamente livre”, diz Orlando Morais.
Frequentadora de consultórios de psicoterapeuta desde os 17 anos, a atriz já foi diagnosticada como hiperativa com tendência a vícios e, depois, como obsessiva compulsiva. Obviamente, não se trata de um assunto confortável, principalmente no que diz respeito aos vícios, mas nem assim escapa de sua franqueza. “É obvio que já usei drogas. Seria hipócrita se eu negasse, mas hoje só uso recreativamente”, declara ela, repentinamente tomada de um raro laconismo. Ao falar de suas fixações, sente-se mais à vontade. Como ao descrever sua coleção de facas. “Tenho mais de trinta modelos. Gosto delas, às vezes brinco, fico olhando, pesquiso sobre suas peculiaridades e as limpo cuidadosamente”, conta. A atriz também já teve compulsão por bolsas. Em um arroubo de consumismo, chegou a comprar de uma única vez dez exemplares de grifes caríssimas como Louis Vuitton e Balenciaga.
Tudo na vida de Cleo é intenso e superlativo. E sua relação com o próprio corpo — 1,60m de altura e 53 quilos — não poderia ser diferente. Embora tenha relaxado com os exercícios no momento, é presença assídua em clínicas de estética, onde testa absolutamente todos os tratamentos. Jura que nunca fez plástica nem aumentou os lábios. Na verdade, a atriz, que ostenta um sorriso largo que já chegou a ser comparado com o do Coringa, o inimigo do Batman, diz que corrigiu a arcada dentária com aparelho e revestiu os dentes com porcelana. Ela argumenta que não é neurótica com regimes e que se mantém magra porque equilibra a alimentação. No dia da entrevista, porém, confidenciou ter perdido a linha e devorado três hambúrgueres num fast-food, de madrugada. Com a profissão que tem, é fato que o visual tem grande importância. Mas ela não abre mão dos gostos extravagantes, como o que nutre pelas tatuagens — já tem 21. Uma das mais emblemáticas é a palavra fever (do inglês febre), marcada no peito esquerdo, sobre o coração. Trata-se do título de uma música que um colega dizia fazê-lo lembrar dela. Os dois viveram uma tórrida história de amor enquanto gravavam uma novela, mas ela se recusa a entregar seu nome. Cleo ainda tem o desejo de marcar uma gota ou um raio no canto externo do olho, como se fosse uma lágrima. Sobre o estilo para lá de espevitado da primogênita, Gloria Pires demonstra condescendência maternal. “Eu e Orlando tivemos uma educação parecida e passamos isso para os filhos. Eles sempre tiveram liberdade para se expressar e fazer o que acreditam”, comenta a atriz, que ainda é mãe de Antônia, 24 anos, Ana, 15 e Bento, 13.
Íntima dos estúdios desde menina, Cleo relutou em seguir os passos da mãe. A estreia aconteceu aos 19 anos, quando foi chamada por Monique Gardenberg para fazer o filme Benjamin, baseado no livro de Chico Buarque. A diretora se encantou ao vê-la cantar em uma banda de rock amadora. “Na época, eu só pensava em música e, um dia, quero voltar a investir na carreira de cantora”, planeja a atriz, que tem várias canções escritas, muitas em inglês. Após se despedir da personagem Tamara, a piloto com transtornos psiquiátricos de Haja Coração, em novembro, Cleo continuará com a agenda lotada. “Ela é uma atriz em carne viva. Totalmente aberta, vai de cabeça no que faz sem medo de correr riscos”, elogia José Alvarenga, diretor da série de suspense Supermax. Cleo não esconde outro sonho: fazer carreira em Hollywood. Tanto que já tem até um agente americano. Contratada da Globo, foi obrigada a recusar um papel na série da HBO Westworld, com Anthony Hopkins, atualmente em exibição, porque estava gravando. “Nem quis saber os detalhes para não sofrer”, conta. De todos os seus vencimentos, reserva 10% para projetos sociais, como o de levar água potável a escolas de Cabo Verde, na África, onde investiu 65 000 dólares. Também comprou uma casa na favela do Vidigal com o intuito de fazer programas comunitários. É um curioso paradoxo, para quem se atira a projetos com a força devastadora de um vendaval, semear iniciativas filantrópicas. Mas faz sentido. Afinal, Cleo é, antes de mais nada, imprevisível.