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O comando da nau

A conquista da Copa do Brasil trouxe sossego ao time e euforia aos seus torcedores. Mas as eleições para presidente do clube protem agitar a caravela vascaína

Por Felipe Carneiro
Atualizado em 5 jun 2017, 14h58 - Publicado em 9 jun 2011, 19h15

Em sua viagem para descobrir o caminho marítimo para as Índias, no fim do século XV, o navegador Vasco da Gama enfrentou todas as adversidades possíveis. A animosidade dos muçulmanos, as tormentas pelo caminho, a calmaria na volta e as doenças a bordo dizimaram um terço de sua tripulação e levaram os sobreviventes a serem celebrados como heróis no desembarque em Lisboa. Mais de 500 anos depois, o clube carioca que homenageia o almirante português acaba de protagonizar uma nova façanha em território adversário. Na quarta passada (8), foi a Curitiba, enfrentou o frio e um oponente brioso, mas sagrou-se vencedor da Copa do Brasil, encerrando um jejum de títulos na divisão principal que perdurava oito anos. A torcida em êxtase varou a madrugada e a cruz de malta voltou a estampar as camisas e as ruas cariocas. Com o triunfo, o time de São Januário foi a primeira agremiação brasileira a se classificar para a Libertadores da América do ano que vem.

Se a taça trouxe sossego ao técnico Ricardo Gomes e euforia a 15 milhões de aficionados no país, nos bastidores a caravela vascaína ainda não navega em águas tão tranquilas. Marcada inicialmente para abril, as eleições para presidente prometem agitar a política interna do clube. Devido a uma pendenga judicial, envolvendo a lista de pessoas aptas a votar, o pleito sofreu vários adiamentos. As cinco chapas de oposição ao atual mandatário, o ex-jogador Roberto Dinamite, contestaram os nomes apresentados, alegando que constam sócios falecidos e gente que adquiriu o título depois da data limite para participar da escolha, que, enfim, foi agendada para o dia 2 de agosto. O panorama é semelhante ao da última disputa, mas com os papéis invertidos. Naquela ocasião, o oposicionista Dinamite fez queixas sobre o procedimento de Eurico Miranda, que o antecedeu no cargo, e conseguiu um oficial de Justiça para garantir a lisura do processo.

Apesar da pulverização de postulantes, a batalha está concentrada, na verdade, entre dois candidatos. O nome mais forte da oposição é o do cirurgião plástico Pedro Valente, 72 anos, secretário municipal e estadual de Saúde nos anos 90. Ele não tem tanto brilho próprio, mas conta com o apoio de Eurico, notório pelas suas artimanhas políticas e por ter sido alvo de denúncias de corrupção. Dinamite e Valente acenam com propostas bem distintas. O atual presidente, que trabalha para recuperar a imagem do Vasco depois do estrago provocado por seu antecessor, tem como prioridade investir em um centro de treinamento para os jogadores profissionais no Itanhangá e um outro para as divisões de base na cidade de Maricá. Já seu principal adversário apresenta como bandeira um mirabolante plano de reforma do complexo de São Januário, erguendo edifícios garagens e reurbanizando a área em torno do “caldeirão”, como é conhecido o estádio, construído em 1927.

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Como ocorre com os rivais Flamengo, Botafogo e Fluminense, o Vasco padece com as contas sempre no vermelho. Segundo um ranking divulgado recentemente por uma consultoria especializada, seu endividamento está na casa dos 370 milhões de reais, menor apenas que o total apresentado por Atlético Mineiro e Botafogo e pouca coisa a mais que as cifras dos outros dois clubes cariocas. Se há um consolo nessa história é que, aparentemente, o pior da tormenta financeira ficou para trás. Revigorado pelo novo contrato dos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro, o orçamento para o próximo ano ficará na faixa de 100 milhões de reais. “Quando assumi, encontrei uma dívida de 8 milhões só com a fornecedora de material esportivo e, para piorar, as cotas de TV já haviam sido adiantadas”, afirma Dinamite. “Ao fim do meu mandato, estaremos com uma boa receita”, acredita ele, que, entretanto, ainda não ent

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regou ao conselho fiscal as contas referentes ao exercício de 2010.

O caos econômico em que se encontra boa parte das agremiações brasileiras resulta de gestões incompetentes de seus dirigentes e da falta de profissionalismo. A prática nociva e de longa data é gastar mais do que se arrecada. Quando não há dinheiro em caixa, a solução adotada é pedir adiantamentos de cotas de patrocínio e empurrar o abacaxi para a próxima administração, que geralmente assume o clube com os cofres vazios, e assim a praxe é perpetuada. Enquanto não for criada uma lei de responsabilidade fiscal, a exemplo da existente nas esferas dos poderes federal, estadual e municipal, o problema tende a permanecer, deixando os times mais fracos.

Nesse mecanismo perverso, a possibilidade de alternância de poder, preceito básico da democracia, frequentemente deixa traumas. “A mudança na direção de uma empresa costuma ser tranquila porque nenhum projeto

é interrompido”, diz o especialista em gestão esportiva Amir Somoggi. “No futebol, é diferente: o sujeito da oposição paralisa o que estava sendo feito e põe em prática as suas ideias, provocando caos no curto prazo.” Independentemente de quem vier a ser eleito para o próximo triênio, os desafios se anunciam imensos. E, mesmo com o merecido título, as próximas semanas do Vasco não serão tão tranquilas fora de campo.

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