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Felipe Neto lança aplicativo oficial e declara guerra ao YouTube

Um dos campeões de público na internet, Neto lança aplicativo para ficar ainda mais rico com negócios digitais e não poupa provocações

Por Daniela Pessoa Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 29 set 2017, 12h15 - Publicado em 28 set 2017, 22h29

A imensa maioria das pessoas não tem a menor ideia de quem é Felipe Neto, um carioca do subúrbio de Engenho Novo, 29 anos, voz aguda e cabelos que têm a cor trocada quase semanalmente. Se a pergunta for feita a alguém com idade entre 9 e 16 anos, porém, a situação muda de figura. Enquadrado em uma nova categoria de profissionais que se definem como influenciadores digitais, Neto é uma celebridade da internet, com um séquito de 14 milhões de fãs — a maciça maioria dentro da faixa etária citada acima. Nas últimas semanas, o rapaz já bastante agitado estava ainda mais pilhado do que de costume. Ele tratava de cada detalhe da festa de arromba marcada para quinta (28), em sua nova casa, em um condomínio na Barra da Tijuca. O imóvel, recém-comprado, tem piscina transposta por uma ponte, sala de cinema, paredes envidraçadas e está avaliado em 6,5 milhões de reais. É de lá que ele capitaneia seu canal e também o Irmãos Neto, uma novidade coestrelada pelo irmão Luccas Neto, 25. Lançado em agosto, nas primeiras 24 horas bateu o recorde de 1 milhão de inscritos (hoje, já são mais de 4 milhões).

A festança na mansão, com lista organizada pela promoter Carol Sampaio, foi concebida para receber 200 personalidades como o empresário Rony Meisler, dono da grife Reserva, e a ginasta Jade Barbosa. O nervosismo do anfitrião, no entanto, não decorria da turma reunida para o megarrega-bofe à beira do espelho-d’água. O que o inquietava era a surpresa que preparou para a farra. Tudo foi cuidadosamente planejado não apenas para arrebanhar uma audiência colossal como também para marcar o ato mais radical em sua carreira: um posicionamento público contra o YouTube, o maior site de vídeos do planeta, onde ele garimpou um a um seus milhões de fãs e é hoje o segundo maior astro brasileiro da plataforma, atrás apenas de Whindersson Nunes.

quadro sobe e desce youtubers
(Divulgação/Veja Rio)

Movido por uma relação de amor e ódio, Neto acredita ter encontrado a fórmula para tocar a carreira e seus projetos longe do gigante digital que o pariu para o estrelato há sete anos. Trata-­se de um aplicativo para celular em que publicará uma espécie de conteúdo estendido da plataforma de vídeo e terá contato direto com seus fãs. O dispositivo também permitirá o domínio total da publicidade, dos acordos comerciais e métricas de audiência, sem submeter-se aos algoritmos da multinacional americana. “Já estava mais que na hora de dar meu grito de independência com relação ao YouTube”, diz Neto. Tanto o programa quanto a estratégia de lançamento foram desenvolvidos em parceria com uma startup americana, a FanHero, e o jornalista João Pedro Paes Leme, ex-diretor da Rede Globo.

A revolta encarnada por Felipe Neto é um caso típico da criatura que se rebela contra o criador — e não é de hoje que o relacionamento entre ele e o YouTube solta faíscas. Pioneiro naquela categoria que se convencionou chamar de youtuber, ele foi uma espécie de desbravador desse universo com o canal Não Faz Sentido, em que interpretava um personagem reclamão, sempre de óculos escuros, que disparava críticas ácidas a tudo e a todos. Virou um fenômeno: foi o primeiro canal de língua portuguesa a ultrapassar a marca de 1 milhão de inscritos. Em 2011, criou a Paramaker com o objetivo de se tornar também um empresário do ramo. Quatro anos depois, entretanto, vendeu a companhia para a multinacional francesa Webedia por uma fortuna cujo valor é guardado a sete chaves. Logo depois, voltou-se novamente para os programas on-line. Dessa vez, entretanto, abandonou o estilo rabugento, que já começava a aborrecer o público, e apostou no humor. Os vídeos leves, divertidos e quase naives deram certo. Um cálculo simplista feito a partir de sua audiência e da remuneração-padrão do YouTube aponta que seu faturamento, apenas com as visualizações de seus vídeos, pode chegar a 180 000 dólares (o equivalente a 570 000 reais) em meses mais fartos. Estima-se ainda que, por uma campanha publicitária anual, ele ganhe até 1 milhão de reais.

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Felipe Neto e Luccas Neto
Os irmãos Felipe e Luccas Neto em sua nova mansão na Barra: três andares, piscina e até sala de cinema (Léo Aversa/Divulgação)

Mas o filho-prodígio do YouTube encasquetou mesmo com os algoritmos sigilosos da empresa-mãe. Em um ataque direto, ele diz com todas as letras que a plataforma é capaz de manipular os códigos. “Eles podem interferir no número de visualizações dos canais e com isso alterar quanto vão pagar a quem produz os vídeos.” Outra acusação: “Existe uma panelinha no escritório do YouTube Brasil que escolhe os canais para divulgar e privilegiar com base no gosto pessoal, e não nos números. Nunca tive reconhecimento ali”. Procurado por VEJA RIO, o YouTube garantiu, por meio de sua assessoria de imprensa, que “trata todos dentro da comunidade da mesma maneira”. Sobre os algoritmos, a empresa explica que “tenta conectar o espectador aos vídeos de que ele tem mais probabilidade de gostar”. Reconhece, no entanto, que, com mais de 400 horas de material enviado a cada minuto, essa tarefa “pode ser um desafio”.

Tamanho fuzuê colocou Neto na linha de tiro de outros colegas de profissão. Seu rival de velhos bate-bocas via redes sociais, Felipe Castanhari, do Canal Nostalgia, disparou recentemente um petardo dirigido a ele: “Alguns criadores de conteúdo gostam de culpar o YouTube pela própria incompetência”. O carioca rebate sem meias palavras: “O problema do Castanhari é que ele late demais e faz de menos”. Outra crítica de Neto é que faltam a muitas celebridades do ramo estratégia e inteligência para o mercado. Esse seria o motivo para a inconsistência e a oscilação no número de seguidores. “Muitos se deixam agenciar por pessoas preocupadas apenas em ganhar dinheiro com os direitos de álbum de figurinhas, filmes e livros”, opina. No tiroteio, sobra até para a paranaense Kéfera Buchmann, uma figura que despontou como estrela e hoje enfrenta um esvaziamento de público. “Houve uma época em que ela abusou demais do merchandising nos vídeos. Fica chato, as pessoas percebem e desistem de você. E a Kéfera parece mais preocupada com a carreira de atriz. A questão é se fará sucesso no cinema se deixar a internet de lado”, diz Neto, no papel que mais gosta de desempenhar, o de frentista que joga gasolina na fogueira. É fato, no entanto, que os problemas com a plataforma não são uma exclusividade de quem publica seus vídeos nela.

Felipe Neto - Engenho Novo
Felipe Neto em seu antigo e pequeno quarto no Engenho Novo: onde a trajetória de youtuber começou (Léo Aversa/Divulgação)

Em março deste ano, a dinâmica de distribuição de publicidade da empresa levou organizações globais como Johnson & Johnson, L’Oréal, Volkswagen e PepsiCo a cancelar seus anúncios com receio de terem suas marcas atreladas a conteúdos de gosto duvidoso, como apologia da violência e do racismo. “A vantagem da internet é que ela oferece a possibilidade de comunicação quase cirúrgica. Em geral você sabe com quem está falando e há parcerias muito interessantes que valorizam a relação do público com o influenciador digital. No entanto, eu mesmo não faço ideia de onde estão os nossos anúncios em uma plataforma imensa como o YouTube. Ali não há curadoria”, afirma Guime Davidson, vice-presidente de criação da agência de publicidade WMcCann. Em nota, o YouTube declara que assumiu o compromisso público de melhorar a segurança das marcas na plataforma, adequando suas campanhas ao conteúdo veiculado: “Tudo isso leva tempo, mas estamos focados”.

Polêmicas à parte, a internet é, sem sombra de dúvida, o futuro da comunicação. Estima-se que, em vinte anos, 90% daquilo a que as pessoas vão assistir será disponibilizado por plataformas digitais. De acordo com a comScore e com o Ibope TGI, o YouTube já atinge mais pessoas entre 18 e 49 anos de idade do que todas as redes de TV a cabo combinadas. E mais: segundo levantamento da Provokers, instituto de pesquisa de mercado, cinco das dez celebridades mais influentes entre os brasileiros de 14 a 34 anos são estrelas da plataforma do Google, que alcança mais de 1 bilhão de pessoas no mundo inteiro e tem no Brasil o segundo maior público consumidor de vídeos. Mas, em um revés de seu sucesso, a multinacional começa a ganhar alguns concorrentes insuspeitos, na forma de aplicativos como o desenhado pela turma de Felipe Neto. A empresa que desenvolveu o programa para o astro, a FanHero, tem entre seus clientes o jogador de basquete Leandro Barbosa, divisões da Disney e da Warner Music e times de futebol como Vasco da Gama e Corinthians. Outra vantagem é a disponibilização de dados que o YouTube não oferece. “Agora, vamos conhecer o público do Felipe de verdade. Teremos a chance de saber, por exemplo, até a rua em que o internauta mora”, explica João Pedro Paes Leme, que trocou a carreira de vinte anos na TV para empreender no mundo digital.

Ligadíssimo nas tendências do mercado, Felipe Neto consome de forma voraz artigos sobre internet, métricas e comportamento humano (é fã do filósofo Luiz Felipe Pondé e do historiador Leandro Karnal). Do ponto de vista empresarial, tem as estratégias traçadas pela empresa Take4, uma sociedade que reúne seu irmão Luccas, Paes Leme e o produtor Cassiano Scarambone. Com a venda da Paramaker para os franceses, Neto ficou temporariamente impedido de ter negócios da área de internet por exigência contratual. Em um leque de opções que não deixa áreas descobertas, o time planeja um filme, uma linha de produtos licenciados, uma peça de teatro e mais livros. O último deles, lançado na última Bienal, está há duas semanas na primeira posição da lista de VEJA na categoria infantojuvenil. Caso a estratégia de bater de frente com o gigante da internet não funcione como o esperado, o que não faltará para esse fã do Bozo, dos Trapalhões, da Xuxa e da Turma da Mônica são campos onde travar novas batalhas.

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