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Corte, costura e alfinetadas

Pesquisa exclusiva de VEJA RIO mostra o que pensam os estilistas cariocas. Eles contam, entre outras inconfidências, quem são o profissional que mais respeitam, a modelo preferida e a grife com preços mais abusivos

Por Fernanda Thedim
Atualizado em 5 jun 2017, 14h42 - Publicado em 6 jan 2012, 15h00

Tomado por turistas de todas as partes do mundo, o Rio receberá uma nova leva de visitantes nos próximos dias. Trata-se de uma multidão de modelos, maquiadores, cabeleireiros, fotógrafos e jornalistas que chegarão à cidade para a vigésima edição do Fashion Rio, que exibirá as coleções para o outono e o inverno de 24 grifes no Píer Mauá, a partir de terça (10). Paralelamente, acontecem mostras e feiras, destinadas a compradores de atacado, como o Rio-à-Porter, na Casa Firjan, em Botafogo, e o Fashion Business, no Jockey Club, na Gávea. Em maio do ano passado, na edição primavera-verão, os três eventos atraíram mais de 150 000 pessoas e geraram 1,5 bilhão de reais em negócios. Por trás dos números portentosos, estão as grandes estrelas do espetáculo, os estilistas, que, com talento e criatividade, traduzem, a cada estação, o estilo de vida carioca em roupas e acessórios. Para conhecer melhor esses profissionais, VEJA RIO convidou 120 deles para responder a um extenso questionário com perguntas que iam da satisfação profissional a peculiaridades do dia a dia, passando pela indicação dos nomes e marcas mais admirados (e também os mais supervalorizados, as grifes que cobram caro demais e aquelas em que a qualidade dos produtos não condiz com o prestígio). As respostas, analisadas e computadas pelo Departamento de Pesquisa e Inteligência de Mercado da Abril Digital, resultaram em um perfil inédito dos criadores exposto nas próximas páginas. É um retrato irresistível não só para quem vive da moda como também para todas as pessoas que abastecem o guarda-roupa com as peças desenhadas por essa turma.

O PERFIL DOS ESTILISTAS

A maioria é de mulheres, com mais de sete anos de profissão, que trabalham em grifes de médio porte e confecções

Desfilar as criações em apresentações superproduzidas nas semanas de moda é apenas uma pequena parte do trabalho de quem vive de desenhar roupas. A rotina é marcada por uma extensa lista de atribuições que vão muito além da tarefa de fazer croquis. Em primeiro lugar, é preciso descobrir o que vai ser tendência e acertar os estilos, tecidos e cores que todo mundo usará nas próximas estações. Para isso, é necessário perder horas folheando revistas de moda estrangeiras (inglesas, francesas, americanas e japonesas são as preferidas) e caçando vídeos de desfiles relevantes no YouTube. “Tem de estudar as grifes lá de fora, conhecer o perfil da sua cliente, para ver o que pode ser adaptado por aqui, e depois criar peças que se destaquem em meio à concorrência”, afirma Maria Lontra, 33 anos, que atua na Scrap, marca de médio porte, voltada para mulheres na faixa dos 30 anos de idade. Com dez anos de carreira e moradora de Copacabana, Maria encarna com precisão o perfil dos profissionais cariocas identificado a partir das informações obtidas pela pesquisa de VEJA RIO. A maioria absoluta é de mulheres (79%), trabalha como funcionária de uma empresa do ramo (51%) e cria moda feminina (76%). “Ser estilista não é só saber o que veste bem. É se dedicar a uma atividade que requer muito estudo e empenho”, define.

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EDUCADOS E VIAJADOS

A maioria dos profissionais tem nível superior e quase todos viajam para o exterior em busca de inspiração pelo menos uma vez ao ano

Não faz muito tempo, quem quisesse seguir carreira como profissional da moda tinha de buscar aperfeiçoamento por conta própria em ateliês, confecções e cursos técnicos. “Era bastante comum a profissionalização ocorrer a partir de um hobby ou da necessidade da mulher de começar a fazer pequenos trabalhos para fora”, confirma o pesquisador Marco Sabino, autor dos livros Dicionário da Moda e História da Moda. Nos anos 90, porém, as exigências e as altas cifras movimentadas por um mercado em plena expansão levaram as instituições de ensino a se dar conta da demanda que existia. Foi quando surgiram as primeiras faculdades de moda, como a da Universidade Veiga de Almeida, que desde 1996 já formou mais de 2?000 alunos. Hoje, conforme aponta a amostra obtida pela pesquisa, mais da metade dos estilistas tem curso universitário e um terço deles frequentou pós-graduação. Como complemento aos estudos, consideram imprescindíveis as viagens internacionais para assistir a desfiles, visitar lojas de grandes grifes e participar de programas de treinamento e seminários (87% vão pelo menos uma vez ao ano para o exterior). A metrópole preferida dos entrevistados para buscar novas tendências é Londres, que, com 31% de preferência, desbancou Nova York e Paris.

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O PRAZER DE DITAR MODA

Para 60% dos entrevistados, o maior reconhecimento é ver as pessoas usando suas roupas nas ruas

O que é mais importante para um designer de vestuário? Ver suas peças vestindo anônimos ou ter celebridades como clientes? Segundo a pesquisa de VEJA RIO, 60% dos entrevistados acham que fazer sucesso nas ruas é muito mais gratificante do que ter estrelas de TV entre os clientes (apenas 3% apontaram tal quesito como indicador de reconhecimento profissional). De fato, quando uma peça cai no gosto do consumidor, significa que a moda pegou para além dos croquis e do círculo de iniciados no assunto. “Eu me lembro até hoje do dia em que vi, pela primeira vez, um de meus biquínis na praia”, diz a estilista Lenny Niemeyer, proprietária da grife que leva seu nome. “Não parava de olhar, fiquei morrendo de vontade de ir até a cliente para saber o que ela havia achado, mas consegui resistir.” Ela estava começando a carreira, em meados dos anos 80, e produzia peças para marcas famosas da cidade. Foi só em 1995 que decidiu criar a própria etiqueta, considerada a maior referência em moda praia do Brasil. Hoje, são dezoito lojas espalhadas pelo país (seis delas no Rio) e peças à venda em magazines internacionais como Harrods e Bloomingdale?s, em Londres e Nova York, respectivamente. Não é difícil entender por que Lenny também se alinha à maioria dos colegas quando afirma que a principal compensação da carreira é fazer o que gosta. Dicas para o verão? Lenny oferece um biquíni cortininha por 145 reais e, para quem quer algo mais luxuoso, um modelo com estampa de arara por 410 reais.

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O REVERSO DO GLAMOUR

Concorrência acirrada, excesso de trabalho, prazos apertados e cobrança pelo sucesso marcam a rotina dos ateliês e confecções

Criatividade e inovação são palavras-chave quando o assunto é moda. Segundo 47% dos entrevistados que participaram da pesquisa, esses são os principais requisitos para quem quer alcançar o sucesso como estilista. “As tendências estão disponíveis para todo mundo, mas só quem conseguir criar peças originais, seja apostando em uma padronagem diferente, seja em um tecido novo, é que vai se destacar no meio da multidão”, considera a jornalista Iesa Rodrigues, diretora do curso de jornalismo de moda do Senac Rio e que todo ano marca presença nas semanas de moda do circuito Paris-Milão-Nova York. Isso significa que a pessoa que quer se destacar precisa suar nos ateliês – e muito. Os entrevistados apontam o excesso de trabalho como o que existe de pior na profissão, seguido pela antecedência com que é necessário planejar as coleções e pela cópia de modelos por outras marcas. Também entram na lista a cobrança pelas vendas dos produtos e – ossos do ofício – a obrigação de estar sempre bem produzido.

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ENTRE A RELEITURA E A PIRATARIA

Copiar modelos da coleçãoalheia é prática comum no setor, no qual se estuda cada detalhe das marcas rivais

problema acontece nas melhores maisons. Em abril de 2011, o francês Christian Louboutin, especialista em calçados de luxo, decidiu entrar na Justiça francesa contra a prestigiada grife Yves Saint Laurent depois de ver na vitrine da concorrente um sapato com o solado vermelho, sua marca registrada. Inspiração? Releitura? Louboutin entendeu que era uma cópia descarada. Todo mundo sabe que, na moda, nada se cria, tudo (digamos assim) se adapta. Seja a partir de modismos que vêm e vão ou de referências que atravessam os séculos, as adaptações ficam evidentes a cada nova coleção. “Hoje, alusões aos anos 60 e 70 estão muito presentes no nosso dia a dia, do estúdio de alta-costura às lojas de departamento”, diz a estilista Daniella Martins. Os próprios desenhistas de roupa assumem que essa é uma prática comum no mercado: 75% reclamam que tiveram peças imitadas por concorrentes e 58% admitem já ter clonado modelos de outras grifes. Eles ainda contam que saem às compras e visitam lojas pelo menos uma vez ao mês para uma rápida espionada no que os rivais andam fazendo.

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AFAGOS E AGULHADAS

A marca que é a cara do Rio, a mais careira, o melhor designer e o mais supervalorizado na opinião dos entrevistados

O mundo da moda é, por definição, reduto de egos inflados e vaidades inflamáveis. Também é o domínio das opiniões afiadas e paixões arrebatadoras. Nesse sentido, VEJA RIO convocou os entrevistados a manifestar suas preferências sobre colegas e suas criações. A marca mais identificada com a cidade, segundo eles, é a Farm, que teve 39% de preferência. Como no mundinho não existem elogios gratuitos, a mesma grife foi também rotulada como a que mais tem peças com qualidade inferior ao esperado. Unanimidades mesmo só Lenny Niemeyer, eleita a melhor estilista, e Oskar Metsavaht, diretor criativo da Osklen, visto como o profissional mais supervalorizado do Rio e cuja marca, Osklen, foi apontada como a de preços mais abusivos.

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O QUE ESTA EM ALTA E EM BAIXA

As principais tendências, As fontes de inspiração e os piores modismos

Gosto não se discute, mas quem não desgruda de sua calça saruel não tem muitas chances de entrar na lista dos mais bem-vestidos dos entrevistados. A peça foi apontada como o pior modismo dos últimos cinco anos, com 15% dos votos. Bem mais atrás vieram o clog (aquela espécie de tamanco fechado na frente, com sola de madeira), as ombreiras e as sandálias gladiador. Quem quiser se mostrar antenado com as novidades de verão deverá apostar nas peças laranja, e não errarão os que investirem no jeans e nas peças pretas, clássicos a toda prova. No Olimpo da elegância está tudo o que sai da grife fundada por mademoiselle Coco Chanel, a grande inspiração da turma – ontem, hoje e sempre.

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A ARTE DE VENDER BEM

O preço médio das criações no varejo varia entre 100 e 300 reais, e a maioria dos estilistas cobra entre três e quatro vezes o custo da peça. O local preferido para abrir lojas é o shopping

Praticamente todo consumidor já se perguntou quanto custaria uma peça de roupa se ela não tivesse uma etiqueta de prestígio pregada no avesso. Pois bem, os entrevistados da pesquisa dão uma ideia do valor que uma assinatura é capaz de agregar a um modelito. Pouco mais da metade dos estilistas alavanca em até três vezes o preço, 25% multiplicam quatro vezes e 7% cinco vezes ou mais. É sem dúvida um aumento considerável, mas é preciso levar em conta que nem tudo acaba no bolso do desenhista ou do dono da marca. Manter uma loja em endereços nobres como Ipanema e Leblon exige fôlego financeiro, dado o alto preço dos aluguéis, sem falar nas demais despesas do negócio. “As luvas e os aluguéis que são cobrados hoje na Zona Sul fazem com que seja mais caro abrir uma loja de rua do que dentro de um shopping, onde você já tem um público garantido”, diz Ricardo Brautigam, da Ausländer. Outra fronteira que tem sido desbravada é a da divulgação e venda pela internet. É quase unanimidade entre os profissionais a importância de sites, blogs, catálogos on-line e ações em redes sociais na divulgação das criações. Não foi por acaso, portanto, que Brautigam escolheu sua nova loja virtual para lançar sua próxima coleção.

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