Amiga de banheiro
A verdade é dura: se tem uma coisa que toda mulher entende é de homem que depois de uma noite maravilhosa pede o seu telefone e não liga no dia seguinte. Uns ligam três dias depois; outros nunca ligam, simplesmente evaporam e fazem você se sentir a pior mulher do planeta. Tenho um amigo que […]
A verdade é dura: se tem uma coisa que toda mulher entende é de homem que depois de uma noite maravilhosa pede o seu telefone e não liga no dia seguinte. Uns ligam três dias depois; outros nunca ligam, simplesmente evaporam e fazem você se sentir a pior mulher do planeta. Tenho um amigo que diz que sumir é a melhor maneira de terminar um relacionamento que está no começo. Critiquei, disse que ele era um covarde. E ele reagiu, com a maior naturalidade: “não sou covarde. Sou homem. E homens são assim”.
Isto posto, conto a história a seguir, que aconteceu em um bar movimentado da sempre movimentada Copacabana. Depois de encher a pança de petiscos deliciosamente engordativos com amigos queridos, resolvi ir ao banheiro antes de pegar o táxi de volta para a Barra. Lá, não pude deixar de ouvir a conversa de duas mulheres, uma que estava do lado de fora, já lavando as mãos, e outra que, como eu, estava de porta fechada, digamos, concentrada.
– Agora é oficial, Nádia. O Eduardo me deu um pé na bunda mesmo! – disse minha vizinha de sanitário.
– Não fala assim, Sofia… – disse a amiga, solidária.
– Falo, sim! O palhaço me chamou para conversar e veio com aquele papinho de que o problema não é comigo, é com ele. E pior! Teve a cara de pau de dizer que está num momento muito dele…
– Momento muito dele uma ova! – defendeu Nádia. – Não suporto esse texto! Os homens não têm a menor criatividade! Ele ficou em cima de você um tempão. Agora que você resolveu dar mole o cara desiste de você? Não entendo os homens!
– Pois é, nem eu. Ele parecia tão apaixonado…
– E eu não sei, Sofia?
– Até flores ele me deu…
– Pegou no canteiro da portaria do seu prédio!
– Mas deu!
– É… Deu…
– Sinal de afeto.
– Ou de sovinice… Mas tudo bem… O que vale é a intenção…
– Pois é! Sei que não devo ligar, mas eu estou morrendo de vontade de falar com ele de novo. O que você acha?
– Não sei…
– Ô, Nádia, ‘Não sei’ não é resposta. Me ajuda, amiga! Eu ligo ou não ligo?
– Não sei, ué!
– Vai que ele morreu!
– Vaso ruim não quebra!
– Nádia! – estrilou Sofia. Tadinha! – Sério, ligo ou não ligo? Vai que aconteceu alguma coisa?
– Não aconteceu nada, ele só não tá mais a fim de você, não viu Sex and the City? Em bom português, ele tá cagando pra você, Sofia.
– Pô, Nádia, pegou pesado agora…
– Desculpa.
– Não sei… Tô com um aperto no coração. Fiquei com ele quase dois meses…
– Um mês e 17 dias.
– Nádia! – Sofia gritou. – Eu acho que devo seguir meu sexto sentido e ligar pra tirar essa história a limpo. O que você acha?
Silêncio do outro lado. Ela insistiu:
– Conversar é sempre válido… Não é?
Mais silêncio.
– Nádia? Nádia! Nádiaaaaa!!!
Profundo silêncio.
– Nádia, você tá aí?
Como diria Nelson Rodrigues, um silêncio ensurdecedor tomou conta do banheiro.
Nádia não respondeu. Vaca.
Eu, solidariedade em forma de pessoa, resolvi me meter:
– Nádia não tá, mas eu tô, Sofia! Eu tô aqui pra você, querida! E acho que Eduardo não presta! Não liga pra Eduardo! Eduardo é um idiota que não te merece! NÃO TE MERECE! – gritei exaltada, louca.
Só ouvi uma gargalhada. Gargalhada gigante, saborosa. Ri também e continuei.
– Desculpa, Sofia, mas precisei me meter. Eduardo é uma porcaria de homem, parte pra outra, tenho certeza de que você vai encontrar coisa melhor!
Mais risadas do outro lado e o barulho da descarga.
– Isso é maravilhoso! Morei nos Estados Unidos cinco anos e isso nunca aconteceu! Imagina se eu receberia conselho de alguma gringa num banheiro – comentou Sofia. – Sai daí, mulher, preciso ver sua cara e te dar um abraço.
Saí e dei de cara com ela e com a tal da Nádia, que estava chorando de rir encostada na pia.
– Fala sério, Nádia! Não acredito que você estava aqui o tempo todo! Deixou a coitada da Sofia falando sozinha! – bronqueei, rindo, enquanto estendia os braços para dar na Sofia, minha nova melhor amiga de infância (e de banheiro), um abraço apertado.
– Ela é uma palhaça, não merece minha amizade, agora minha amiga é você. Qual o seu nome? – perguntou Sofia, toda simpática.
– Thalita.
– Você ouviu tudo, é?
– Absolutamente tudo. Desculpa, eu sou escritora, tenho esse pretexto para escutar conversas alheias – expliquei. – Promete que não vai ligar pro Eduardo?
– Prometo. Você acha que ele não presta mesmo?
– Claro. Resolveu fazer jogo duro agora só porque você está a fim dele. Deixa o cara sentir sua falta, ter saudade de você. Ele que tem que te ligar! Se não ligar… dane-se ele!
– Certíssima! – exclamou Nádia.
– Agora você fala, né, Nádia? – implicou Sofia.
– Valeu, gente, tenho que ir. Muito bom conhecer vocês.
– Não, espera, Thalita. Você tá no Face? Posso te adicionar?
Viramos amigas de Face, trocamos emails, tiramos foto com nossos celulares e passamos a nos corresponder com frequência. Sofia não ligou para Eduardo. Eduardo, depois de duas semanas, ligou para Sofia. Ela, bonita e no salto, dispensou Eduardo.
Eduardo eu não sei que fim levou, mas Sofia logo depois do nosso encontro banheirístico engatou um namoro com um cara alto, sarado, bonito, educado, gentil, cheiroso, bem-sucedido e gente boa. Apaixonada, chegou até a me chamar para ser madrinha do casamento depois do terceiro encontro. O homem da minha vida, dizia ela. Na terceira semana descobriu que ele era casado e o namoro, claro, desandou.
Meses depois, Sofia, arrasada por não ter muita sorte com homens, conheceu o Daniel numa casa noturna vazia, em plena quarta-feira chuvosa. Estava à procura de diversão, desiludida com a ala masculina da Humanidade, mas achou um namorado. Estão viajando pela Europa para comemorar seu primeiro ano juntos. E são um casal muito fofo. Sei pelo Facebook. Nunca mais nos vimos pessoalmente, mas a gente se fala de vez em quando pelo chat da rede social. Mundo moderno.