Aos 60 anos Nany People faz reflexões e fala sobre principais polêmicas
Atriz lançou a continuação de sua biografia e aproveitou as reflexões para conversa sobre alguns temas com a VEJA RIO

Recém-comemorados 60 anos, Nany People revê sua trajetória pela segunda vez no lançamento da continuação de sua biografia. Para marcar esse momento reflexivo, conversou com a VEJA RIO e não se negou a falar de temas polêmicos. “Sou fora da casinha e desafio o mundo desde que sai da barriga da minha mãe”, afirmou deixando claro que não se incomoda de não agradar a todos.
Mas nas páginas de Ser Mulher Não é Para Qualquer Um – A Saga Continua há também espaço para contar histórias de uma mulher trans que qualquer pessoa queer se identifica. Como no retorno à cidade Natal em que se depara com a escola onde sofria bullying quando criança. A emoção em cada linha descrita e a sensibilidade de tratar um tema, mesmo que tão dolorido, mostra uma Nany pronta para acolher e entender as dificuldades ainda existentes para a comunidade LGBTQIA+.
“Na média geral da sociedade eu nem estaria viva. Estou fazendo 60 e ousei viver”, declara. O segredo: a fundamentação cultural, que acredita ter sido uma espécie de green card para encarar a vida; o acolhimento familiar, que reconhece ser um privilégio não comum para outras pessoas trans; e ter se mantida firme em seus propósitos, conseguindo viver da carreira de atriz.
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Nany veio de um a cidade do interior e lembra da época que ainda era preciso vir aos grandes centros para poder ir a uma balada LGBTQIA+. Mas, mesmo com os avanços, reconhece que em alguns lugares, assim como na sua cidade, o conservadorismo ainda impera. “Embora tenha essa área conservadora mundial que nos atarraca três passos pra trás sempre, estou feliz que há um movimento de reconhecimento e direitos”, destaca.
Olhando para trás afirma ser uma pessoa que não guarda mágoas. “Posso chorar a noite inteira, mas no dia seguinte estou linda de batom vermelho”, pontua. Até por isso topou falar sobre alguns temas polêmicos que fizeram seu nome ser criticado dentro da comunidade.

Talvez a mais notória de todas tenham sido sobre a Parada do Orgulho LGBTQIA+ de São Paulo. Mas Nany já avisa de primeira: “Não falo mal da Parada. Ela foi importante para grandes mudanças que nós tivemos no cenário político e até na cidadania. O que critico é não deixar claro para a mídia a importância política que a organização tem”.
Ela comenta que este ano foi procurada pelo presidente da associação que organiza o evento para tomar um café. Ele acredita que o posicionamento da atriz não é bom para a Parada, mas ela esclarece o motivo de não frequentar mais. “Fui nas primeiras paradas. Só que aí baixou a regra goela abaixo, e não gosto de nada goela abaixo, que todo carro para participar tinha que entrar para associação. O preço de x foi para 3x e eu ousei perguntar para quem estava indo esse dinheiro. Que direito era esse se na hora que eu via um gay ser assassinado aqui nos Jardins, nos anos 90 teve muito disso, e ninguém aparecia?”, questiona.
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A mudança na condução do maior evento LGBTQIA+ do país aconteceu no mesmo período em que Nany também parou de frequentar a noite. “Criou-se a ideia equivocada de que gay dá dinheiro, só que Pink Money não é burro. Então foi como se tivesse uma lei que quando a casa estava falindo fazia o que… Mudava para ser pra LGBT”, comenta. Ela acredita que o glamour e cuidado com as produções não estavam mais sendo os mesmos e isso a afastou desses espaços.
Sua carreira continuou então onde ela realmente sempre quis se firmar, como atriz. Mas foi justamente ao fazer um papel de uma mulher trans que se viu envolvida em outra polêmica. Ao interpretar Marcos Paulo na novela O Sétimo Guardião, da TV Globo, foi duramente criticada pela não mudança do nome da personagem após o processo de transição.
Como inicialmente seu papel seria feito por Renata Sorrah, falamos sobre transfake, quando pessoas cis são escaladas para interpretar personagens trans. E ela mais uma vez foi firme em seu pensamento: “É importante zelar pela inclusão, porque tinham pessoas que nem tinham o direito de estar ali, mas tem situações que a pessoa não está apta para o papel. Sou a favor, embora seja de uma formação que a arte não tem sexo, mas primeiro que se capacite a pessoa”.
Como argumento lembra que inicialmente seu contrato era de três meses, mas que foi estendido pela boa aceitação do público. Por isso acredita que colocar pessoas apenas pela representatividade, mas sem preparo, pode causar o efeito inverso. “As pessoas vão falar: Tá vendo a gente quer dar chance, mas não entrega”.
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Por fim, com longa carreira no humor, foi impossível não questionar se acredita que o gênero precisa ter um limite. “Tem que ter ruptura para ter humor, mas antigamente era a qualquer custo e hoje não é mais. O microfone é uma arma que pode ser usada a seu favou ou contra você. Independentemente de estar ou não como um personagem em cena, você está de certa forma incentivando”, analisa.
Nany afirma que viu nascer um humor que quanto mais cruel, mais ácida for a crítica, mais inteligente o humorista se acha. E pontua que muitos crescerem baseados nisso e viraram “crianças mimadas”. De forma direta lembra que tudo na vida tem um preço e chama o humor a todo custo de desumano.
Com o hábito de se expressar de forma contundente e sobre tantos assuntos sabe que assusta muita gente. Mesmo assim celebra a chegada aos 60 anos com uma carreira sólida e com motivos de sobra para comemorar. Assim como sua personagem favorita, Cinderela, segue seu caminho sem pensar muito nas críticas e baseada em seus desejos. “Ela tem uma coisa que é o combustível da nossa vida, que é o sonho. Estou vivendo meu sonho de Cinderela”, finaliza.
Para quem quiser conhecer um pouco mais de Nany People e suas histórias contadas nas páginas do livro pode também aproveitar que dia 30/07, às 20h, ela apresenta seu espetáculo Ser Mulher Não é Para Qualquer Um – O Espetáculo no Teatro Riachuelo. Os ingressos custam a partir de R$ 25 (meia entrada).