Reprise de “A Viagem”: historiadora comenta interesse pelo espiritismo
“É um tema que já mereceu estudos acadêmicos aprofundados. Ele comprova que ainda resistimos a um mundo totalmente materialista e laico"

Não importa quantas vezes for reprisada, a novela “A Viagem” é sempre um sucesso, como na volta ao “Vale a pena ver de novo”, nessa segunda (12/05), na TV Globo, com 17,3 de média e 19,2 de pico, melhor estreia para o horário desde 2023. Guilherme Fontes, o personagem Alexandre Toledo (que morre no início, sendo o ponto de partida para uma trama de obsessão, vingança e contatos com o plano espiritual), disse no “Encontro”, nesta terça (13/05), que pretende dirigir um “spin-off” da trama, um trabalho derivado de uma produção que expande o universo da original. “Eu acho que chegou a hora de avançar nas histórias desse personagem. Estou muito animado”, disse ele.
Novelas com temática espírita sempre deram boa audiência, tanto que “A Viagem”, de 1994, foi exibida seis vezes somando TV aberta e fechada, uma das mais simbólicas da TV brasileira, escrita por Ivani Ribeiro, com temas como vida depois da morte, reencarnação e justiça espiritual.
Outras produções que tratavam do tema foram “Alma Gêmea” (2005), “Páginas da Vida” (2006), “Amor Eterno Amor” (2012), “Além do Tempo” (2015), “Escrito nas Estrelas” (2010), “Espelho da Vida” (2018) e “Alto Astral” (2014).
A coluna falou com a historiadora Mary Del Priore, que lançou o livro “Do outro lado – A História do sobrenatural e do espiritismo” (editora Planeta), em 2014, com ênfase no espiritismo kardecista e sua rápida assimilação no Brasil.
“O Brasil é o país mais espírita do mundo e o espiritismo, ao chegar ao país, em meados do século XIX, vai envolver autoridades, médicos, padres numa febre que misturava crenças no além com a chegada da tecnologia, sobretudo da telegrafia e do telefone. Foi um momento também de epidemias deixando mortos nas vias públicas. A proximidade com a morte e o morrer ampliou a sensibilidade para o tema”, diz ela.
E segue: “O passado sincrético de nossa população, misturando brancos, pretos e índios também alimentava a crença nas almas. Acreditava-se que quando morriam, as pessoas continuavam ‘vivas’ nos túmulos à espera da ressurreição e do Juízo Final. E que na forma de ‘almas’ vinham dar recados, fazer justiça ou zelar pelos familiares. Entre índios enterravam-se os mortos debaixo da rede onde se dormia. E os afrodescendentes sempre consideraram a presença dos ancestrais encarnados na descendência de cada pessoa. Então, esta familiaridade com o outro lado, sempre existiu em nossa sociedade mestiça. Foi amplificada e ganhou foros de ciência graças ao Kardecismo”.
Mary escreveu o livro porque durante anos, a cada nova biografia que ela lançava, recebia cumprimentos de espíritas que vinham perguntar se ela “ouvia ou via”.
“Penso que é um tema de grande importância que já mereceu estudos acadêmicos aprofundados. Ele comprova que ainda resistimos a um mundo totalmente materialista e laico. O Brasil sempre foi uma encruzilhada de religiões onde cada um acredita no que bem lhe servir”, finaliza.