Nordeste Ficção marca a estreia solo de Juliana Linhares e merece audição
Disco é rico em diversidade sonora e acender discussão sobre estereótipos regionais
“Nordeste é uma invenção/ Nordeste nunca houve”
(Belchior, em “Conheço o meu Lugar”)
Conheço a Juliana Linhares há um bom par de anos. Ela é integrante da banda Pietá e atriz, suas apresentações costumam ser performáticas e seu discurso afiado. Cada faixa do álbum de Juliana, lançado hoje em todas as plataformas digitais, tem uma interpretação laureada por anos de teatro. Ela sobe e desce o tom, brincando com a própria voz, a serviço da música. Difícil não se abalar, ainda mais em tempos de cólera, depois da audição de Nordeste Ficção, o primeiro solo dessa artista potiguar.
Gravado sob direção artística de Marcus Preto, com produção musical de Elisio Freitas, o single Meu amor afinal de contas, música inédita composta e gravada por Juliana com o maranhense Zeca Baleiro lançado há duas semanas, já dava sinais do que estava por vir e o que ouvi esta manhã foi um acontecimento, raro eu diria.
Preto já tinha me dito que as referencias do álbum eram os LP’s clássicos de Amelinha, Elba Ramalho, Cátia de França, Terezinha de Jesus e outros nomes da geração nordestina lançados na virada dos anos 1970 para os 1980. Na mosca. Além de nobres e sutis referências, o trabalho também ecoa a grandeza melódica e poética de compositores como Alceu Valença, Ednardo, Fagner, Belchior e Zé Ramalho. E ainda dialoga com Chico César, Zeca Baleiro, Rita Ribeiro e Lenine. Arrisco dizer que a faixa mais bonita do disco tem um quê de Almir Sater, Bolero de Izabel.
Em 11 faixas, Juliana faz um strike, embora ao contrário do lance típico do boliche em que o jogador derruba todos os pinos no primeiro lance, a artista suspende nomes fundamentais que promovem a renovação da música popular brasileira. Aos 31 anos, no auge das possibilidades vocais, Juliana mostrou a que veio e promete circular no hall das grandes cantoras do país.