Reta final do Brasileiro: alegria dos memes, terror das bolas de cristal
Algumas lições do desfecho eletrizante de um campeonato tecnicamente opaco, mas fiel às rasteiras do futebol nas estatísticas, pranchetas, certezas
Bolas de cristal andam na berlinda. Nem o Cobra Coral poderia intuir tanta tormenta no céu alvinegro. Tampouco o radialista Benjamin Wright imaginaria tamanha surpresa na caixinha do futebol, quando fundou a imperecível máxima, em meados do século passado.
Para euforia dos botecos, embriagados de provocações, e dos ressuscitados rubro-negros, o Brasileiro revigora tal clichê. Aos tarados da matemática, aos profetas de plantão, a reta final avisa: toda certeza será castigada.
Por um lado, os números explicam a pane do Botafogo e a arrancada dos concorrentes reincorporados ao retrovisor. Não é casualidade reunirem os elencos mais caros.
Por outro lado, o imponderável ronda incansavelmente os gramados. Basta um cochilo da lógica, e o seu apetite insaciável devora previsões racionais. Transforma-as em papel na chuva.
Só uma avalanche de cochilos explica a sabotagem botafoguense contra o próprio destino. Só uma tempestade perfeita cometeria esse 7 a 1. Só a lebre de La Fontaine, cega de soberba, daria um mole assim.
Volúvel igual folha ao vento, a maré de incertezas talvez sopre novamente a favor do Alvinegro e restitua, no fim das contas, a taça que inacreditavelmente lhe escorre das mãos. Quem ousa duvidar?
Noves fora, o epílogo eletrizante de um campeonato tecnicamente opaco, mas fiel às rasteiras do futebol nas estatísticas, nos lega diagnósticos pedagógicos. Independem dos sucessos e fracassos derradeiros:
- A força econômica cedo ou tarde impulsiona o rendimento. Não evita, contudo, derrapagens. Não necessariamente concilia o desempenho ideal com períodos e jogos decisivos. Não dispensa a competência de gestões técnicas, táticas, psicológicas, humanas.
- Resultado de múltiplos fatores, o nivelamento das equipes – por baixo, diriam os severos – desemboca numa dificuldade progressiva e extensa contra o rebaixamento. O sarrafo insinua-se mais alto.
- Com estilos e trâmites distintos, SAFs não operam milagres. Os avanços esportivos e econômicos idealizados exigem tempo, planejamento estratégico, apuro gerencial, ajustes à realidade do país.
- Felizmente as chuteiras sempre encontram uma brecha para trair a razão, as favas contadas, as pranchetas. Chama-se futebol.
Alegria dos memes, terror dos nervos e das calculadoras, o desfecho da competição lembra outra máxima do folclore futebolístico: jogo é jogado, lambari é pescado. Diabolicamente atual.
____________________
Qualificação esportiva
O bicampeão olímpico de vôlei Giovane Gávio reforça o time de palestrantes do Projeto de Capacitação Esportiva desenvolvido pelo Instituto para o Desenvolvimento do Esporte e da Cultura (IDEC). Depois de rodar o país, a iniciativa ganha o Rio dias 6 e 8 de dezembro.
A edição carioca, no Centro de Convenções Nova América, integra profissionais de gestão e marketing a representantes de organizações como Comitês Olímpico e Paralímpico, Vale, Petrobras, Confederações Brasileiras de Desporto Universitário e de Desporto Escolar. A programação inclui a palestra do diretor de Esportes Olímpicos do Flamengo, Marcelo Vido.
_________
Alexandre Carauta é professor da PUC-Rio, doutor em Comunicação, mestre em Gestão Empresarial, pós-graduado em Administração Esportiva, formado também em Educação Física. Organizador do livro “Comunicação estratégica no esporte”.