No ritmo do Rio: o que aprendo correndo
Na estreia da coluna, Aline Salcedo mostra como a corrida — dos 5K às maratonas — ensina constância, foco e equilíbrio em um mundo que vive no modo sprint

No ritmo acelerado do dia a dia, a corrida tem se destacado não apenas como um esporte, mas como um estilo de vida. Os números confirmam essa tendência: segundo dados da plataforma Strava, foi a atividade física mais praticada no Brasil em 2024. Prova disso é que o número de clubes de corrida no país cresceu 59% no último ano — uma amostra da força dessa prática.
Faço parte desta estatística. Corro há 12 anos e, no ano passado, cruzei a linha de chegada da minha sexta maratona, em Berlim — a terceira das chamadas “Majors”, as sete provas mais icônicas do mundo. E tenho um carinho especial por ter completado duas vezes a Maratona do Rio, a cidade onde a corrida se transforma em paisagem, cultura e paixão para milhares de pessoas todos os anos. E é sobre o Rio e tudo o que ele inspira que vou falar neste espaço.
Estima-se que menos de 1% da população mundial tenha concluído uma maratona e, por isso, mesmo sem ser atleta profissional, tenho orgulho de me declarar maratonista. Mas é importante ressaltar: não importa se você encara 42km ou 5km — cada distância ensina algo sobre você. Estar em movimento já é uma conquista. Em um mundo que exige respostas rápidas e decisões em tempo real, a corrida, em qualquer formato, ensina o valor da estratégia e da consistência a longo prazo. Enquanto tudo ao redor pede pressa, ela mostra que o avanço real acontece em ritmo sustentável.
Ainda mais na nova era da inteligência artificial, onde decisões são tomadas em milissegundos, pode parecer tentador seguir o fluxo da velocidade. Mas a corrida, passo a passo, ensina algo mais: que o verdadeiro resultado vem da soma de disciplina, constância e adaptação. E que desacelerar, na maioria das vezes, também é avançar.
Cada quilômetro percorrido reforça uma verdade: somos humanos, não máquinas. Temos a capacidade única de sentir, mudar o ritmo conforme as circunstâncias e valorizar cada etapa — não só a linha de chegada. Quando comecei a correr, era quase sedentária e bem mais imediatista. Envelhecer com a corrida foi uma grata surpresa. Hoje, aos quase 50 anos, com uma filha pequena e seis maratonas no currículo, entendo que performance não é tudo. A corrida me ensinou que somos feitos para evoluir, não para funcionar no automático.
No pós-pandemia, o Brasil vive hoje um fenômeno cultural com a corrida de rua: em 2023, foram registradas 150 mil provas no país e mais de 13 milhões de corredores, segundo levantamento da plataforma Ticket Sports e dados do setor de corridas de rua.
Para mim, muito além de combater o sedentarismo, a corrida ensina a transformar estresse em foco, e desconexão em presença. Porque assim como na vida ou no trabalho, os resultados na corrida não vêm de forma instantânea. Eles exigem foco, persistência, resiliência. Seja correndo 5K ou 42K, aprendemos que eficiência vem da regularidade e do respeito ao próprio ritmo. Enquanto a tecnologia entrega respostas prontas, o ser humano precisa de processos.
No fim das contas, a corrida ensina que o estresse não desaparece, mas pode ser gerido. E que a excelência está mais na persistência do que na velocidade. Se as máquinas impressionam pela precisão, nós temos a capacidade de crescer com cada obstáculo. Com pressão e emoção.
E o Rio de Janeiro é um convite constante à corrida. De Copacabana ao Aterro, da Vista Chinesa às trilhas da Floresta da Tijuca, cada percurso é um lembrete de que dá, sim, para sair da correria da vida — correndo. Eu sou uma prova disso. E vale repetir: não importa se você encara uma maratona ou começa com 5Km. Cada passo tem valor. O importante é começar — e continuar. Talvez esteja na hora de você calçar os tênis e tentar. Vai por mim: ajuda.