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Marinheiras de primeira viagem

Mais antiga instituição de ensino superior do país, a Escola Naval recebe inédita turma de mulheres

Por Lais Botelho
Atualizado em 2 jun 2017, 13h09 - Publicado em 16 abr 2014, 17h20

rampos coloridos de cabelo, cadernos cheios de enfeites e estojos de maquiagem revelam que um cômodo em especial, com seis beliches, é um território à parte na Escola Naval, situada na Ilha de Villegagnon, ao lado das pistas do Aeroporto Santos Dumont. É ali que estão alojadas as doze pioneiras que se juntaram aos mais de 860 marmanjos que já eram alunos da casa. Não foi fácil o ingresso na prestigiada instituição. Elas tiveram de passar por um funil de 271 candidatas por vaga, que reuniu postulantes de todo o país. Antes de dar início ao ano letivo, as selecionadas se submeteram ainda a três árduas semanas de adaptação, que incluíram testes de aptidão física, como a prática de canoagem, natação e tiro, além de ensinamentos teóricos sobre a doutrina militar. “Aqui não temos moleza”, afirma Thais Affonso, natural de Cabo Frio e uma das novatas. Considerada aluna-modelo do período de iniciação, ela aponta apenas um privilégio concedido a esse seleto clube da luluzinha: a flexão de braços pode ser feita com o apoio dos joelhos no chão, para facilitar a tarefa.

Com altas doses de sacrifício e abnegação, essas marinheiras de primeira viagem aos poucos se adaptam à exigente rotina da Força Naval (veja o quadro). Vivem em regime de internato e compartilham, sem tirar nem pôr, as mesmas obrigações do chamado sexo forte. São regras de uma rigidez ímpar. A carga horária diária, durante a semana, vai das 6 da manhã às 10 da noite e é dividida em aulas práticas e teóricas, numa grade que inclui cálculo, desenho, legislação militar e navegação, entre outras disciplinas. Há apenas um breve intervalo para recreação, no cair da tarde. Dentro dessa inflexível hierarquia, os melhores alunos gozam da regalia de ocupar as primeiras filas da sala de aula. Todos precisam pedir permissão aos superiores antes de falar, sentar ou comer. Os novatos ? eles e elas ? são obrigados a trotar toda vez que passam pelo pátio, independentemente da pressa, para diferenciarem-se dos alunos veteranos. Inclusive, além da faixa etária entre 18 e 23 anos e do ensino médio completo, é feita uma exigência extra às candidatas antes do teste de admissão: elas não podem ter filhos. Em caso de gravidez no decorrer do curso, a matrícula fica automaticamente cancelada.

Felipe Fittipldi
Felipe Fittipldi ()

Para receber as novas estudantes, a Escola Naval teve de passar por uma ampla reforma. A começar pelo sistema de vigilância. Agora, 25 câmeras registram a movimentação pelos corredores do alojamento. As portas que ligam a ala feminina à masculina ganharam alarme, e lavanderia, banheiros e enfermaria também sofreram intervenções. “Foi tudo cuidadosamente planejado”, diz o vice-almirante Antonio Carlos Soares Guerreiro, comandante da instituição.

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Com um contingente crescente, há 22?200 mulheres nas Forças Armadas brasileiras, fatia que representa 6% do efetivo total das tropas. Cabe ressaltar que a Marinha foi a pioneira a abrir as portas para elas. Em 1980 foi formada a primeira turma feminina para oficiais e praças, num curso com duração de quatro meses. A grande novidade de agora é a possibilidade que elas têm de fazer todo o ciclo de quatro anos da Escola Naval, da qual sairão como segundos-tenentes. Porém, ainda há restrições em relação aos colegas de farda. As mulheres não podem optar, por exemplo, pela carreira no destacamento de fuzileiros. Se a Aeronáutica já permite que suas moças pilotem aeronaves, inclusive caças supersônicos, na Marinha elas ainda não podem conduzir embarcações. Flexibilizar o estatuto está no radar da Armada. “Vamos analisar o desempenho da primeira turma para pensar em aumentar o número de alunas e franquear a elas o ingresso em outros corpos da Marinha”, diz o comandante Guerreiro.

A origem da Escola Naval remete a uma instituição criada em Portugal no século XVIII, que se transferiu para o Rio junto com a família real, em 1808. É, portanto, a primeira escola de ensino superior do país. Sua primeira sede nos trópicos foi o Mosteiro de São Bento, e depois chegou a ocupar outros pontos até se estabelecer definitivamente na Ilha de Villegagnon, em 1938. Com toda essa autoridade histórica, tornou-se um concorrido estabelecimento de ensino. “Desde que me entendo por gente, quero ser militar. Busco honrar as medalhas que meu avô me deu”, diz a aluna Fernanda Fonseca, 22 anos, neta de um combatente na II Guerra Mundial. Vocação não lhe falta.

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